É maravilhoso estar em silêncio. Permite-nos entrar em contacto com o nosso verdadeiro ser e essência. Mesmo numa relação amorosa, esses momentos de encontro connosco são muito importantes e influenciam positivamente a relação.
Também existem silêncios a dois que valem por mais de mil palavras e são reveladores de uma extraordinária cumplicidade e profundo Amor.
Mas, existem muitos casais que escolhem viver as suas vidas em silêncio, um ou os dois, porque não conseguem conversar sem sentirem que precisam de se defender com “unhas e dentes”.
Quando observo alguns casais em guerra, fazem-me lembrar os antigos guerreiros romanos, com capacete, escudo, espada, armadura…e pergunto-me: para quê tudo isto? O que querem provar e pensam obter soltando as suas emoções e deixando-se levar por elas, ou reprimindo-as até não conseguirem respirar?
Estes casais que escolhem ficar em silêncio, diferenciam-se dos outros apenas porque, em vez de estar de pé tentando infligir golpes certeiros, decidem sentar-se numa qualquer cadeira dessa grandiosa biblioteca, em frente a uma enorme mesa, esperando o momento em que um sismo de elevada magnitude abane de tal forma as estantes que os rodeiam, que os livros escritos ao longo de meses, anos, décadas, pelos dois e, por cada um deles, saltem e se espalhem, pelas mesas e pelo chão. Alguns desejam mais que tudo que isso aconteça, para se libertarem, correrem biblioteca fora e saírem…
E pergunto: Porque esperam por um terramoto que deite tudo abaixo? Porque se conformam e aceitam que é assim?
O que poderiam estar a fazer enquanto estão os dois sentados nessa biblioteca, ou pelo menos um está sentado, enquanto o outro desarruma os seus próprios livros e os do outro?
É melhor estar em silêncio e/ou em guerra, ou estar a conversar, passear, jantar romanticamente, dançar, namorar, fazer amor…?
Então, porque escolhem viver assim? O que estão a pensar sobre a relação e o outro faz-vos bem?
A perceção de que é impossível conversar, e a decisão de ficar em silêncio para evitar um mal maior é uma espécie de bactéria.
Sabe o que acontece quando não tomamos o antibiótico correto para a eliminar? Pois, é isso mesmo que o silêncio, como negação de um problema na relação, faz com a sua relação.
Em muitas relações são os homens que entram primeiro nessa biblioteca e se sentam, para evitar discutir, entrar em conflito e usar a espada, enquanto as companheiras os seguem, mas continuam a ler-lhes em voz cada vez mais alta os livros das mágoas do passado, até ao dia…
Até ao dia, em que a indiferença e a solidão a dois se tornam insuportáveis, em que o emprego é o melhor lugar do mundo para estar e se deseja que o caminho para casa seja mais longo e tenha mais filas de transito.
Sabe de quem estamos a falar?
Estamos a falar de duas pessoas que por vezes, não há muito tempo, um ano, dez anos, quinze anos ( o que é isso numa vida inteira?!) gostavam muito de conversar uma com a outra, de se conhecer, de se descobrir, de confidenciarem os seus segredos, desejos, sonhos… Duas pessoas que se amavam em palavras, mas especialmente em gestos e atitudes, que partilhavam, que confiavam, que se ajudavam e apoiavam, que riam… Duas pessoas que saíram da sua casa para viver numa gélida e inóspita biblioteca, desconfortavelmente sentadas, uma ou as duas, a olhar para uma ou várias estantes, quando mesmo em frente existe uma gigantesca janela, por onde entram uns poucos raios de Sol, que os podem fazer acreditar poder ver o céu azul.
Sim, o FOCO deve estar na janela, não nas estantes!
Sim, é Verdade! Precisam os dois se levantar dessas cadeiras, deixar os livros para trás, irem em direção á janela…
Abrirem-na de par em par…
Olharem-se nos olhos…
Despirem a armadura, tirarem o capacete, a espada, o escudo…
Aceitarem que não precisam de nada disso!
Aceitarem que são frágeis, mas também fortes, que erram, mas também fazem coisas bem, que são diferentes mas podem crescer com as diferenças, que passado não dá vida, apenas aprendizagens, que silêncio não resolve, apenas agrava, que conversar é possível, que tem necessidades que o outro precisa conhecer e não adivinhar, que precisam de se encontrar depois do desencontro, e de acreditar que vai acontecer, de confiar e partilhar com genuína empatia…
Precisam tomar a decisão conjunta de querer sair dessa biblioteca, deixar o “silêncio bactéria” para trás, aprender a conversar de novo e talvez a respeitarem-se e amarem-se de uma outra forma, mentalmente mais saudável…
Precisam de aceitar que viver a vida dentro de uma biblioteca é uma escolha que fazem todos os dias, a cada instante, por defesa e medo, embora lhes possa parecer que é por Amor, que conduz á mais profunda solidão a dois, e ás vezes a três, a quatro ou a cinco, porque os filhos, sentem-no e vivem-no de forma ainda mais sofrida…
Precisam de aceitar que são imperfeitos, que a culpa não interessa para nada, as acusações não resolvem, as agressões mutilam, as ameaças ferem, as emoções aprendem-se a controlar, o silêncio agrava o sofrimento e a sensação de estarem a viver a vida pela metade e às escuras…
Precisam de ter Fé e Esperança que vão conseguir conversar e viver outra vez naquela que é a sua casa, e ter vontade de regressar tão só, para… conversar!
Porque antes não sabiam conversar, mas agora já sabem como o fazer acontecer!