Um dia destes, um bom amigo cá de casa entusiasmado com a ideia de em breve integrar a comunidade dos avós e sabendo da minha ligação ao universo dos miúdos pedia, meio a brincar meio a sério, que lhe sugerisse alguma leitura. Também meio a brincar, meio a sério achei que uma boa e primeira opção seria ele estar disponível para ler atentamente e para compreender os gaiatos. Na maioria das situações é suficiente estar atento para os compreender. Eles também nos compreendem e a estrada faz-se com não mais do que os sobressaltos que todas as estradas apresentam.
Fiquei no entanto a pensar na solicitação do meu amigo e na frequência crescente com que estes pedidos surgem.
É verdade que, contrariamente ao que acontece com todos os bens até por imposição comunitária, as crianças continuam a ser “fornecidas” aos pais sem virem acompanhadas de um manual de instruções de preferência em várias línguas.
Algum excesso nos discursos sobre a “instrução” e “educação” e as questões novas que as mudanças nos valores e nos estilos de vida colocam, levam a que os pais sintam algumas dificuldades no seu trabalho de pais e a que muitos técnicos entendam providenciar um “manual de instruções” que promoverá a educação perfeita da criança perfeita.
Nos últimos anos tem-se verificado um aumento exponencial na publicação destes “manuais”. Existem para todos os gostos, para todas as idades e escritos sob as mais variadas perspectivas. Tenho lido muitos, alguns parecem-me interessantes e uma eventual ajuda para alguns pais e para algumas questões, outros, devo confessar, deixam-me alguma inquietação, não passam de um enunciado de “orientações prescritivas” longe das circunstâncias de vida em que muitas famílias se movem.
Para além das ajudas que os pais possam encontrar nestes “manuais de instruções” creio ser importante sublinhar que, felizmente para todos nós a começar pelas crianças, os pais são, de uma forma geral, intuitivamente competentes. Mais “asneira”, menos “asneira”, mais uma “festinha”, menos um “ralhete” e o caminho cumpre-se sem grandes problemas. Um discurso social excessivo em torno da “psicologização” ou induzindo a ideia de que só indo a uma “escola de pais” e lendo vários “manuais de instruções” poderemos ser bons pais, pode ser mais fonte de inquietação que de ajuda.
Parece-me sobretudo importante que os pais falem entre si sobre as suas experiências, sem receio de que os julguem maus pais. Importa ainda que na relação com os técnicos ligados à educação as conversas não incidam quase que exclusivamente sobre “se está bem ou mal na escola”, mas que se abordem as questões educativas também no contexto familiar de forma aberta e serena. Os “manuais de instruções” não são a solução, são, alguns, apenas mais uma ajuda.
Pais atentos, pais confiantes, são pais que educam sem especiais problemas. Paradoxalmente, alguns “manuais” e alguns discursos “científicos” podem aumentar a insegurança e a ansiedade de alguns pais.
(Texto escrito de acordo com a antiga ortografia)