Mesmo no final do século XIX, Émile Durkheim publica «O suicídio», obra algo revolucionária que confirmou o autor na paternidade da Sociologia. A sua investigação mostrava que os homens aumentavam a sua probabilidade de se suicidarem quando eram solteiros e as mulheres aumentavam a sua probabilidade de se suicidarem quando eram casadas. Logo, a teoria interessante a desenvolver baseava-se na seguinte lei: os homens são beneficiados pelo casamento e com as mulheres passa-se o inverso. A partir da lei, cada um poderia avançar com a sua própria teoria. E eu, que li este livro na terra do «Grand Jacques» (Brel) e que tanto admirava a sua música e partilhava da sua misoginia, tive, enquanto estudante de Sociologia, que me render às evidências e tornei-me feminista. Porque achei que as mulheres se queriam matar porque os homens eram uns selvagens com elas e estes também queriam o mesmo quando não as tinham e, portanto, não as podiam maltratar. Na realidade, estou a exagerar. O que sempre achei é que as mulheres esforçavam-se muito mais do que os homens; sofriam muito mais: trabalhando, criando os filhos, cuidando da casa, enquanto eles viam futebol e deixavam o sofá da sala cheio de cascas de amendoins. Eram, portanto, umas óbvias sofredoras.
Continuei feminista todos estes anos – que foram muitos (tudo isto aconteceu há 40 anos) – e sempre defendi a igualdade de género em tudo o que não dependesse da força física. Por uma questão de educação, sempre tentei ser um gentleman, o que, por vezes, me fazia parecer machista, precisamente quando tentava proteger o «sexo fraco». Mas, em teoria, sempre fui a favor da igualdade do género.
Eis que, de repente, vejo uma notícia de jornal que me diz que, contra tudo o que é habitual na demografia, o número de homens, na Suécia, ultrapassou o número de mulheres. É uma situação rara, uma vez que os homens morrem mais cedo. Em Portugal, por exemplo, temos 47,5% de homens e 52,5% de mulheres.
Como bom sociólogo, fui investigar. E concluí que não era só a Suécia: a Noruega e a Islândia estão na mesma situação. Fui então ver as esperanças de vida à nascença nos diversos países europeus para descobrir quantos anos as mulheres esperam viver mais do que os homens. Ou seja, para identificar a diferença entre os dois sexos. E apresento alguns dados para 2013:
- Islândia: 3,2 anos (elas vivem mais 3,2 anos, em média, do que eles);
- Suécia: 3,6 anos;
- Noruega: 4,0 anos;
- Dinamarca: 4,1 anos;
- Alemanha: 4,6 anos;
- Grécia: 5,3 anos;
- Espanha: 5,9 anos;
- Portugal: 6,4 anos;
- França: 6,6 anos;
- Hungria: 6,9 anos;
- Polónia: 8,2 anos.
Constata-se assim que as sociedades com mais «desenvolvimento humano» e igualdade de género (leia-se «países do Norte») apresentam uma diferença menor. Quer dizer que se pode deduzir uma lei à la Durkheim: quanto maior é a igualdade de género, maior é a igualdade de esperança de vida. O que significa que eles, nessas sociedades, conseguem viver quase tanto como elas. E o que mostra a minha perspicácia em ter sido sempre feminista.
Quanto à teoria que explica esta lei, proponho uma: a igualdade de género traz harmonia. E a harmonia traz cumplicidade e prazer na companhia mútua. E este prazer implica bem-estar, calma, serenidade, prazer em viver e, em última instância, saúde. Em contrapartida, quando não há igualdade de género, elas ficam em casa enquanto eles saem, para os cafés, para os bares e para os ambientes masculinos, como o da caça – ambiente da minha perdição, e que frequento apesar de ser feminista – ou o do futebol. Ambientes recheados tentações: petiscos que fazem mal, álcool, viagens por vezes longas, noites mal dormidas. Ou seja, uma vida porventura emocionante, mas com consequências pelos vistos factualmente prejudiciais para a saúde.