Miragaia é um dos mais típicos bairros ribeirinhos do Porto. Em tempos passados foi residência de marinheiros e embarcadiços; de mestres e capitães de navios que andavam nas carreiras da Índia e do Brasil; na sua praia, onde, nos finais do século XIX, ergueram o edifício que é hoje o Museu dos Transportes, funcionaram os estaleiros navais do rei onde se construíam navios “tão bons como os que se faziam em qualquer outro sítio da Europa…” Miragaia foi terra de mercadores e de lendas. A começar pela que deu nome ao sítio, já evocada, numa das crónicas anteriores. Mas há mais.
Há a história da milagrosa imagem do S. Pantaleão, trazida para o Porto por cidadãos arménios, fugidos das invasões turcas.
S. Pantaleão, cidadão arménio, médico de profissão e católico, foi martirizado por não ter abjurado a sua fé. No século XV, fugindo a mais uma invasão turca, um grupo de arménios trouxe consigo o corpo de S. Pantaleão que foi colocado na igreja paroquial de S. Pedro de Miragaia. Pouco tempo depois era-lhe atribuído o milagre de ter salvo Miragaia de uma epidemia de peste. Foi de imediato “graduado” em patrono da cidade. Em Miragaia ainda e existe a rua Arménia onde os desta nacionalidade se fixaram.
E há aquela história dos bispos que, se administrassem o crisma em Miragaia, morreriam passado um ano. D. Lourenço Correia de Sá (1796/1798) não acabou a administração daquele sacramento e poucos dias depois morria. O mesmo aconteceu com D. António Barbosa Leão (1919/1929) que também morreu depois de ter crismado em Miragaia. A lenda ficou.
Mas a mais curiosa de todas é aquela que tem como protagonista o mercador de Miragaia, Pedro Gomes Simões. Ao que parece a vida não lhe corria lá muito bem. Nos negócios em que se metia, nunca tinha sucesso. E andou por todos eles. Meteu-se a construtor de navios e foi um desastre. Experimentou o comércio das especiarias vindas do oriente e faliu. Tentou o rendoso negócio do vinho e também aqui a sorte lhe foi adversa. Até que um dia teve uma ideia.
Voltou aos negócios “de grosso trato“ mas não foi sozinho. Meteu um sócio na empresa: Jesus Cristo. Exatamente, nem mais nem menos do que o doce rabi de Galileia. não querem saber que o negócio prosperou? Não só prosperou como começou a dar pingues lucros e aí Pedro Gomes Simão começou a dividir os lucros com o “sócio”. Como? – pergunta o leitor com toda a legitimidade. Da única maneira que tinha para o fazer: comprando paramentos novos para a igreja paroquial; dotando a confraria com novas alfaias, algumas como custódias e cálices, de ouro e prata; e pagando obras que se faziam na própria igreja. Ao fim e ao cabo, um sócio cumpridor.