Já sabemos que a maioria da população portuguesa tem falta de literacia financeira. Mas, enquanto esta tem sido uma discussão recorrente, ainda falta reconhecer que existe também falta de literacia para os negócios. Faz sentido começarmos pelo básico: enquanto não houver literacia financeira nunca vai haver literacia empresarial. Mas podemos (e devemos) adicionar este último tema à discussão.
Na minha perspetiva, a literacia empresarial em Portugal é muito baixa. Existe claramente uma lacuna no conhecimento acerca de como as empresas funcionam e das características fundamentais para que estas sejam bem sucedidas. Conceitos como economia de escala, vantagem competitiva, inovação disruptiva e indicadores como EBITDA, ROI e balanço são desconhecidos para muita gente. Curiosamente, creio que esta é uma lacuna transversal aos setores de atividade e até aos diferentes níveis de escolaridade. Diz-se que temos a geração mais qualificada de sempre – e eu não duvido disso -, mas quantos dos nossos licenciados sabem interpretar um balanço?
Podemos achar que este tipo de conhecimento só é útil para contabilistas e talvez se ache aceitável que uma pessoa sem ambição de ser gestor não tenha fluência nestes temas, mas esta é uma visão muito redutora. A literacia empresarial não só desempenha um papel central no desenvolvimento de negócios bem sucedidos, como permite melhorar a nossa situação financeira individual e ainda, de forma mais ampla, contribuir para o crescimento económico de um país, para uma economia mais estável e resiliente.
A fraca literacia empresarial nos gestores é, de facto, dramática porque afeta diretamente o sucesso das empresas que dirigem. Mas esta lacuna na população em geral é talvez ainda mais impactante, uma vez que afeta negativamente o ambiente de negócios, o que indiretamente restringe o investimento. Não precisamos efetivamente de ser todos gestores, mas para o nosso sucesso económico coletivo seria importante percebermos que não teremos mais qualidade de vida se não produzirmos mais valor.
Lançando um olhar global, parece-me evidente que os países mais prósperos economicamente são as nações que têm mais literacia empresarial e, principalmente, uma atitude positiva perante a iniciativa privada. Os EUA são um ótimo exemplo disto. Aliás, comparar a forma como as empresas são vistas nos EUA e em Portugal devia ser um exercício que nos tiraria o sono a todos. Nos EUA, celebra-se o sucesso e promove-se o empreendedorismo. Em Portugal, isto apenas acontece enquanto as empresas não crescem muito, até porque empresas com grandes lucros são vistas quase como um crime moral.
Outro exercício que nos deveria tirar o sono passa por tentar enumerar as empresas portuguesas que são conhecidas globalmente ou que dominam um setor de atividade a nível mundial. E temos de deixar de usar a desculpa do tamanho da economia e da população. A Suécia, com uma população de tamanho semelhante, tem o IKEA, o Spotify e a Volvo. A Suíça, também com população semelhante, tem a Nestlé, a Rolex e a Novartis. A Estónia, com apenas 1.3 milhões de habitantes – e apenas independente há pouco mais de 30 anos – tem o Skype, a Bolt e a Wise.
Portugal foi abençoado pelo clima, tem a felicidade de não ter conflitos armados há séculos, tem excelentes trabalhadores e, mesmo assim, está estagnado economicamente. O que nos falta? Falta um clima favorável ao empreendedorismo, literacia para os negócios, exemplos a seguir e, talvez, algum apetite para o risco. Hoje em dia, já temos, felizmente, uma visão positiva do empreendedorismo e vontade e energia de criar um ecossistema de inovação resiliente. Mas Portugal continua a ser um país com uma economia pequena e conservadora e o grande problema da economia pequena e conservadora é que o fracasso torna-se num estigma do qual o empreendedor pode não recuperar.
Precisamos de entender que não há prosperidade sem crescimento económico e que não há crescimento económico sem iniciativa privada. Precisamos de mais empreendedores e gestores, e cada vez mais qualificados. Da mesma forma, precisamos de trabalhadores que, mesmo que não queiram ser empreendedores, sejam intraempreendedores e elevem as suas empresas.
Desenvolver uma estratégia eficaz para a promoção de mais literacia empresarial será, provavelmente, o grande desafio. Se os educadores, pais e professores não a têm eles próprios, como a podem ensinar? Talvez isso explique que Portugal tenha dificuldade em sair do marasmo e que as maiores empresas cá estejam associadas a núcleos familiares, com o conhecimento e a experiência a terem sido transmitidos de geração em geração.
Portugal encontra-se, portanto, numa encruzilhada onde as oportunidades de crescimento económico esbarram na falta de literacia empresarial. Sem conhecimento, não há transformação; sem transformação, não há progresso. Se quisermos construir um futuro mais próspero, precisamos de investir urgentemente na literacia e na disseminação de uma cultura favorável aos negócios. Chegou a hora de Portugal deixar de ser um país que celebra o potencial e começar a ser um país que celebra os resultados.
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