Sem grande surpresa, à hora em que escrevo (20h40), o Chega é o grande vencedor da noite. É verdade que André Ventura, na sua primeira reação, mostrou uma prosápia típica, mas desnecessária, ao dizer que nunca nenhuma terceira força atingiu estes números. Ora, se é verdade que os 19% do PCP (APU), em 1979, de pouco contaram, visto que se registou, ao mesmo tempo, a maioria absoluta da AD, já em 1985, os 18% do PRD estiveram taco a taco com os 21% do PS – desta vez, a diferença para os primeiros é bastante maior. Ainda assim, depois destas eleições, e com estes resultados, o Chega fica como o enorme elefante na sala do Parlamento: se a AD vencer, como parece, nesta altura, acontecer, ensaiará uma solução à açoriana – aliás, vamos ver o que acontece na discussão do programa do Governo dos Açores, esta semana – e tentará governar em maioria relativa. Sem alternativa de governo para apresentar, o PS já anunciou que não apresentará qualquer moção de rejeição nem votará nenhuma que seja apresentada. De qualquer forma, o Chega é uma espada de Dâmocles sobre a cabeça de qualquer governo – e os partidos “da responsabilidade”, ou seja, do arco do Governo, terão de encontrar algum antídoto, em conjunto, se não quiserem ser devorados pela direita radical populista, ainda nesta década.
O grande teste, portanto, será o da discussão do Orçamento. Até lá, o novo governo continuará em campanha eleitoral e fará tudo para cimentar a sua popularidade, até cedendo a reivindicações das várias corporações que se manifestaram, em protestos, ao longo desta campanha. E há muito dinheiro do PRR para distribuir. Se isso funcionar, será complicado, para qualquer força política, derrubar um governo no auge do seu estado de graça. Pagaria bastante caro, nas urnas, como aconteceu aos partidos mais à esquerda, em 2022. Ora, o próximo grande momento de tensão seria o da discussão do Orçamento para 2026, daqui a um ano e meio. Com um pequeno pormenor: nessa altura, limitado constitucionalmente – faltarão menos de seis meses para as eleições presidenciais – Marcelo não pode dissolver o Parlamento, o que é um seguro de vida para o primeiro-ministro que exercer funções, na altura. Ou seja, a governabilidade que sair desta noite poderá ser mais sólida do que parece. O próximo governo é como os iogurtes: pode durar para além do prazo de validade.