Stress, em senso lato, é uma palavra inglesa utilizada para descrever o que sentimos quando estamos sob pressão mental, física ou emocional. Fatores que podem causar stress incluem aqueles causados pelas atividades diárias, como o trabalho, a família ou a nossa situação financeira. Outros fatores que podem causar stress incluem situações ligadas à condição socioeconómica de um indivíduo, como uma primeira infância difícil, certos estímulos ambientais, pobreza, discriminação e a perceção de desigualdades. Comummente utilizada, nem sempre de forma correta, a palavra “stress” resulta de mecanismos conhecidos e traduz-se em efeitos psicológicos físicos importantes.
Resultando de um processo evolutivo selecionado para a proteção e a sobrevivência, no cérebro, um circuito neuronal permite definir o que é ameaçador – e consequentemente stressante para um indivíduo. Sistemas fundamentais desse circuito incluem partes do cérebro como o hipocampo, a amígdala e áreas do córtex pré-frontal. O corpo responde a fatores causadores de stress através da libertação de hormonas como a adrenalina e o cortisol, que aumentam a pressão arterial, o batimento cardíaco e os níveis de açúcar circulantes (no sangue). Esta resposta, traduzida de forma literal, denomina-se “resposta de luta ou fuga”, embora “congelamento” possa também ocorrer perante situações de stress agudo. Estes mecanismos, e esta capacidade de resposta ao stress, é fundamental para gerirmos pequenos e momentâneos “avisos” ou “ameaças”, e em si não trazem qualquer problema. Mas fontes de stress duradouras são potencialmente prejudiciais, sendo assim classificadas como indutoras de stress “crónico”. Anos de investigação demonstraram que pessoas expostas a stress crónico apresentam problemas digestivos, cardíacos, hipertensão e um sistema imune menos robusto. Têm ainda maior probabilidade de sofrer enxaquecas, de ter problemas de sono, dificuldades de concentração, depressão e ansiedade e mesmo de contraírem infeções virais (incluindo por SARS-CoV-2).
Pessoas em stress crónico têm habitualmente comportamentos que podem incluir o sedentarismo, maus hábitos alimentares (excesso de gordura e elevado consumo de álcool, por exemplo), consumo tabágico, que são comportamentos associados a maior risco de desenvolvimento de diferentes cancros. Ou seja, stress crónico resulta numa pior qualidade de vida, o que pode aumentar o risco de desenvolver cancro. O que não quer dizer que o stress crónico causa cancro
No que ao stress crónico e o cancro diz respeito, qual a relação?
A maior parte dos estudos publicados à data, e comentados em sites cientificamente válidos e seguros, como sejam do inglês Cancer Research UK ou o americano National Cancer Institute, não mostram qualquer relação causal entre stress crónico e maior incidência de cancros. Ou seja, enquanto podemos afirmar com alguma segurança que stress crónico aumenta o risco de contrair diferentes doenças (mencionadas anteriormente), não encontramos relação com maior risco de vir a ter cancro.
Estudos epidemiológicos focados na relação entre stress crónico e cancro da mama, por exemplo, não demonstraram qualquer relação: pessoas com stress crónico não desenvolveram mais cancro da mama que outras em ausência de stress. O mesmo foi demonstrado relativamente a quaisquer características emocionais (incluindo otimismo ou boa disposição) e a incidência de cancro da mama: as atitudes emocionais de um indivíduo não alteram significativamente o seu risco de poder vir a desenvolver cancro.
Há, no entanto, estudos que sugerem uma relação entre aumento de incidência de cancro do pulmão, do esófago ou do intestino e stress crónico. Já referi numa crónica passada a importância dos números, e da estatística, nos estudos epidemiológicos e na compreensão do que podem ser fatores de risco ou simplesmente variáveis sem qualquer impacto e o desenvolvimento (a incidência) de cancro. Ora, na maior parte dos estudos que sugerem uma relação entre stress crónico e uma maior incidência de certos cancros, a relação entre essas variáveis poderá ser indireta (sem causalidade). Pessoas em stress crónico têm habitualmente comportamentos que podem incluir o sedentarismo, maus hábitos alimentares (excesso de gordura e elevado consumo de álcool, por exemplo), consumo tabágico, que são comportamentos associados a maior risco de desenvolvimento de diferentes cancros. Ou seja, stress crónico resulta numa pior qualidade de vida, o que pode aumentar o risco de desenvolver cancro. O que não quer dizer que o stress crónico causa cancro.
E será que stress crónico piora o percurso clínico de uma pessoa com cancro? Aqui estamos novamente perante os problemas que múltiplas variáveis criam a um problema biológico em si enormemente complexo. Pessoas com cancro têm naturalmente problemas psicológicos associados à sua condição clínica (ter cancro), que podem ser confundidos com stress: tendência para depressão, ansiedade, dificuldades de concentração, entre outros. Mas um organismo em stress crónico, nomeadamente pelo efeito ao nível do sistema imunitário, poderá ser mais propício a um pior percurso clínico? Modelos animais sugerem que sim, situações de stress crónico, como isolamento, ou aumentos de cortisol, favorecem a progressão tumoral e a formação de metástases, com impacto na sobrevivência. Ou seja, progressão mais acelerada de cancros que se desenvolvem em hospedeiros que estejam em stress crónico. Se a atitude de uma pessoa com cancro ajuda o seu percurso clínico? É uma pergunta distinta, que aparenta ter uma relação causal. Mas, como refiro anteriormente, uma relação causal entre stress crónico e o percurso clínico de pessoas com cancro é difícil de deslindar, existindo muitos estudos inconclusivos ou mesmo inconsistentes.
Ausência de stress, ou stress reduzido, está relacionado positivamente com aumento de longevidade e com envelhecimento “de qualidade”. Os comportamentos emocionais associados à ausência de stress incluem a socialização, a companhia de amigos e de família, o exercício físico e a procura de estímulos culturais que nos façam sentir bem. Tudo relacionado com menor incidência de cancro.