Estou farto de escrever micro-gaitices para azedar pacotes de açucar. O conto curto não dá para o paposeco nem para o Ventil. Para escrever preciso de comer bem.
Ter a barriguinha cheia e beber como uma orquestra de aldeia.
Beber como uma fanfarra, a tropegar atrás do andor do Senhor da Misericórdia e a a dar de frosqes para a tasca ao abrigo do foguetório – ò senhor padre, mais um bagaçol para soprar no oboé.
Encher a pança é fodido. É mais fodido que foder. É a fomeca.
Escrever pintelhices é fomeca na certa.
Para escrever um policial precisava de matar alguém, e isso dá trabalho.
Eu cá dava um escritor policial do camandro. Um Chandler postiço para vir na Caras a mamar champanhe rodeado de mamalhudas de bótox e barmans solícitos que nem agentes fúnebres.
Mas nunca matei ninguém. E para ser um escritor policial à séria temos de matar alguém, nem que seja o próprio autor.
Gostava mesmo de matar alguém, com uma derringer de jogador de póquer.
Um balázio nos cornos, um corpo a bóiar em Cacilhas, um plano à Hitchcock com um isqueiro com iniciais gravadas perdido na relva, e já está, um primeiro capítulo de estalo, pronto a entregar à editora mija na escada. – Venha de lá o cheque para ir comer um cozido que amanhã é quinta feira.
Para escrever policiais basta ler a bíblia, vem lá tudo. Fornicação, homicidio, castigo e redenção. Mas para isso é preciso ler a bíblia e isso dá trabalho.
Ainda não passei dos salmos. O Jornal de Letras pergunta-me no Facebook o que é que ando a ler. Ora e se fossem meter-se na vossa vidinha. E tu, Jornal de Letras, o que é que andas a comer? Ou melhor, quem é que andas a comer?
E toda a gente diz que anda a ler. Anda tudo a ler, rempimpadotes, ufanóides, exibicionistas. Mostrem lá o que andam a ler suas serigaitas, seus trolhas.
Eu cá ando a ler a Bíblia, mas só as entrelinhas. Todas as tribos de Israel se geraram umas às outras para vinte um séculos depois se unirem para foder a Palestina. No meio há uma corrida de quadrigas com o Ben Hur.
Para mim a Biblia é o Charlton Heston, e esse também gostava de derringers, winchesters e naturalmente whiskys. E ao que conste, lia pouco e mal.
Antes de escrever um policial preciso de chegar ao apocalipse. Até lá vou escrever um poema, pode ser que dê para o tabaquinho de enrolar e um escabeche bom para molhar o paposeco.
A poesia não mata a fome, mas pelo menos engana-a.
Poema para me alimentar
Fita adesiva
Em quadra festiva
Um pouco de sal
Nas cuecas do cardeal
Para limpar uma dentadura
Postiça
Que cacareja
Como coruja
Ou velha metediça
Com ossos que rangem
Como uma dobradiça
Com hálito de linguiça
Uma colher de sol
No meu chá
Uma banheira, que não me ralo
No teu presépio pagão
Como cão
Como cão ladrão
De ossos
Roídos
Carcomidos
Moídos
Em pó, ré, mi
Mimi
Sinto-me tão só sem tlim
E sem sentido obrigatório
Aleatório
Mictório
E tudo o que na minha língua acaba num clitório
Ou o escarlate do suspensório
Como deus ex machina
Vesti e despi por tlim e por mim
Mimi, do, re, mi
Pobre de mim
Festim, trim, trim, trim
Quando o telefone não toca
E já me esqueci da frase
A frase que acaba
Em tlim
E acaba em mim