Iniciativa com o apoio da CGD
A jornalista, comentadora e escritora Clara Ferreira Alves foi a convidada para encerrar o Encontro Fora da Caixa na Guarda, um evento da Caixa Geral de Depósitos, do qual a VISÃO é parceira de média.
Nas últimas décadas, Clara teve oportunidade de ver um mundo em mudança. E tudo o que vê é sobretudo destruição causada pelo Homem. “Assisti in loco à devastação que o nosso planeta está sujeito. E percebe-se porque o eng Guterres tem aquele ar desesperado – ele sabe o que se passa.”
Começou a olhar para o tema num tempo em que “a preocupação ambiental era nula”. “A ecologia tinha muito má reputação – era o famoso ‘verde por fora, vermelho por dentro’. Ser ecologista era considerado quase ser um agente comunista infiltrado. Tudo isto é muito recente e eu aderi a uma organização internacional de ecologia, porque este problema me interessa”, recorda.
“Neste momento, já ultrapassámos os sinais vermelhos todos e estamos a caminhar para a nossa extinção – não há disso a menor dúvida. Não é só partirmos atrasados, aquilo que se pensava que ia acontecer daqui a 10 ou 20 anos está a acontecer hoje”, afirma.
Nesta conversa com Mafalda Anjos, diretora da VISÃO, a jornalista passou pelos três elementos: água, terra e ar.
“A água vai ser um bem terrivelmente escasso no futuro. No Iraque há já guerras tribais pelo acesso à água. Na Cidade do Cabo há dois anos, a água deixou de correr nas torneiras. E não há chuva porque as florestas da chuva estão a ser dizimadas, na Indonésia, no Brasil…”
Por outro lado, as grandes indústrias extrativas do planeta continuam a um ritmo intensivo, “porque estão fora do espetro de observação”. “A destruição está a operar-se na Amazónia e na Ásia. O crescimento da atividade económica está a basear-se em extração, com indústrias altamente lesivas, e consumo imoderado, capturando recursos naturais”
Para Clara, é por isso “preciso falar dos maus da fita, só estamos a olhar para o petróleo e há outros agentes malignos”. “Metade do estado imenso do Mato Grosso já foi destruída, não para o gado e para as indústrias da carne, mas sim para a soja. A soja está em todo o lado, como aditivo nas comidas ultraprocessadas, tal como o óleo de palma. Multinacionais como a Rio Tinto, a antiga Vale do Rio Doce são muito poderosas e passam completamente ao lado, ninguém fala na Monsanto, por exemplo”.
Eis o ponto aonde quer chegar: há uma enorme contradição entre a atividade económica e o ambiente. “No futuro, se queremos proteger o planeta vamos ter de fazer privação e sacrifício, vamos ter de renunciar a uma economia que apenas consome, consome, consome… Temos de dizer às pessoas que não podem comprar tshirts a 4 euros e deitá-las fora! Nem a máquina de lavar, nem o computador e o telemóvel”, afirma.
Uma visão cataclística do futuro
“Os grandes cientistas estão desesperados. E eu própria fico angustiada. Sim, fico e estou angustiada! Angustia-me pensar nisso. O Elon Musk, que não é estúpido, como é evidente, e a razão pela qual ele quer colonizar Marte, é porque acha que estamos condenados à extinção. Os techies mais poderosos do mundo estão a comprar propriedades na Nova Zelândia para criar ecossistemas auto-sistemas para si e para os seus descendentes.”
Uma coisa é certa: vamos ter uma avalanche de refugiados climáticos. “O futuro é distópico – vamos ter de ter fronteiras e barreiras armadas para os migrantes climáticos”, cenariza.
“Vou todos os anos à Ásia. O efeito predador da China em certos países da Ásia como o Cambodja, Taiwan que envenenou o norte do Vietname… o cenário é aterrador”
E a própria geoestratégia neste momento não beneficia o planeta: “devíamos estar a colaborar uns com os outros e a política de blocos não o permite, com uma corrida ao armamento única onde se investem biliões deviam estar a ser investidos na preservação do planeta”.