Imagine uma casa com vista diretamente para a linha da água, em que o custo é mais acessível do que o de um imóvel tradicional na mesma localização e em que é possível mudar de vizinhança, literalmente, de um momento para o outro. As casas-barco estão em alta, um impulso inesperado dado pela pandemia e pelos confinamentos que despertaram a sede de novos horizontes.
Bem diferentes dos iates ou dos veleiros, as casas flutuantes são muito similares a uma casa convencional, com áreas mais generosas, mas não são feitas para grandes navegações. O objetivo é mesmo atracar numa marina e desfrutar da ligação à água e da envolvente.
A procura disparou desde 2020 em países como o Reino Unido ou o Canadá, mercados que já estavam estruturados e onde as comunidades nas marinas são uma espécie de pequenas aldeias aquáticas, com os proprietários a beneficiar de incentivos na aquisição, como a isenção do imposto de selo.
Um bom exemplo vem da região das Mil Ilhas, um gigantesco centro náutico que une o Canadá aos Estados Unidos da América, através do lago Ontário e do golfo de São Lourenço. É nesta costa interminável e salpicada por acolhedoras enseadas que está ao rubro o negócio na marina de Village Quay.
A pandemia trouxe novos clientes e criou uma dinâmica fora do habitual, com marinheiros de primeira viagem a comprarem a primeira casa flutuante e residentes já veteranos a aproveitar para trocarem a embarcação antiga.
O mais recente lançamento no Village Quay Marina foi assegurado pela empresa Destination Yachts, fabricante de casas flutuantes ultramodernas. Batizado de Condo Series, os barcos replicam o design e o layout de um apartamento num condomínio de luxo.
Vida de nómada
Este estilo de vida tem angariado um número crescente de adeptos junto dos nómadas digitais. É o que está a acontecer com o casal Terysa Vanderloo e Nick Fabbri, que soma 132 mil seguidores e mais de 17 milhões de visualizações no seu canal no YouTube, onde faturam milhares de dólares em patrocínios.
Em entrevista ao jornal australiano The Sydney Morning Herald, Terysa realça que as casas-barco seguem a mesma tendência que já se havia verificado com as autocaravanas, com os nómadas digitais a rejuvenescerem um estilo de vida que esteve, durante muito tempo, orientado para quem já estava na idade da reforma.
Os preços variam entre os €98 mil, para as casas mais pequenas, e os €200 mil, para as maiores, sem custos adicionais de atracagem na marina
“Agora que há um número crescente de pessoas que pode trabalhar a partir de casa ou, neste caso, do seu barco, sem sacrificar os seus empregos e as suas carreiras”, refere a australiana, sublinhando que, devido à pandemia, “as pessoas querem mesmo viver em pleno as suas vidas”.
Por cá, e apesar de ainda incipiente, o mercado começa a mexer. Um dos exemplos mais ativos vem da Homeboat Company, empresa italiana que trouxe para o nosso país as suas primeiras casas flutuantes. Dez estão atracadas na marina de Albufeira e mais 14 na marina do Parque das Nações, em Lisboa.
O negócio vai expandir-se, neste ano, para os Açores, onde já existe uma Homeboat em Ponta Delgada, mas o objetivo é chegar rapidamente às quatro. Das 25 casas já em serviço, apenas três pertencem à Homeboat; as restantes foram adquiridas por particulares, todos nacionais.
As casas-barco são produzidas na Polónia e trazidas para o seu destino em camiões. A Homeboat vende a particulares que, por sua vez, lhe entregam a sua casa flutuante, para que esta faça a gestão turística, podendo desfrutar do espaço durante duas semanas por ano, modelo similar ao que existe em muitos empreendimentos de turismo residencial. Os preços da tarifa média anual rondam os €130 por noite.
“Temos vários nichos de mercado. No turístico, as casas-barco têm apoio, como se fosse um serviço de hotel, com refeições, limpeza, internet, etc., e ficam atracadas nas marinas. Mas também vendemos a quem prefira usufruir da sua casa-barco durante o ano inteiro. Nesse caso, transportamos a casa totalmente montada, chave na mão, até ao destino, em qualquer marina europeia”, explica a diretora de operações da empresa, Alexandra Mariath, referindo que os preços variam entre os €98 mil, para as casas mais pequenas, e os €200 mil, para as maiores, sem custos adicionais de atracagem na marina.
E podem as casas ser utilizadas como barcos e navegarem à aventura, por grandes distâncias? Não propriamente. “Mas elas podem navegar, vêm com motor e são perfeitas para barragens ou outros locais com águas mais calmas”, afiança a responsável.