
“mel maclaine”
É um clássico que não vem nos manuais: todo o jornalista tem no taxista um primeiro cicerone do local a que chega. E todo o taxista deveria ter um GPS para guiá-lo ou para dizer como está o trânsito. Também há quem prefira o Whatsapp. Um clique aqui e ouve-se uma mensagem de voz a dizer como está o trânsito no centro de Dublin; dois quarteirões mais à frente e há mais uma mensagem a dizer que há uma multidão de gente à espera no Aeroporto. Por que é não usa antes um GPS como os taxistas de Lisboa? O cicerone responde: «Porque não funciona em Dublin».
Não há plataformas que mostram a evolução do trânsito em Dublin – mas bem que dava jeito uma coisa do género nos três dias da Web Summit, com mais de 40 mil visitantes sequioso de inovação e novas tendências. Na capital irlandesa não se fala de outra coisa. Dos negócios que hão de vir – e dos que se vão embora. Web Summit incluída, rumo a Lisboa, em 2016.
O semáforo obriga a parar. Por que raio é que Web Summit vai embora? Os dois minutos de espera chegam para traçar todos os cenários que só são ditos em off the record – e também aqueles que já são conhecidos: as desinteligências entre a organização do evento e as autoridades irlandesas; a necessidade de expandir o evento para outras paragens; o clima de Lisboa e alguma tradição no turismo. No final, não há uma conclusão definitiva. O semáforo abre, o carro arranca. E já se fala do futuro; daquilo que não muda de poiso tão facilmente. O cicerone enumera: em Dublin, estão a Microsoft, a Google, a Cisco, a Apple. E a Facebook. Disse mesmo Facebook? Coincidência ou não chegámos ao destino – às portas da Web Summit, um dia antes de arrancar, para assistir à abertura das hostilidades, com o diretor de Tecnologias da Facebook Mike Schroepfer pronto para mostrar como as redes sociais podem ir além do like, do post e dos links patrocinados.
A visita ao futuro é de longo prazo, mas demora menos de meia hora no stand da Facebook. Schroepfer explica como é que a maior marca das redes sociais quer levar a Internet para África, América do Sul, Ásia a bordo de drones movidos a energia elétrica capturada por painéis solares e armazenada em baterias. Pelo meio, gaba as vantagens dos drones face aos balões da Google que um dia haverão de fazer o mesmo. Lembra que os drones vão poder sobrevoar um espaço entre os 18 e os 27 quilómetros de altitude, que permanece sem regulação e sem rotas comerciais, e diz mesmo que a Facebook pretende garantir as devidas autorizações junto das autoridades locais de cada país. Sim, porque a Internet é “disruptiva”. As redes sociais também. A denominada “primavera árabe” é a prova disso mesmo.
Mas não é da sempre sensível política internacional que Mike Schroepfer quer falar. A tecnologia, que está presente no título que ocupa dentro da maior rede social, é o que o ocupa a tempo inteiro: a Facebook vai iniciar os primeiros testes com os “drones da Internet” no final do ano, num local em segredo estratégico. A estreia comercial ainda não tem data. E neste caso a ausência de resposta pode não se dever a uma questão de estratégia comercial: para garantirem a cobertura de um país, os drones deverão criar uma constelação; cada membro voador dessa constelação terá de comunicar com recurso a lasers. «Esse é o maior desafio: fazer com que os lasers emitidos pelos drones acertem nos alvos. É como acertar com um apontador de laser vulgar numa moeda de dois cêntimos a 15 quilómetros de distância», compara Schroepfer.
Na inteligência artificial, pelo contrário, os investigadores da Facebook já conseguem uma precisão bastante assinalável: põe-se um carro de bombeiros “de brincar” à frente de uma câmara e o sistema identifica-o; um peluche e o mesmo sistema diz que se trata de um cão, depois de uma ou duas tentativas frustradas por mau posicionamento do boneco. Ainda nos cães e no reconhecimento de imagens: o mesmo sistema distingue raças de cão que a maioria dos humanos presentes não sabe traduzir para a língua materna, ou nem sabe que existem. Nos vídeos, a situação é mais frenética: o sistema reconhece objetos, desportos, animais ou pessoas num sortido de vídeos que passam rapidamente – tudo a uma velocidade que concorre com a compreensão humana.
O responsável pelas tecnologias da Facebook dá um exemplo de uma aplicação possível para a tecnologia: legendas para imagens que ajudam pessoas com visão limitada a perceberem o que têm à frente; seleção automática de vídeos e posts com os conteúdos mais apreciados por cada perfil. Mas tudo com conta e medida: «queremos dar à pessoas o que elas mais gostam de ver, mas não podemos limitar de mais a seleção, caso contrário a pessoa fica agarrada só àquilo que já conhece e não expande a sua experiência e não cria engagement».
O Facebook será aquilo que cada um quer ou o que os colaboradores de Zuckerberg conseguirem fazer dele? A resposta terá de esperar e não será nos 20 minutos de táxi (sem ajuda da Whatsapp) até à receção na embaixada de Portugal que será encontrada.
Na embaixada, rostos conhecidos e outros que se estreiam no carrossel das ideias valiosas. Entrevistados de outras andanças; pessoas que querem ser entrevistadas; e pessoas que valem a entrevista. «Engagement», diz Mike Schroepfer. Engagement é também o que Miguel Frasquilho, líder da AICEP, garantiu junto da organização da Web Summit quando a convenceu a sediar a mãe das Web Summits em Lisboa (secundada por eventos similares espalhados pelo mundo). O investimento está orçado em 1,3 milhões de euros. O retorno poderá chegar aos 175 milhões de euros.
Frasquilho recorda que o evento não se limita às tecnologias. Exulta os benefícios que pode ter para a indústria agroalimentar portuguesa; não teve a sorte de ouvir o tal taxista-cicerone-do-whatsapp a falar das grandes marcas tecnológicas que estão em Dublin, mas logo lembra que a Google e a Microsoft também estão em Portugal. «Ainda nada está definido, mas ainda há a possibilidade de a Cisco reforçar a posição em Portugal». Não se alonga nos detalhes, até porque a decisão cabe apenas à Cisco.
Voltando à Web Summit: lembra que foi criada uma task force para fazer o que é preciso para que esse tudo corra bem; nega a escassez de camas de hotel em Lisboa e arredores, e lembra que Lisboa ganhou a cidades que têm ligações aéreas mais facilitadas com a Europa e a Ásia. «Em 2014, houve mais de 20 mil participantes; este ano haverá mais de 40 mil; e para o ano acredito que sejam mais de 50 mil», prevê. E logo atira: «isto não é uma conferência, mas sim 21 conferências, da tecnologia, à moda, ao design». E deixa mais uma previsão quanto ao empreendedorismo: «não é à toa que as exportações passaram de 28% para mais de 40% do produto (interno bruto) em cinco anos; e acho que vamos passar os 50% em 2020».
Alexandre Nilo da Fonseca, presidente da Associação para a Economia Digital (ACEPI), também se deslocou à embaixada em missão diplomática. Tem um estilo diferente das dezenas de jovens empreendedores que procuram fazer contactos e que foram convidados para a receção de boas vindas, mas também tem um objetivo definido: Tem em mente uma possível parceria entre ACEPI e Web Summit. «É um acontecimento importante para a economia digital, que vai colocar Portugal no mapa. Vai levar os empreendedores a perguntar: por que não criar uma empresa em Portugal?. Não é só impacto no turismo; e não é só um impacto de dois ou três meses, mas de longo prazo».
Emília Simões, criou a Last2Ticket há quatro anos, e por isso sabe que já não pode ser considerada uma startup daquelas que ainda estão no start. Tem fairplay para com o jornalista que a entrevistou um ano antes e diz que aquele tal projeto inovador do passado que afinal não funcionou. Mas já tem outro “fisgado”: Quem sabe se a Web Summit não precisa de uma solução de bilhética? «(a ida para Lisboa) É uma oportunidade para muitas empresas portuguesas se juntarem ao evento». Miguel Frasquilho não a ouviu mas seguramente estaria de acordo com a previsão.
Como Sílvia Freitas, fundadora da recém-lançada School Embassy, muitos outros empreendedores têm uma ideia, mas ainda andam à volta do tal detalhe que vale ouro. A School Embassy é uma plataforma que permite classificar as várias escolas – para que os pais saibam onde colocar os filhos. Falta o detalhe que vale ouro e que talvez chegue com a Web Summit: «espero muito por novas ideias para um business plan», refere a mentora da plataforma. Bruno Miranda não diria melhor ao explicar como a Buddy Sports foi capaz de juntar pessoas que gostam de fazer o mesmo desporto: sem grande divulgação conseguiu 3500 utilizadores – um quarto fora de Portugal. «A Web Summit é também uma oportunidade de sair de Portugal e fomentar o relacionamento com outras startups que podem ter interesses em comum».
Hoje, quando Paddy Cosgrave, o mentor desta mega conferência, abrir a Web Summit os sonhos e os anseios dos empreendedores portugueses começarão a ganhar forma. Tudo começa às 9h20. Se houver um taxista com whatsapp para descobrir o caminho melhor para fugir ao trânsito.