Num mundo severamente afetado pela pandemia do coronavírus, em que os governos têm como principal preocupação mitigar o contágio do surto até que seja encontrada uma vacina, muitas questões de privacidade ou da falta dela têm sido levantas pela sociedade em geral.
Recentemente um dos tópicos abordados pela sociedade prende-se com o facto da utilização de sistemas de videovigilância para medição de temperatura corporal dos trabalhadores e qual o enquadramento legal de tais medições no contexto da Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD) [*1].
Importa, pois, referir que a utilização de tais sistemas, e o seu enquadramento é bem claro: os sistemas de um sistema de videovigilância têm como finalidade a proteção de pessoas e bens. Assim sendo, a questão primordial é a seguinte: pode a utilização de tais sistemas ser estendida ao combate do coronavírus ajudando a proteger a vida humana e garantir que a utilização de tais sistemas tem como objetivo a proteção e não o controlo de pessoas?
A resposta a esta pergunta é claramente afirmativa, e todas as entidades envolvidas assumem um papel relevante na sua implementação.
Os sistemas de videovigilância no âmbito do COVID-19 permitem a recolha e a retenção de dados, tais como a temperatura corporal, e o seu armazenamento deve considerar as verdadeiras necessidades e a sua relevância médica. Após a pandemia e como regra geral, todos os dados pessoais devem ser apagados ou anonimizados de acordo com as Diretrizes n.º 4/2020 do Comité Europeu para a Proteção de Dados.
Para além do já mencionado importa também referir que estes sistemas podem e devem ser utilizados num sem fim de cenários tais como:
– Verificação do número máximo de pessoas que pode estar dentro de um estabelecimento comercial considerando múltiplas entradas;
– Verificação da utilização das EPI’s e máscara de proteção, quer em ambiente fabril quer em espaços comerciais;
– Verificação de aglomerados, com alertas sonoros automáticos;
– Verificação da dotação máxima admissível nas praias nacionais em função da sua capacidade;
– Verificação do distanciamento físico entre pessoas nas diversas atividades económicas e nos tempos de recreio.
Hoje em dia existem diversos sistemas de videovigilância que têm analítica de vídeo e ‘machine learning’ incorporada que permitem responder aos desafios descritos anteriormente através de soluções 100% RGPD-Compliant que se mostram verdadeiras soluções de proteção em oposição a soluções de controlo.
Falamos de sistemas baseados em análise de vídeo e reconhecimento de comportamentos através de uma aprendizagem inteligente, que entregam dados inteligentes, detetando ameaças e gerando os alertas oportunos e em tempo real.
Um exemplo prático deste tipo sistemas é uma câmara que analisa a cena e que através da analítica de vídeo incorporada gera um conjunto de ‘metadados’ que categorizam os objetos tais como: camiões, carros, motas e pessoas em pé.
Estes mesmo metadados recolhidos serão enviados em tempo real diretamente para uma base de dados, por exemplo em SQL, que será utilizada por um software gráfico para apresentar os dados de ‘Smart-Cities’. A informação que é armazenada não identifica especificamente uma pessoa comparando-a com uma foto do individuo, nem identifica um carro específico associado a uma matrícula. A solução tem apenas como objetivo principal categorizar os objetos na generalidade e responder a questões de interesse público:
– Estado do tráfego;
– Quantificação de fluxos, ajuntamentos e distanciamento social;
– Deteção automática de incidentes;
– Gestão de parques de estacionamento;
– Controlo da iluminação pública tendo por base o número de objetos e tipo de categoria.
Importa por isso desmistificar e esclarecer, que a tecnologia associada a estas soluções de videovigilância não tem como objetivo assumir um papel de ‘big brother’ dos cidadãos, mas sim de contribuir para a segurança de todos. E essa é uma missão que se posiciona cada vez mais como uma prioridade para a segurança das cidades e das suas pessoas, ainda mais em tempos de pandemia.
*1: Regulamento (EU) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2020