A Google quer saber como anda o setor da Inteligência Artificial nos países da Bacia do Mediterrâneo e para isso patrocinou estudos sobre o tema em cada um deles. Em Portugal o trabalho foi feito em parceria com a Fundação Francisco Manuel dos Santos e coordenado por João Castro, professor na NOVA SBE.
Apresentado hoje num debate promovido pela fundação, o relatório traça um retrato positivo, em que os pontos fortes são a qualidade da formação na área e o aparecimento de start-ups que exploram este potencial e os fracos a baixa adesão em setores como a banca ou as PME. São apresentados exemplos de empresas que se destacaram a nível internacional, como a unicórnio Talkdesk e a candidata Feedzai, entre outras start-ups que se têm destacado a nível internacional.
Boa parte do trabalho, com o título Artificial Intelligence Pathways and Opportunities, a View from Portugal, foi feito a partir de entrevistas aos principais atores no meio – e que a Covid tornou bastante mais difícil. Maior aposta na área da saúde, sobretudo em aplicações na luta contra o cancro, com ferramentas aplicadas no diagnóstico e procura do tratamento mais adequado é um dos pontos fortes. Por outro lado, o setor da banca surge mais conservador e com uma atitude seguidista, embora existam alguns exemplos na banca online e nas ferramentas de apoio à análise de risco. Ao nível das PMEs, há ainda muito trabalho a fazer, o que não quer dizer que não haja também casos de aplicação desta tecnologia em áreas como a deteção de fraude e o comércio eletrónico.
“O que tenho visto é alguém que tem a ferramenta e olha em volta e avalia onde é que a pode usar. Ou seja, alguém que tem o martelo e vai à procura dos pregos”, ilustra o coordenador do estudo, João Castro, professor na NOVA SBE. Como exemplo apresenta o caso da Feedzai: “Quando a empresa iniciou atividade não estavam à procura de fraude nas transações bancárias, estavam a tentar detetar anomalias nas redes elétricas.”
Para os entrevistados, são claras as diferenças entre os caminhos seguidos pela Europa, certinha, a orientar-se pelo Regulamento Geral de Proteção de Dados, a América, casa do capitalismo, a seguir o lema ‘os dados são o novo petróleo’ onde empresas como o Facebook fazem dos dados dos utilizadores a sua moeda de troca, e de enriquecimento, e a abordagem chinesa, completamente à mercê do governo.
No trabalho, realça-se ainda o crescimento do “ceticismo saudável” relativamente aos sistemas de IA. Sendo os maiores geradores de desconfiança o aparecimento de deepfakes, com a sua capacidade de camuflar a verdade através de imagens e vídeos gerados por computador, e a manipulação que o Facebook faz da timeline para maximizar o tempo de sessão, induzir estados de espírito e influenciar tendências de voto.
Uma das principais recomendações de João Castro é que se “alargue o debate sobre a IA”, suas aplicações e limites à sociedade portuguesa. Porque uma coisa é certa: ela veio para ficar.