O Bom Jesus estava a caminho da Índia em 1533 quando desapareceu, sem deixar rasto. O navio foi encontrado por acaso em 2008 e a sua carga, bem como o excelente estado de preservação, ajudam agora a comunidade científica a analisar a comunidade de elefantes em África, produzir descobertas interessantes e ajudar a desenvolver políticas anti-caçadores furtivos.
“Há pratos de refeição, talheres e baús, bem como lingotes de cobre e moedas de ouro e prata e marfim a bordo”, revela Ashley Coutu, arqueóloga da Universidade de Oxford. Mais do que o valor monetário dos itens encontrados, a comunidade científica está interessada na componente de ADN do material a bordo. As presas em marfim estiveram tão bem preservadas que os cientistas conseguem descobrir evidências genéticas de 17 manadas distintas de animais e detetar pistas do seu regime alimentar, que revela onde moravam e onde possam ter sido caçados. Atualmente, só quatro destes grandes grupos podem ser encontrados em África, noticia a BBC.
A equipa analisou o ADN mitocondrial, que permite traçar a genealogia dos animais e que é uma peça particularmente reveladora. Alida de Flamingh, que liderou um estudo onde participaram vários investigadores internacionais, explica que “os elefantes moram em grupos familiares liderados por fêmeas e tendem a permanecer na mesma área geográfica ao longo da sua vida. Conseguimos reconstruir genomas mitocondriais completos a partir destas amostras verdadeiramente antigas”. As presas agora encontradas e analisadas provêm de 17 manadas distintas, mas só quatro desses grupos podem ser vistos na atualidade, o que prova que 13 foram extintos. “Foi chocante – a falta de diversidade. A seguir, gostaríamos de conseguir preencher as lacunas de forma cronológica (…) Sabemos que a falta de diversidade tem implicações na conservação”, completa a especialista.
A análise isotópica das presas permitiu aos investigadores perceber que os elefantes habitavam em zonas de floresta. Os cientistas chegam a essa comunidade ao analisar os vestígios da dieta alimentar dos animais, encontrados no marfim.
Estas conclusões vão permitir também estabelecer estratégias de combate à caça furtiva. Quando as autoridades confiscam grandes quantidades de marfim de contrafação, é feita uma análise genética para se perceber onde os elefantes foram caçados e “as nossas provas vão fornecer um quadro de referência para se comparar e se poder confirmar a origem. Assim que se sabe de onde é que o marfim vem, podemos desenvolver estratégias anti-caçadores furtivos nessas localizações”, explica de Flamingh.