Em junho passado, a Securitas Direct apresentava o seu Barómetro de Segurança relativo a Portugal e os números deixavam poucas dúvidas: os assaltos e tentativas de assalto aumentaram 11% no primeiro semestre de 2023, e face a igual período do ano anterior. Estes dados, a pecar será por defeito, uma vez que a empresa utiliza como fonte de monitorização os alarmes que tem instalados. Em termos globais, os pequenos negócios, como lojas e restaurantes, foram o alvo de 56% destas infrações.
No Reino Unido (UK) e nos Estados Unidos da América (EUA), várias grandes retalhistas têm reportado perdas avultadas devido ao aumento dos roubos em lojas, sobretudo nas de rua. Marcas como a John Lewis (UK), a Mountain Wharehouse (UK), a Home Depot (EUA) ou a Target (EUA) já falaram publicamente à imprensa sobre as dificuldades em combater aquilo a que o jornal britânico Financial Times (FT) chama de “onda de crimes”.
Dados do British Retail Consortium, – a associação empresarial de retalhistas britânica – libertados este ano, mostravam que entre 1 de abril de 2021 e 31 de março de 2022, os roubos por clientes superaram os que aconteceram na era pré-covid, com 8 milhões de incidentes a custar cerca de €1,1 mil milhões às empresas. Funcionários de lojas como a Primark ouvidos pelo FT revelaram que muitas vezes são eles quem vão atrás dos ladrões, e que apesar de haver uma política de reporte da totalidade dos incidentes, a polícia pouco faz.
O responsável da loja de Oxford Street, em Londres, da retalhista japonesa Muji, contava à mesma publicação que a empresa nem sequer reporta roubos de menos de 400 ou 500 libras esterlinas, uma vez que não haverá consequências mesmo que o faça. “As pessoas estão a ficar cada vez mais corajosas, uma vez que a justiça não funciona. Podem levar coisas no valor de 30 libras de uma vez, e depois voltar para vir buscar mais”. Nada vai acontecer, garantem os vários responsáveis.
Já em maio deste ano a CNBC tinha dado conta de que, por exemplo, a gigante americana Target tinha reportado perdas na ordem dos 763 milhões de dólares em inventário, o que penalizaria os seus lucros em cerca de mil milhões de dólares.
No mesmo sentido, empresas como a Dollar Tree, a Kohl’s ou a Foot Locker deram conta de que os últimos anos foram extremamente difíceis no que toca ao desaparecimento de inventário, muito relacionado com roubos por clientes. Todas as retalhistas ouvidas, na altura, pela CNBC admitiam que tanto as suas margens como os lucros iam ser fortemente impactados pelo acontecimento.
O CEO da Walmart, Doug McMillon, foi mesmo mais longe e referiu à cadeia de televisão americana que os roubos atingiram “máximos históricos” e que, “se a questão não for corrigida com o tempo, os preços vão subir e / ou as lojas terão de fechar”.
Há cerca de um ano, uma reportagem do Expresso dava conta de um aumento considerável de roubos nos supermercados em Portugal. Imagens controversas de latas de atum dentro de caixas com alarmes ou peças de controlo em embalagens de peixe congelado encheram as capas de jornais e abriram telejornais. Na altura, o presidente da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) referia ao semanário que “é um fenómeno que está efetivamente a subir bastante, sobretudo desde o início de setembro e em particular nos grandes centros urbanos de Lisboa e do Porto”. Gonçalo Lobo Xavier adiantava que o leite e a comida enlatada, como as salsichas e o atum, estavam entre os produtos mais visados e avisava: “Não há nenhuma dúvida que são roubos para comer. É o primeiro sintoma de uma grave crise social”.
Na ocasião, várias grandes cadeias de supermercado davam conta de uma quebra de inventário provocada pelos roubos – sobretudo em lojas de rua, também – embora nenhuma tenha querido divulgar o impacto concreto dos incidentes nas suas contas.
O facto de muitos dos casos não serem reportados – sobretudo nos supermercados, onde os gerentes afirmam que entendem o desespero que leva as pessoas a furtar para comer – dificulta a existência de dados concretos.
Ainda no Reino Unido, as retalhistas têm gastado somas consideráveis no aumento dos dispositivos de segurança, seja através da instalação de câmaras corporais a serem usadas pelos funcionários ou diferentes sistemas de alarme, bem como na contratação de seguranças privados. Mas a John Lewis foi ainda mais longe, e agora oferece café aos agentes da polícia, como incentivo para que estes passem mais tempo dentro das suas lojas. Que é como diz o ditado popular português: a necessidade aguça o engenho.