Inês Caldeira foi a primeira mulher e a pessoa mais jovem (aos 35 anos) a assumir a liderança de uma filial do grupo de produtos de higiene pessoal e beleza L’Oréal.
Na nomeação do novo governo houve polémica porque alguns meios de comunicação social referiram-se a três ministros pelas suas origens (africana e cigana) e deficiência (cega). Quando chegou à liderança da L’Oréal, sentiu este tipo de diferenciação, no seu caso por ser mulher e muito jovem?
Essa pergunta tem várias questões. Há a política de diversidade da L’Oréal e há a nomeação da Inês Caldeira, que são coisas distintas. A política de diversidade é um dos valores basilares desta casa, que pode ver pela diversidade do nosso portefólio, o tipo de marcas que temos, a presença intercontinental e os nossos colaboradores. Acreditamos profundamente que da diversidade sai riqueza, que só saem coisas boas.
Acha que a L’Oréal herdou isso da cultura francesa, que é a sua origem?
Acho, e isso é das coisas mais bonitas que o grupo tem. Não é só uma política, é uma forma de estar, e, quando assim é, não soa a falso. Essa é a questão. O governo, como diz, tem essa diversidade… estamos em 2015. Depois tem a ver com a nomeação da Inês Caldeira. De facto, sou mulher e sou a country manager mais jovem da L’Oréal do mundo. Neste caso, não me importo nada de fazer parte da minoria, porque acho que as minorias se transformam em maiorias através de pequenos passos.
Foi nomeada por ser mulher e jovem?
Não. Acho que não há nenhuma empresa, cotada em Bolsa ainda por cima, que eleja pessoas com base nesse critério, ainda por cima em cargos de tanta responsabilidade. Para mais, porque a Inês Caldeira ser CEO da L’Oréal Portugal não é senão o reflexo da população, e atingimos a paridade total, com 60% de mulheres no comité executivo, pela primeira vez em setembro. É verdadeiramente uma filosofia.
Alguma vez sentiu condescendência ou, pelo contrário, teve que trabalhar mais e melhor por ser mulher?
Não. Não quero parecer politicamente correta, mas não estou a mentir. O meu nível de exigência é o mesmo desde os seis anos de idade, não foi imposto por ninguém nem tive que trabalhar o dobro ou o triplo. Aliás, sempre trabalhei o dobro e o triplo, mas por mim, desde os seis anos de idade. Pode falar com a minha professora primária… [Risos]
De onde é que vem esse nível de exigência consigo própria? Foi cultivado pelos seus pais?
Os meus pais sempre foram assim no seu âmago. O meu pai tinha um café, a minha mãe é enfermeira, e sempre fizeram tudo dessa forma. Nunca vi o meu pai faltar ao trabalho e saía de casa às seis da manhã e voltava às nove da noite. Este é um exemplo que nos marca. Depois, por causa das minhas origens e do meu contexto, nunca pude falhar nem dar-me ao luxo de pensar que podia repetir um ano ou ir para uma escola ou universidade privada. A minha irmã e eu sempre tivemos consciência de que os nossos pais faziam grandes sacrifícios e que cada um tinha o seu trabalho: o deles era trabalhar, o nosso era estudar. Não que eles me tenham imposto metas.
Era boa aluna?
Era. Fui excessivamente boa aluna.
Sentiu que perdeu alguma coisa na juventude e no início da idade adulta por estar tão dedicada aos estudos e ao trabalho?
Fui muito feliz, mas se calhar fiz menos coisas do que os outros fizeram. Tive mais angústias. Não sinto que tenha viajado imenso, por exemplo, mas isso tem a ver com o facto de não poder. Comecei a viajar quando comecei a ter dinheiro para isso. Mas gostava de ter sido mais irresponsável, porque o confronto com o erro é uma coisa muito saudável para todas as pessoas e eu tive isso muito tarde na minha vida.
Porque é que não teve o confronto com o erro?
Porque nunca chumbei, nunca tive uma negativa, nunca tive uma entrevista de trabalho em que não tenha sido bem sucedida. Quando errei pela primeira vez, senti que saí mais forte. Com o erro aprende-se mais rápido, o erro é um catalisador, e na Europa temos pouco isso. Os americanos é que dizem ‘se você não tiver falhado pelo menos três vezes na vida, não venha ter comigo’ e não lhe dão dinheiro. Aqui, na Europa, o raciocínio é ‘ai meu Deus, que ela já falhou três vezes’.
Voltando à questão da diversidade. A L’Oréal tem quotas ou cria condições para que as mulheres cheguem ao poder?
A L’Oréal não tem quotas e temos mais dificuldade em recrutar homens, por incrível que pareça, por causa do tipo de negócio. No recrutamento, temos mais tendência para criar condições favoráveis aos homens do que às mulheres. Temos políticas de maternidade e paternidade e criamos condições de autoestima profissional e de arriscar que ajudam as mulheres a crescerem e a florescerem na organização.
Essas condições traduzem-se em quê?
Proporcionar um equilíbrio em que as pessoas possam ir ao médico se precisarem. Ou, se o filho passou mal a noite e não puderem vir de manhã, não vêm. Há essa flexibilidade, obviamente dentro dos limites do bom senso. Se há coisas para melhorar, sim, se somos uma empresa que cria as condições para as mulheres florescerem, sim. Há uma coisa importante que é as mulheres muitas vezes autoexcluírem-se.
Porquê? Pouca ambição ou não fazer sombra ao marido?
Não, talvez insegurança e perfeccionismo, duas coisas que estão interligadas. Uma mulher, para se candidatar a um trabalho, irá pensar ‘preciso disto, disto e mais isto’. Em dez critérios, acha que precisa de cumprir os dez e não se candidata se não os cumprir. Um homem, se cumprir dois critérios, diz ‘fantástico, tenho dois, os outros oito aprendo pelo caminho’. A mulher pensa em como vai compatibilizar isso com a sua vida. Um homem nem pensa nisso e diz ‘ainda tenho tempo para ir ao futebol à quarta-feira e ao domingo estar com os amigos’.
Porque é que as mulheres cobram-se tanto a si próprias?
Acho que tem a ver com questões culturais com milhares de anos. Penso às vezes o contrário: como seria o equilíbrio social e da sociedade se nós não fôssemos assim? E para essa [pergunta] ainda não tenho resposta. Há uma certa vantagem em as mulheres ponderarem antes de avançar. Porque se não houvesse alguém preocupado com a unidade familiar isto também colocaria outro tipo de desafios.
Estava a falar-me sobre terem conseguido a paridade na comissão executiva. Isso foi em Portugal?
Sim, em Portugal e pela primeira vez na história.
A filial portuguesa foi reconhecida como a referência europeia em diversidade e equidade laboral?
Sim, este ano.
Porque é que isto acontece mais em Portugal do que noutras filiais?
Tem a ver com a igualdade de género: temos a primeira mulher na liderança ao fim de 53 anos de história de uma filial e chegámos à paridade. Li em algum sítio que em Portugal só há 2% das empresas com paridade, e ainda assim tenho as minhas dúvidas sobre esta percentagem. Depois tem a ver com a nossa paridade de idade. A L’Oréal tem o equilíbrio perfeito entre pessoas com mais de 50 anos e com menos de 30 anos. A riqueza que sai daí e os impactos nas políticas de recursos humanos são gigantescas, porque as necessidades dos colaboradores não são iguais, nem as formas como gerimos as carreiras e as expectativas. E depois tem a ver com o facto de sermos um país mais solidário.
Qual a percentagem de mulheres a nível dos cargos de chefia?
60%/40% a favor das mulheres, o que é representativo da população. Não quero aqui parecer femininista, é um reflexo direto da população, e isso é que é o equilíbrio.
Como é a experiência de ter mais mulheres a dirigir homens?
No total, somos 300 colaboradores. Adoro ser gerida por homens, gerir homens, ser gerida por mulheres e com isto é que o critério que me importa é a competência e o talento. Já tive que trabalhar com homens e mulheres que não tinham o mínimo de competência, mas felizmente cruzei-me na vida com muito mais pessoas competentes.
Não há diferenças?
Os homens tem características muito interessantes. Acho que são normalmente muito bem-humorados, e isso é importante em posições de stress. Conseguem gerir um alto índice de stress e competitividade porque são muito mais competitivos do que as mulheres. Da minha experiência, é completamente falso que as mulheres são muito competitivas e péssimas umas para as outras. Os homens têm uma forma de gerir muito interessante: não têm de ser perfeitos em tudo, e isso é uma liberdade fantástica. Para as mulheres, tudo tem de estar sempre perfeito, o que introduz uma certa tensão.
Nos cargos de chefia mais intermédios há situações de homens desconfortáveis por terem de seguir diretrizes de mulheres?
Não há ou são muito bons a disfarçar. Não sinto e tenho um perfil de bastante de empatia. Vou-lhe ser mais sincera: há muitas pessoas na L’Oréal a gerir pessoas mais velhas, que podia ser outra sensibilidade, e não é.
Em termos de recrutamento, além do currículo e das competências técnicas, quais são as características que procura?
Paixão e resiliência. Paixão pelo produto e pelo trabalho. Trabalhamos tantas horas que é preciso estar apaixonada. A resiliência vem da capacidade de resistir e continuar, apesar de eventuais notícias adversas. O mercado fast consumer goods [bens de grande consumo] é altamente competitivo e temos uma concorrência fantástica – às vezes ganhamos, às vezes perdemos. Portanto, precisamos de pessoas que não desmoralizem.
Como é que se percebe isso numa entrevista de recrutamento?
As experiências passadas das pessoas, mesmo pessoas jovens, são uma fonte de informação muito importante. A maneira como viajam, pessoas que perdem um avião e para as quais é a pior catástrofe do mundo, pois não são capazes de encontrar alternativas. Pessoas que… – e agora vou falar contra mim – … nunca chumbaram, que nunca tiveram um aspeto negativo, saber como a pessoa reagiu a isso é riquíssimo. Saber como é que uma pessoa reagiu e superou um despedimento é riquíssimo.
A tendência é para as empresas olharem mais para a formação académica e para o percurso profissional…
Na L’Oréal dizemos sempre que temos de ser poetas e camponeses, que é uma dicotomia apaixonante, no sentido que é esta casa que esculpe o futuro da beleza em Portugal. Temos de ser poetas, porque é este coletivo de pessoas que vai tornar as mulheres e os homens portugueses mais bonitos nos próximos anos, é essa a capacidade de ser poeta. Mas depois temos de ser camponeses, pôr a mão na massa. Já estive a noite toda a montar expositores num cliente nosso. Acho que desse exemplo sai muita coisa.
Ao longo da sua carreira, quais foram os momentos mais marcantes?
O dia em que entrei, por ter sido muito bem recebida e ter tido a sensação… Sabe quando sente que encontra o homem da sua vida ou a relação da sua vida? Achei isso e não se sabe muito bem explicar porquê. Isso foi há 14 anos, estou casada com a L’Oréal há 14 anos, a minha relação mais longa, além da relação familiar com os meus pais. [Risos] Depois, a primeira vez que me fui embora, e isso recordo com muita dor, porque me custou imenso. Andei a despedir-me durante um mês. Era das primeiras portuguesas a ser expatriada, tinha 25 anos… Aquilo tudo foi vivido pela casa, pelas pessoas, e eu achava que nunca mais iria voltar. Depois, uns anos mais à frente, a minha experiência dos quatro anos que vivi em Espanha, porque foram anos de grande dificuldade e resiliência. Estávamos a viver os piores anos da crise, de 2010 a 2014.
Viveu esses momentos sozinha ou em família?
Sempre sozinha e solteiríssima. O quarto momento que elejo é o 8 de maio de 2014, que foi o dia da nomeação aqui em Portugal. Foi um momento simbólico muito importante, porque veio cá o vice-presidente europeu e no palco estavam três gerações de portugueses, a pessoa que me recrutou, o meu antecessor e eu própria.
O que é que aprendeu sobre gestão em cada um dos países onde trabalhou?
Com os franceses, aprendi a arte da discussão, a arte do debate de ideias e a multiculturalidade e a diversidade na sua mais profunda expressão. Posso acrescentar aos franceses a sensibilidade ao métier, saber que a L’Oréal é um artesão da beleza – não podia aprender isso em mais nenhuma filial.
E com os espanhóis?
Aprendi a máxima work hard, play hard [trabalha no duro, diverte-te ao máximo] e que há uma grande diferença entre a pessoa profissional e o ‘eu’. Conseguem separar a crítica profissional da crítica pessoal, e isso é fantástico, porque não destrói a autoestima. E aprendi a ver para lá dos resultados.
Numa multinacional isso é difícil?
É, mas aprendi com o meu chefe, sem o qual não estaria aqui. Porque se ele não visse além dos resultados num momento de contração económica tão difícil, ninguém teria sobrevivido. É essa generosidade de conseguir ver o talento para além dos resultados. Sendo que há um momento em que é preciso entregar os resultados.
E com os portugueses?
Há uma palavra que em todos os idiomas não gosto de pronunciar, que é ‘impossível’, e isso aprendi com os portugueses. É inacreditável o que nós somos capazes de fazer quando toda a gente acha que não vamos ser capazes com menos recursos, com menos dimensão, temos essa capacidade.
Qual é o seu tipo de gestão ou como é que a definem?
Oscila entre a máxima exigência e a grande proximidade. Sei muito bem o que quero e o facto de ter vindo da base faz com que não tenha empatia com as dificuldades porque já fiz. Mas encaro a gestão de porta aberta, próxima da base, dos clientes, em que estabeleço relações humanas fortes, porque no final é isso que fica.
A L’Oréal Portugal é uma réplica da casa-mãe ou as filiais são muito diferentes?
São réplicas, no sentido em que estamos organizados por circuitos de distribuição: o circuito profissional, que abrange cabeleireiros, SPA e institutos de beleza, o grande consumo, as farmácias e as parafarmácias, e depois temos a alta perfumaria. Isso é idêntico em todas as filiais. Temos um departamento de recursos humanos central, que atravessa todas as filiais, e um sistema financeiro. Depois, dependendo da dimensão do país, podemos ter sistemas distintos a nível do back-office.
Em termos dos pontos de venda, onde e como é decidido o que entra e sai dos lineares?
A decisão final é local, mas a proposta é internacional, sendo que há determinados lançamentos que são grandes tendências incontornáveis que todos os países têm de lançar. Mas a forma como lançamos, a nossa política de promoção, a forma como comunicamos com o consumidor e a relação que estabelecemos com os nossos clientes e parceiros isso é completamente local.
O que se consome em Portugal é idêntico ao que se consome noutro país europeu?
Não, somos muito diferentes. Os portugueses têm uma total obsessão pelo cabelo, as portuguesas em particular. É a nossa máxima expressão de imagem e sensualidade. Temos também uma forte preocupação com os cuidados da pele. Estamos menos desenvolvidos em termos de tratamento, mas muito desenvolvidos em tudo o que é limpeza. Adoramos água.
Isso tem a ver com o quê?
Tem a ver com a nossa noção de limpeza com água. Por outro lado, somos, felizmente, cada vez mais conscientes em relação ao sol: passámos de uma taxa de penetração de 11% nos protetores solares, que é pouquíssimo, para quase 20% em quatro anos.
Onde somos ainda pouco desenvolvidos?
Em tudo o que tenha a ver com cor, em maquilhagem somos fraquíssimos e em coloração também, ao contrário de França e de Espanha. Tem a ver com questões culturais.
Houve algum produto em que Portugal tenha funcionado como teste?
Com a Mixa, em 2015, e o Narta, em 2007. O teste do Narta deu origem, dois anos mais tarde, ao lançamento europeu de desodorizantes.
Qual é a marca dentro da L’Oréal mais forte em termos de vendas?
Não podemos dar indicação de vendas em concreto, mas posso dizer-lhe que a marca L’Oréal Paris é das mais importantes, é a marca do grupo.
Isso é dentro da grande distribuição. E no luxo, no segmento profissional e nas farmácias?
No luxo é a Lancôme, nos cabeleiros é a L’Oréal Professionel e nas farmácias é a Vichy. Somos o número um por marca, e o objetivo é continuar a sê-lo.
Há algum segmento que esteja a crescer mais?
Somos líderes absolutos em tudo o que é coloração e produtos capilares e temos na maquilhagem uma posição de challenging (desafiados), onde claramente queremos apostar.
Qual é a explicação para que em épocas de crise se vendam mais produtos de cosmética?
Há duas explicações: uma racional e outra emocional noutro mercado, porque o paralelo do lipstick effect (efeito batom) é o tie effect (efeito gravata). Em momentos de depressão, a autoestima de uma mulher é exponenciada quando põe um batom, que acaba por não ser caro. Há outro efeito em Portugal muito mais improvável, que é o nail effect (efeito unhas). Somos o país europeu com a maior taxa de penetração em cuidados para as unhas, que representam 40% do mercado de maquilhagem.
O que é o ‘efeito gravata’?
O ‘efeito gravata’ verificou-se na última crise que atacou várias pessoas nas hierarquias, tanto homens como mulheres. O que aconteceu foi que depois de uma fase, nos anos 2000, em que era muito giro vir trabalhar de ténis e de calças de ganga, muitos homens voltaram à gravata para dar uma imagem de seriedade. Aqui, a justificação é muito mais racional do que emocional.
Qual é o peso do segmento masculino na faturação do grupo?
Em Portugal, só 18% dos homens é que se tratam, o que é pouquíssimo; na Alemanha são 32%, e muito honestamente os nossos homens são muito mais bonitos. [Risos) É claramente uma das áreas de crescimento e temos marcas posicionadas nesse segmento, como a Biotherm Men e a Men Expert. Na farmácia temos os produtos antiqueda [de cabelo] e outros produtos capilares.
Que cuidados tem com a beleza?
Tenho muitos produtos. Trabalhei dois anos para o mercado asiático e isso fez com que desenvolvesse uma preocupação maior. Por exemplo, não me ponho ao sol ou vou com fator 50.
E maquilhagem?
Maquilho-me pouco, só os mínimos, BB cream e uma máscara de pestanas. Mas ando sempre de unhas pintadas e não saio de casa sem perfume. E depois ponho imensos produtos de tratamento.
Só usa marcas do grupo ou, mesmo que não usasse, não me iria dizer?
Não lhe iria dizer. Gosto muito de testar a concorrência. Sou uma vítima do meu próprio negócio, gasto muito dinheiro em cosmética, não resisto, é uma tontice, mas adoro.
Porque é que decidiu vir para a L’Oréal?
Sempre tive uma grande preocupação com a estética em geral, e isso em casa sempre foi rejeitado, pelos valores familiares. Sempre houve uma maior preocupação com a parte interior, a um ponto até um pouco extremo. Pensei que indo trabalhar para a L’Oréal podia conciliar um debate interno importante.
Conseguiu fazer esse caminho em paz com a sua família?
Consegui fazê-los acreditar que torno o mundo melhor à minha maneira. Não venho todos os dias trabalhar para vender champôs, não é isso que me estimula ao fim de 14 anos. A beleza tem uma capacidade de influência na autoestima incrível. Permite a uma pessoa exprimir-se e ultrapassar limitações pessoais.
Sentiu que o caminho que fez implicou abdicar de uma vida familiar?
Não. Serviu-me a mim de desculpa muitas vezes, para justificar o facto de estar sozinha. Agora olho para trás e vejo que teve a ver com um processo que tive de fazer comigo própria, de não ter encontrado a pessoa que queria. Agora, depois de ter encontrado, olho para trás e penso ‘ainda bem’ que foi assim.
É mais difícil para uma mulher com um percurso como o seu encontrar um parceiro de vida?
Para encontrar um homem excecional, sim, mas isso é igual para qualquer pessoa. Uma relação duradoura e tão fundadora como uma relação de amor entre um casal é muito difícil. O estranho é a facilidade. O normal é que seja uma coisa que demora o seu tempo.
Há mulheres para as quais esse caminho é mais fácil e simples do que para outras?
O que dificultou foram as experiências internacionais, que proporcionaram encontros mais fugazes. Depois, nunca tive nada fácil. Não sou o Einstein, não sou particularmente inteligente, o que significa que tive de trabalhar muito. Se essa parte tivesse sido fácil, não lhe teria dado valor. Custou a encontrar, mas é o homem da minha vida.
O que é que faz quando não está a trabalhar?
Durmo, adoro dormir. Viajo.
Para onde gosta de viajar?
Para a Ásia em particular. A viagem que mais me marcou foi à Birmânia, pela espiritualidade, que tem a ver com a pessoa levantar-se às quatro e meia da manhã para ir dar comida aos monges e com a simpatia de um povo absolutamente pacifista, apesar do regime em que está. Tem a ver com a ausência de consumismo, onde não há cartões de crédito, e isso é altamente libertador. Mas era incapaz de viver lá.
A espiritualidade está muito presente no seu dia a dia. Faz meditação ou ioga?
Não. Tem a ver com precisar de me evadir três semanas por ano. Sou uma pessoa complexa e profunda, que pratica o bem e o mal.
De que formas?
Porque não sou perfeita. Sou muito amiga dos meus amigos, faço o bem ao próximo, mas também faço coisas que não são boas, também tenho os meus pecados, em boas doses.
Quais os sonhos que tem por concretizar?
Gostava de continuar a aprender e a contribuir, tendo impacto. Estou a descobrir uma causa importante que é o women empowerment, e, seja qual for o meu caminho, gostava muito de estar perto da juventude. O que quer que seja que esteja a fazer daqui a 30 anos, gostava muito que tivesse estas duas vertente, mulheres e jovens, que não têm de ser mulheres jovens.
B. I.
Fiel a si própria
Nome
Inês Caldeira
Vida
Nasceu em Lisboa há 36 anos, é solteira e não tem filhos, mas encontrou o homem da sua vida há 18 meses.
Percurso
Tira o curso de Economia na Universidade Nova de Lisboa e começa a carreira na divisão de produtos de grande consumo, primeiro com a marca Elvive Studio Line (produtos para cabelo) e depois com a Dermo Expertise (cuidados da pele). Em 2004 vai para França, para trabalhar na casa-mãe da L’Oréal, em Paris. Dois anos depois regressa a Portugal como diretora de marketing da Garnier. Em 2008 volta a França e dois anos depois ruma a Espanha, onde assume a direção de marketing da L’Oréal Paris. Deixa Espanha em 2014 para vir para Portugal liderar a filial do Grupo L’Oréal no mercado nacional.
Maior erro
Não ter errado mais vezes.
Melhor decisão
Ter sido expatriada.
Lema
“Fiel a mim mesma e aos meus valores.”
Este artigo é parte integrante da edição de fevereiro da revista EXAME