Não é um caminho fácil, sobretudo num mundo em profunda crise (económica e não só). Mas a alternativa é ficar para trás. Foi essa a mensagem principal que saiu do painel da tarde “Os desafios da transição sustentável numa economia de baixo carbono”, integrado nas ESG Talks, uma série de conferências do Novo Banco, juntamente com os media partners VISÃO e EXAME e a parceria da Nova SBE (que acolheu o evento) e da PwC Portugal.
A moderadora, Mafalda Anjos, diretora da VISÃO, lançou o tema da crise como possível obstáculo à transição para a sustentabilidade, um caminho que vinha a ser feito de forma sólida antes de a pandemia e, depois, a guerra e a inflação mudarem o foco das preocupações. “Não vai parar”, garantiu Carlos Brandão, Executive Board Member do novobanco. “Não podemos ter uma visão de curto prazo. As empresas que tiverem uma visão de curto prazo vão entrar em dificuldades, ao ficarem em desvantagem concorrencial face às que avançam mais depressa na transição. Este processo de adaptação veio para ficar. As empresas vão ter os clientes a perguntar-lhes a pegada de carbono, e as que conseguirem responder de forma mais assertiva vão estar em vantagem.”
O setor financeiro será fundamental para incentivar e acelerar esta mudança, acrescentou, sobretudo num país com um tecido empresarial em que a grande maioria das empresas são PME, que “não têm níveis de reporting”. “A banca faz parte dessa jornada. Ensina-as a fazer esse caminho. Vai ter de existir um processo de transição e nós temos um papel muitíssimo importante nesse processo. É a nossa oportunidade de melhorar as empresas”, assumiu o responsável do novobanco. Por enquanto, essa distinção entre empresas “verdes” e as outras é feita através de uma “discriminação positiva”, dando “benefícios em produtos financeiros”.
Uma inevitabilidade
Num mundo perfeito, os critérios de sustentabilidade continuariam em primeiro plano. Mas não vivemos num mundo perfeito, lembrou Rui Miguel Nabeiro, CEO do Grupo Delta. “Os empresários portugueses não estão preparados. A crise vai desfocá-los. Mesmo do ponto de vista do acesso ao crédito, vão haver limitações se o ESG [Environmental, Social, Governance] for ignorado.” O problema, diz, é que a maioria das empresas “não vive, sobrevive”. “Vive para pagar as contas do dia a dia. Não há tempo e isto não é uma prioridade, porque estão só a tentar sobreviver.” O ESG, porém, é uma inevitabilidade no mundo dos negócios. “Não é um ‘nice to have’, é um ‘must have’.”
A jusante, também os consumidores empurram as empresas na direção certa, ainda que tenham de arcar com parte dos custos da transição. “O custo da inovação tem de ser imputado aos produtos”, sublinhou Rui Miguel Nabeiro. “Por exemplo, a nossa cápsula biodegradável: é um material escasso e substancialmente mais caro do que o plástico comum. Ainda que a empresa abdique de pate da margem, é impossível fazer a transição sem que parte do custo não vá para o consumidor.” Dito isto, continuou, as empresas têm a obrigação de ir mais longe do que os consumidores pedem, nomeadamente ajudando os seus fornecedores a serem mais sustentáveis.
A tecnologia tem igualmente um papel importante a desempenhar, defendeu, por seu lado, Ana Casaca, Global Head of Innovation da GALP. “Vamos ter de desenvolver novas tecnologias para chegarmos à neutralidade carbónica. 50% das soluções para a neutralidade carbónica não existem ou estão em fase muito embrionária.” Mas é um percurso que terá de ser acompanhado por uma evolução do processo legislativo, que ajude a acelerar a transição. “A Comissão Europeia clarificou que 30% das baterias de lítio terão de ser produzidas de forma sustentável na Europa. Mas não temos na Europa minas nem unidades de conversão. Uma mina de cobre demora 15 anos a ser licenciada. Vai ser preciso acelerar todo o pacote legislativo de licenciamento. E as empresas do setor energético terão um papel não de vilão mas sim de criação de valor, para todos juntos termos um mundo mais sustentável e equitativo”, disse Ana Casaca, recordando o plano da Galp de ser neutra em carbono até 2050 e de aplicar metade dos seus investimentos em novas energias, entre 2021 e 2025.
Finalmente, José Furtado, presidente do Grupo Águas de Portugal, destacou o papel dos objetivos ESG na estratégia central das empresas. “Aprendemos a valorizar ativos inatingíveis, como a marca, o conhecimento e a reputação. Dentro do ESG estão também ativos inatingíveis. Não é uma opção. São atributos distintivos das empresas que permitem a sua valorização, limitar riscos e danos. É o que a torna sólida. A empresa tem de cuidar de um conjunto de circunstâncias. Anão pode estar for disso, independentemente dos ruídos de ocasião.”
No caso do grupo que dirige, apontou, os três parâmetros ESG estão bem identificados. “Ambiente: alterações climáticas, esgotamento dos recursos e qualidade da água. Social: equidade no acesso aos serviços de interesse geral, o espaço de realização pessoal e profissional dos trabalhadores e saúde pública. E Governance é um assunto critico porque prestamos um serviço de interesse geral. São tudo dimensões que estão presentes no nosso espaço de compromisso. O ESG enfatiza-os.”