Durante oito anos tive um relacionamento estável com uma pessoa mas, há dois anos, ele acabou comigo porque se apaixonou por uma colega de trabalho.
A fase do sofrimento incessante já passou, mas ainda não consegui voltar a dar um rumo à minha vida. Nunca mais voltei a sair com ninguém e há muito tempo que não me sinto bem, quanto mais feliz.
Não sei criar novas rotinas, não sei ir ao cinema sem ele ou viajar sem ele. Parece que a minha vida ficou parada naquele momento.
Será que há alguma maneira de eu recuperar deste marasmo e voltar a ter uma vida preenchida? Como é que posso voltar a aproximar-me de alguém?
Não é fácil lidar com o fim de um relacionamento, especialmente se envolve o sentimento de rejeição. Porém, as perdas fazem parte da vida e não dependem exclusivamente de nós. Nessa medida, encará-las como algo que “faz parte” da viagem – ou seja, que é inerente ao facto de estar vivo – é o primeiro passo para a aceitação dessa situação. A angústia e todas as emoções que acompanham o “luto” – do “sofrimento incessante” à revolta, passando por mecanismos de compensação e até à fase de recordar o que de bom houve e o que se aprendeu na vida a dois – tendem a durar, em média, alguns meses até cerca de ano e meio, dependendo da personalidade de cada um, da história de vida e dos recursos que se tem para superar estas etapas.
Quando refere que não é capaz de reorganizar as suas rotinas e tem a sensação de estar fixada no momento (na rejeição?), leva-me a questioná-la sobre três coisas.
1. Será que está a permitir-se olhar para si e aceitar-se como é (limitações e qualidades incluídas)?
2. Até que ponto depende exclusivamente de um outro para se sentir você mesma?
3. Porque se impede de (ou resiste a) fazer algo por si, vitimando-se de algum modo (implicitamente achando que ele é o mau da fita, o “culpado” da situação)?
A resposta a estas três questões é crucial agora, pois elas vão vai estar de novo em cima da mesa quando pensa em aproximar-se de alguém.
Examinar o que não está bem, neste momento, para si, sem ele, é fundamental para sair do marasmo emocional. Deverá equacionar ainda o que é para si “uma vida preenchida”. Ninguém é substituível em matéria de afetos (os bons e os menos bons) e, nessa medida, “voltar a ter” o que foi perdido (ou o que tomava por familiar, habitual ou garantido) não será o melhor ponto de partida para renascer das cinzas.
“Por uma pedra no assunto” não significa esquecer (nem é sequer desejável, porque estaria a renunciar ao que a envolveu a si na história que viveu, e que é, para todos os efeitos, um património afectivo que fica na memória). Aceitar que não foi como esperava ou desejava, sem saltar etapas (a frustração e o desapontamento, por exemplo), tem um efeito reparador. Daí para a frente, a chave para seguir com a sua vida é estar receptiva a cada momento (que a liberta do anterior), no presente. Mesmo que envolva algum esforço da sua parte, tem a vantagem de mantê-la atenta face ao que possa estar a passar-se ao seu lado, sem que disso esteja à espera.
Se as surpresas desagradáveis não são controláveis, as outras obedecem ao mesmo princípio. Assim se disponha a “olear” o que traz em si (curiosidade, desejo de novidade, iniciativa, etc), através de pequenos gestos e decisões, ao seu ritmo. Comece já hoje a ver o que “não perdeu” e aquilo que “ainda é”, com uma pitada de realismo e outra de gratidão. Mesmo que não seja uma fórmula para ser “mais feliz” (depende do que é, para si, a felicidade), ajudá-la-á a abrir-se ao mundo, mesmo que em doses homeopáticas (não precisa ser aquela viagem de sonho, antes aquela que está ao seu alcance, sempre que acorda para mais um dia).