“Quando soube que a União Europeia iria receber o prémio Nobel da Paz, confesso que tive uma dupla e ambivalente sensação: por um lado senti uma alegria por fazer parte de um espaço e de uma comunidade que, com todo o mérito, são reconhecidos como promotores da Paz mundial; mas, por outro lado, tive a péssima sensação de que o prémio era assim uma espécie de “prémio-carreira” para um actor de Hollywood caduco e de quem praticamente já ninguém se lembra.
Se simbolicamente tal prémio pode, e deve, ser encarado como um incentivo, é forçoso reconhecer que num espaço onde 24,2% (dados de 2011) dos cidadãos vivem em risco de pobreza ou de exclusão social, estamos assustadoramente longe de poder assegurar níveis de coesão social capazes de garantir a Paz.
É por isso mesmo que muito me congratulo com a iniciativa da UE de, ao procurar assinalar os vinte anos da inclusão da Cidadania Europeia no Tratado de Maastricht (1992), ter proposto que 2013 fosse o Ano Europeu dos Cidadãos.
De facto, a UE nunca precisou tanto dos seus cidadãos como hoje. Mas a formulação de um dos objetivos da Comissão Europeia para este Ano Europeu é reveladora de um equívoco perturbador. Pretende-se que cada cidadão europeu conheça melhor os seus direitos para, com esse conhecimento, exercê-los eficazmente e ter uma voz ativa na definição das prioridades europeias e das próprias políticas. Apesar de reconhecer este objectivo como relevante, penso que ele incorre num erro de formulação. Parte-se do pressuposto de que os cidadãos são mal informados. E se, em parte, isto pode estar certo, não é menos verdade que a UE também está muito mal informada sobre o que os cidadãos pensam.
Os cidadãos querem mais do que conhecer os seus direitos. Os cidadãos europeus querem participar nas decisões que formulam e regulamentam esses direitos. As formas de participação e de governação actuais estão hoje muito distantes de um passado onde se entendia que governar bem implicava um esforço colectivo e de ampla concertação social. O que falta são precisamente os meios e mecanismos de participação democrática. O que falta são espaços onde os cidadãos possam ser ouvidos.
Assim, a minha maior expectativa em relação a este Ano Europeu dos Cidadãos é que, justamente, se envidem todos os esforços para que as instâncias europeias e os governos nacionais ponham em marcha novos mecanismos de participação cidadã capazes de acolher todas as diferenças e, com essa riqueza, produzir alargados consensos. Querem um exemplo? Através de um amplo processo participativo, dotar a UE de uma estratégia europeia (e de estratégias nacionais) de combate à pobreza. Imaginam melhor forma de convocar os cidadãos e fazê-los entender que a UE é um espaço que se preocupa com o seu bem-estar? Duvido.
Que este Ano Europeu sirva para que a UE entenda que sem os seus cidadãos não existe. E que os cidadãos gritem bem alto: a União Europeia somos nós!”