Com o formato aliciante de perguntas e respostas, estou em crer que este livro contribuirá para consciencializar pais e educadores no sentido da inadmissibilidade da violência, e, se for devidamente divulgada, revelar-se-á muito útil. Aí se defende como é prejudicial para a criança o castigo corporal, que humilha em vez de disciplinar, que passa para a criança a mensagem indesejável de que a violência é um método tolerável, que cria perigos físicos e psicológicos e conduz à aceitação da violência interpessoal, que continua a ser, de acordo com a apreciação a Organização Mundial de Saúde, desde a década de 80, o mais grave problema de saúde pública que enfrenta a humanidade.
Na verdade, quando no passado dia 18 de Outubro, na sessão que teve lugar no Centro de Estudos Judiciários para assinalar o Dia Europeu contra o Tráfico de Seres Humanos, ouvi dizer que nas últimas três décadas tinham sido traficadas mais mulheres e crianças do que nos trezentos anos de escravatura, pensei como ainda era tão necessária a luta pela dignidade da pessoa humana e como nos deveríamos todos sentir convocados para tomar parte nela.
Quase simultaneamente, foi publicado um estudo pela American Political Science Review, disponível no Cambridge Journals Online, de Mala Htun e S. Laurel Weldon “The Civic Origins of Progressive Policy Change: Combating Violence against Women in Global Perspective”, que teve o condão de espalhar a esperança. Trata-se de um estudo muito credível, não apenas porque aquela é uma das revistas de Ciência Política mais conceituadas em todo o Mundo, mas sobretudo devido ao facto de ter observado dados de setenta Países durante quatro décadas.
As investigadoras, que demoraram cinco anos a tratar cientificamente os dados e as estatísticas fornecidas, concluíram que as campanhas de sensibilização levadas a cabo pelos movimentos de defesa dos direitos das mulheres e outras organizações da sociedade civil foram determinantes nas múltiplas mudanças operadas, e com mais impacto e maior extensão do que conseguiram, por exemplo, as deliberações sobre paridade nos partidos políticos, a riqueza dos Países ou até mesmo a inclusão de mulheres na composição dos Governos.
Confesso que, pese embora o facto de ter empiricamente essa perceção, foi bastante reconfortante saber que a nível científico se reconhece agora a influência tão positiva das campanhas de sensibilização na mudança de comportamentos.
O Instituto de Apoio à Criança tem procurado ter um papel importante nesse movimento de consciencialização combatendo a violência contra a criança, sob as suas mais diversas formas, desde os maus tratos à violência sexual, desde a negligência ao trabalho infantil, através de ações de sensibilização, promovendo a reflexão sobre temas atuais da maior relevância, e criando para o efeito serviços inovadores como as linhas de atendimento telefónico “SOS Criança” ou o “Projeto das Crianças de Rua”.
Outra das apostas do IAC tem sido a de estabelecer parcerias, com vista à partilha de experiências e de metodologias de intervenção. Promoveu há mais de vinte anos a criação da Rede “Construir Juntos”, que atualmente integra mais de uma centena de instituições de Norte a Sul do País e que é um exemplo de boas práticas e que todos os anos reúne para avaliação do trabalho desenvolvido.
Há dois anos, foi lançada a Rede de Jovens “Crescer Juntos”, permanente desafio do exercício do Direito à Participação, que a ONU entende ser o Direito reconhecido na Convenção sobre os Direitos da Criança que tem sido mais difícil de executar.
Estou convicta que este é o caminho para a mudança necessária. E lembro, mais uma vez, a história do colibri que perante um fogo gigantesco na floresta, não parava de levar água no seu minúsculo bico. O elefante disse-lhe da sua surpresa: “Achas mesmo que vale a pena o esforço?” E o colibri respondeu-lhe muito firme: “Eu só estou a fazer a minha parte”. É este espírito que, creio, deve guiar-nos nesta aventura que é a vida para que, como dizia Jorge de Sena no seu magnífico poema
Carta a meus filhos sobre os fuzilamentos de Góia consigamos “manter-nos fiéis à honra de estarmos vivos”.