Pode comparecer em tribunal, mas as suas declarações podem estar “comprometidas” devido à doença de Alzheimer. Esta é, em síntese, a conclusão de três peritos do Instituto de Medicina Legal e Ciências Forenses que analisaram o estado clínico de Ricardo Salgado, antigo presidente do Banco Espírito Santo, arguido em vários processos-crime relacionados com o banco.
De acordo com o relatório dos peritos Fernando Vieira, Camila Nóbrega e Henrique Barreto, a que a VISÃO teve acesso, “confirma-se sofrer o examinado de patologia neurológica/neuropsiquiátrica, mais propriamente Doença de Alzheimer muito provável, estando não só presente a necessária semiologia clínica, como sendo o diagnóstico igualmente suportado por exames complementares de diagnóstico estruturais (imagiológicos), funcionais (neuropsicológicos) e fisiopatológicos (biomarcadores).”
Respondendo à primeira questão – se o arguido estava impossibilitado de comparecer em tribunal -, os peritos do IMLCF começaram por esclarecer não existir “real ou absoluta impossibilidade de comparecer”. Porém, acrescentaram, “não se nos suscitam, porém, dúvidas médicas razoáveis, quanto a estar em grau clinicamente moderado, e assim relevante médico-legalmente, comprometidas as suas declarações, fruto da sua patologia e da situação que em si sempre será stressante para qualquer cidadão em abstrato, incluindo naturalmente examinando em concreto”.
Relativamente à capacidade de Ricardo Salgado em prestar declarações nos vários processos em que é arguido, os peritos referem que “pode ser afirmado estar comprometida mas não impossibilitada a prestação de depoimento sobre matéria dos temas de prova, sendo que atenta diminuição das funções cognitivas apuradas e descritas, é expectável dificuldade acrescida seja na prestação seja na devida valoração pelo Tribunal, já que faculdades como a memória, a atenção, a velocidade de processamento e mesmo a linguagem e discurso estão diminuídas”.
“Dito de outro modo, ainda que seja possível ser ouvido sobre os designados temas da prova, do ponto de vista estritamente científico não se pode garantir que pormenores de natureza espacial, temporal e de conteúdo sejam relatados de forma rigorosa, já que poderá efetivamente recordar, ou não recordar”, sublinharam Fernando Vieira, Camila Nóbrega e Henrique Barreto, colocando nas mãos dos tribunais a decisão de o convocar para prestar declarações, sendo que, perante o quadro clínico, também avaliar se as mesas terão efeitos úteis.
Atualmente, Ricardo Salgado, 79 anos,é arguido em vários processos: na Operação Marquês – cujo recurso do Ministério Público contra o arquivamento do processo está pendente no Tribunal da Relação de Lisboa -, no processo principal do Banco Espírito Santo, já na fase de julgamento, e no caso do BES/Angola, que entrou na fase de instrução, além de outros processos relacionados com contra-ordenações da Comissão de Mercados e Valores Mobiliários e do Banco de Portugal.