Já estava provado que reproduzir “pistas sonoras” durante o sono estimula memórias específicas. Agora, um novo estudo realizado por um grupo de investigadores da Universidade de York, Universidade de Sussex e da Universidade College London, todas no Reino Unido, veio revelar que essa mesma técnica pode também ser utilizada para ajudar as pessoas a esquecerem.
“A relação entre o sono e a memória é fascinante. Sabemos que o sono é crítico para o processamento da memória, e as nossas memórias são tipicamente melhores após um período de sono. Os mecanismos exatos em jogo permanecem pouco claros, mas durante o sono parece que as ligações importantes são reforçadas e as que não são importantes são descartadas”, disse o autor sénior do estudo, Aidan Horner, do departamento de Psicologia da Universidade de York, citado num comunicado divulgado por esta instituição.
“O estudo levanta a possibilidade de esse processo poder ser manipulado para que o sono possa ser utilizado para ajudar a enfraquecer memórias dolorosas”, frisou o mesmo investigador. “O próximo passo para a nossa equipa será estabelecer como estas pistas causam esquecimento, para que possamos ligar e desligar o efeito.”
Para esta investigação, cujos resultados foram publicados no jornal Learning & Memory, Aidan Horner e os seus colegas recrutaram 29 voluntários a quem começaram por mostrar pares de palavras num monitor de computador, sendo que uma delas era um objeto, como bicicleta, e a outra um local, como escritório. O processo foi repetido para 60 palavras-objeto diferentes, e foram mostrados os dois possíveis pares, resultando em 120 associações, detalha-se no The Guardian.
À medida que os pares apareciam no monitor, os participantes ouviam a palavra-objeto a ser dita em voz alta. E os investigadores pediram-lhes que selecionassem um par, a partir de uma lista de várias opções.
Os 29 voluntários passaram, então, uma noite no laboratório do sono da universidade. E, depois de eles terem entrado num estado de sono profundo, monitorizado com a ajuda de elétrodos, foram reproduzidos sons de trinta das palavras-objeto.
No dia seguinte, a equipa testou a capacidade de associação de palavras dos participantes e verificou que tinham mais facilidade em recordar a primeira palavra que haviam aprendido a emparelhar com uma palavra-objeto se o som desta última tivesse sido tocado enquanto dormiam. No entanto, a sua capacidade de recordar a segunda palavra que tinham aprendido a associar com o mesmo objeto diminuíra em relação ao cenário sem som.
O resultado sugere que é possível provocar o esquecimento seletivo, ao reproduzir sons associados durante o sono. Uma descoberta importante para quem gostava de esquecer acontecimentos dolorosos ou traumáticos
“As pessoas que passaram por traumas podem sofrer uma vasta gama de sintomas angustiantes devido às suas memórias desses acontecimentos”, lembrou o primeiro autor do estudo, Bardur Hofgaard Joensen, citado no mesmo comunicado.
“Embora ainda numa fase altamente experimental, os resultados do nosso estudo levantam a possibilidade de aumentarmos e diminuirmos a capacidade de recordar memórias específicas, tocando pistas sonoras quando um indivíduo está a dormir. Embora ainda estejamos longe da meta, a nossa descoberta abre caminho para novas técnicas que enfraqueçam essas memórias e sejam usadas juntamente com as terapias existentes”, disse o antigo aluno de doutoramento no Departamento de Psicologia daquela instituição.
“O que estamos a fazer aqui é essencialmente criar uma situação em que existem duas memórias concorrentes, e essa interferência está a levar ao esquecimento de uma dessas memórias”, explicou Aidan Horner ao The Guardian. “Mas ainda há muitos passos que precisamos de dar para ver se podemos realmente induzir este esquecimento nas memórias do mundo real.”