O Governo autorizou, numa portaria já publicada em Diário da República, a realização de voos no aeroporto de Lisboa entre a meia-noite e as 2h da manhã e entre as 5h e as 6h, a partir desta terça-feira, 18, e até 28 de novembro. O objetivo é a implementação, durante este período transitório, de um novo sistema de gestão de tráfego aéreo, alterando o antigo, com mais de 20 anos, para aumentar a fluidez do tráfego, otimizar as rotas e aumentar a segurança, afirma a NAV (Navegação Aérea), responsável pela gestão do controlo de tráfego aéreo. Contudo, não existe nenhum planeamento de voos adicionais para esses horários, afirma a entidade.
Em declarações à RTP, Alexandra Reis, presidente executiva da NAV, garante que, durante este tempo de seis semanas, vai haver uma redução significativa dos voos todos os dias. “Na última semana de novembro, já teremos menos 5% dos voos durante toda a semana”, afirma.
Isto significa que os movimentos aéreos terão limites máximos semanais, ou seja, na primeira semana, entre 18 a 23 de outubro, não podem exceder 168, na segunda semana 86, na terceira 75, na quarta 45, na quinta 30 e na última semana, entre 21 e 28 de novembro, 20 voos.
“Esta portaria vai apoiar-nos a recuperar alguns atrasos durante o dia, ou seja, se houver dois voos ao fim do dia, à meia-noite, que não conseguem sair porque houve algum atraso durante o dia, esses voos podem ser recuperados no período logo após a meia-noite”, explicou ainda Alexandra Reis, numa entrevista à SIC.
“De acordo com a NAV, a implementação deste novo sistema de navegação aérea irá melhorar a segurança das operações e tornar as rotas mais eficientes, mas havia maneira de evitar estes voos adicionais se as companhias aéreas reduzissem as aterragens e descolagens programadas para este período e se fossem eliminados os voos de jatos privados, que é algo consensual e que o governo concorda que devem ser retirados da Portela”, diz à VISÃO, por seu lado, Acácio Pires, da associação ambientalista Zero.
No início de agosto, o Governo tinha anunciado a intenção de aprovar uma portaria que permitiria anular temporariamente a parte da lei que estabelece restrições ao tráfego aéreo noturno entre a meia-noite e as 6h da manhã, durante um período transitório, para implementar o novo sistema de controlo. A proposta deste regime especial não foi bem recebida pelas associações ambientalistas, que relembraram que os níveis de ruído no aeroporto de Lisboa ultrapassam os limites legais. Além disso, afirmavam que o atual regime de restrições noturnas também não era cumprido, já que aviões levantavam e aterrarem entre a meia-noite e as 6h da manhã.
No início deste mês, a Zero voltou a opor-se “frontalmente”, em comunicado, “a voos noturnos sem limites no aeroporto de Lisboa durante mais de um mês”, considerando “ilegítimo que, em nome da atualização de um sistema de controlo de tráfego aéreo os cidadãos de Lisboa e Loures sejam chamados a ser sacrificados com níveis de ruído noturno intoleráveis”.
E em relação às possíveis consequências desta decisão para a saúde, a associação também não tem dúvidas. “Os impactos acrescem aos que já são sentidos diariamente pelos cidadãos de Lisboa e Loures com o incumprimento do regime de exceção, que prevê que possam existir 91 voos por semana”, afirma Acácio Pires.
“O ruído excessivo, de acordo com a OMS, produz um aumento de doenças cardiovasculares, depressões, perturbações do sono ou dificuldades de aprendizagem nas crianças. E este período, em que existe a possibilidade de ocorrerem mais voos noturnos do que o habitual nesta época do ano, agrava todo este cenário que afeta mais 150 mil pessoas em Lisboa e Loures”, garante, acrescentando que “os níveis de ruído com origem no tráfego aéreo ultrapassam sistematicamente os limites legais de 65 dBA entre as 7 horas e as 23 horas e de 55 dBA entre as 23 horas e as 7 horas”.
“Este tema do ruído é claramente um desafio, tendo em conta a localização do aeroporto”, explica, por seu lado, Alexandra Reis. “Entendemos os argumentos, mas as aeronaves são o que são e o aeroporto está onde está”.
“A ZERO, a Quercus e o GEOTA consideram que este agravamento adicional dos voos noturnos deve ser compensado com a instituição, entre a meia-noite e as 6h da manhã, de um período sem qualquer espécie de voo programado, a retirada dos jatos privados da Portela e a realização de obras de isolamento dos edifícios sensíveis, como está previsto no plano de ação em vigor, que minimizem os impactos do ruído enquanto não se encerra definitivamente a Portela”, acrescenta ainda Acácio Pires.
O PAN já anunciou que pretende revogar a portaria do Governo que permite mais voos noturnos no aeroporto de Lisboa, temendo que esta medida excecional se torne definitiva. Inês de Sousa Real referiu, em declarações aos jornalistas na Assembleia da República, que vai entregar um projeto de lei que visa a “revogação desta portaria do Governo que vem permitir mais uma vez a exceção da exceção relativamente aos voos noturnos”.
“É incompreensível que o Governo venha agora invocar um caráter excecional assim como venha também dizer que é imperioso que exista esta permissão entre a meia-noite e as 2h da manhã e as 5h e as 6h da manhã, quando não estamos a falar de voos urgentes”, declarou a porta-voz do partido. “Diz-nos a experiência, infelizmente, que por vezes o caráter excecional tem tendência a tornar-se definitivo. Não seria a primeira vez que tal acontecia, basta olharmos para a letra da lei e para o que devia ser o caráter excecional dos voos noturnos e como, reiteradamente, continuamos a permitir a aterragem de voos para lá da meia-noite”, acrescentou ainda.