No meio da crise do novo coronavírus e sem mãos a medir face ao crescente número de novos casos infetados, Daniel Macchini, médico italiano no hospital Humanitas Gavazzenio, em Bergamo, fez nas redes sociais um relato desesperado da situação em Itália – o segundo país do mundo mais afetado por este novo surto, a seguir à China.
“A guerra, em bom rigor, já rebentou e as batalhas são ininterruptas, dia e noite.” É desta forma que o médico resume a situação dramática que se tem vivido nestes últimos dias, com um número crescente de casos infetados (mais de 15 mil, nesta altura) que enchem a “um ritmo impressionante” as enfermarias e ameaçam colapsar as urgências dos hospitais do norte da região.
A somar-se a isto está a falta de terapias farmacológicas específicas para erradicar o novo coronavírus, que dificultam ainda mais as manobras de combate do novo surto pelas autoridades de saúde. A evolução de cada caso está assim totalmente dependente da reação do organismo dos pacientes infetados, e as terapias antivirais que neste momento estão a ser administradas são experimentais e direcionadas aos sintomas manifestados pelos doentes. “Espera-se sobretudo que o nosso organismo debele o vírus sozinho, há que dizê-lo”, desabafou Daniel Macchini, num post publicado a 7 de março e que já conta com mais 39 mil partilhas.
“Um após outro, os pobres infelizes chegam à sala de emergência. Têm tudo menos as complicações de uma gripe. Vamos parar de dizer que é uma gripe má”, apelou o médico italiano, garantindo que os diagnósticos de pneumonia bilateral não atingem apenas os idosos, apesar de este ser o principal grupo de risco, tal como os pacientes com doenças respiratória: “O Covid-19 causa sintomas semelhantes a uma gripe banal em muitas pessoas jovens, mas em muitos idosos (e não só) dá azo a uma autêntica e propriamente dita SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave), porque atinge diretamente os alvéolos pulmonares e infeta-os, tornando-os incapazes de desempenharem a sua função.”
Nos hospitais do norte de Itália, as cirurgias não urgentes já foram adiadas, e há relatos de muitos casos graves que estão a ser assistidos em corredores, onde estão também a ser instalados os serviços de cuidados intensivos. “Já não existem cirurgiões, urologistas, ortopedistas: somos apenas médicos que passam a fazer parte de uma única equipa, a fim de defrontar este tsunami que nos assolou”, relata o médico italiano.
Na publicação, pode ainda ler-se que nesta altura os médicos estão a fazer o trabalho dos enfermeiros, como mudar os paciente das camas e administrar os medicamentos. Ao mesmo tempo, as equipas médicas começam a apresentar os primeiros sintomas de exaustão e desalento face à impossibilidade de responder prontamente a todos os casos: “Temos de escolher quem tratar”, testemunhou Daniel Macchini.
Muitos médicos e enfermeiros que lidam com os doentes infetados estão a fazer turnos sucessivos para dar resposta ao número de casos que não param de crescer no país, ao mesmo tempo que evitam contactar com os familiares para reduzir o risco de contágio. Macchini deixa um apelo à população para que cumpram as medidas impostas pelo governo e evitem o contacto social.