Já entrou em vigor o decreto-lei 20/2019, e os veterinários municipais não estão contentes. A partir deste momento, qualquer município pode decidir suportar o salário destes profissionais por inteiro (até agora, 40% da remuneração vinha da Direção-Geral da Alimentação e Veterinária, DGAV), tornando-os funcionários por inteiro da câmara. Os veterinários alegam que, ao ficarem subordinados em pleno aos municípios, em vez de reportarem à DGAV, perdem a independência.
“Quando for necessário tomar uma decisão negativa para um agente económico, entram as pressões”, critica Ricardo Lobo, membro da direção da ANVETEM (Associação Nacional de Médicos Veterinários dos Municípios). “Imagine-se uma empresa que empregue 200 pessoas, muitas delas conhecidas do presidente da Câmara. Claro que o poder político local estará muito condicionado e poderá tentar influenciar as nossas decisões técnicas.”
A situação pode ser ainda pior no que diz respeito aos serviços na regência da própria câmara, explica o dirigente associativo. “No limite, podemos estar a fazer a inspeção sanitária do matadouro municipal estando na dependência direta do responsável do matadouro.” Ricardo Lobo recorda o que aconteceu na Polónia, com vacas doentes a serem abatidas e a carne imprópria para consumo a entrar no circuito comercial europeu, para ilustrar os perigos inerentes a esta decisão. “Esta é uma situação grave e vai contra tudo o que a União Europeia recomenda que deve ser a estruturação deste setor.”
Álvaro Mendonça, ex-diretor-geral de Alimentação e Veterinária, dá também o exemplo dos matadouros municipais para argumentar contra a nova legislação. “Se a câmara municipal é dona do matadouro e o inspetor é funcionário da câmara, claro que há um conflito de interesses. A independência dos veterinários está em causa e sem dúvida que a segurança alimentar fica em risco.”
De acordo com o decreto-lei, aprovado em Conselho de Ministros em setembro, as câmaras podem decidir se querem ou não assumir os ordenados dos veterinários. De qualquer forma, ainda segundo a lei-quadro da descentralização (lei nº 50/2018), em 2021 todos os veterinários municipais passarão para alçada dos municípios, independentemente da vontade das câmaras.