Daniela Martins, mãe das gémeas luso-brasileiras tratadas com o medicamento Zolgensma (para a atrofia muscular espinhal) no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, foi ouvida esta sexta-feira na Comissão Parlamentar de Inquérito ao caso do tratamento hospitalar das crianças.
Daniela Martins recusou qualquer relação com o Presidente da República ou com o seu filho, dizendo que se gabou do assunto numa conversa informal e que “errou” e “mentiu”.
“Nunca conheci e nem me dirigi pessoalmente ao Sr. Dr. Presidente da República, ou seu filho, Sr. Dr. Nuno Rebelo de Sousa. Numa conversa, supostamente informal, vangloriei-me. Sobre isso, só posso pedir imensa desculpa, fui parva, errei, porque disse algo que não era verdade por vaidade naquele momento, mas o contexto daquela gravação é importante”, defendeu-se, esclarecendo que só conheceu a mulher de Nuno Rebelo de Sousa “anos depois”, num jantar de Natal.
A mãe das gémeas diz que foi apanhada numa “armadilha”: foi contactada através do Instagram pela TVI, “interessada em, alegadamente, fazer uma matéria sobre a evolução da medicação”. “Depois”, continua, “percebi que havia caído numa armadilha, onde fui gravada com uma câmara escondida em minha própria casa por uma pessoa que se apresentou como técnico de equipamentos”, disse.
Daniela diz que teve “consulta com os Lusíadas [Hospital] confirmada” e, na “semana seguinte”, “consulta com a mesma médica no [Hospital de] Santa Maria”. Nessa altura, acrescenta, “eu não sabia que podia ter apenas vindo a Portugal sem nenhuma marcação de consulta, às urgências, e as meninas teriam acesso ao Serviço Nacional de Saúde”, disse.
Em resposta ao deputado do PSD, António Rodrigues, Daniela Martins disse houve uma “conspiração”. “Houve manipulação” da história real. “A minha vontade de viver em Portugal e ter uma empresa, em 2016, sempre foi o meu plano, desde que me casei, antes de as minhas filhas nascerem. Mas a doença delas fez antecipar estes planos por causa da medicação. Não tinha casa comprada ou arrendada. Vim com a esperança de elas conseguirem ter acesso a este medicamento por serem portuguesas.”
Quando o deputado do PS João Paulo Correia lhe perguntou “quem são os amigos em comum” que pode ter com Nuno Rebelo de Sousa, tal como este escreveu no email enviado a Marcelo Rebelo de Sousa, respondeu: “Não sei”.
Daniela acrescentou que não sabe “como chegou a informação da histórias das meninas a Nuno Rebelo de Sousa. Não enviei emails diretamente para ele nem para a mulher. Tinha emails padrão que disparava para todo o sítio”.
Logo depois, o mesmo deputado do PS insistiu se Daniela Martins enviou ou não um email para a esposa de Nuno Rebelo de Sousa. Daniela Martins confirmou que “não”, mas o deputado mostrou na CPI o email enviado para a nora do Presidente da República. A mãe das meninas disse que iria “checar” depois a sua conta de email, tendo confirmado que aquele era o seu endereço.
Questionada por André Ventura, a mãe das gémeas negou ter enviado um email à mulher de Nuno Rebelo de Sousa, Juliana Drummond: “Não tenho conhecimento desse email.”
Quando Ventura pediu que o email fosse mostrado a Daniela Martins, uma funcionária levou o computador portátil até à mãe das crianças e a mesma reconheceu que aquele email, que tinha como destinatário final o secretário de estado da Saúde, António Lacerda Sales, tinha saído da sua caixa de correio eletrónico. No entanto, Daniela Martins afirmou: “Eu vi que saiu da minha caixa pessoal de email. Como eu disse antes… Foram feitos grupos de WhatsApp, pessoas que me ajudavam a disparar os emails”. E acrescentou: “Vou checar depois a saída da minha caixa pessoal. Não posso garantir que fui eu mesma que escrevi. Diversas pessoas tinha acesso à minha caixa de email”.
Na declaração inicial, nervosa e em lágrimas, a mãe das gémeas referiu que o processo de nacionalização das gémeas começou a 16 de Abril de 2019, quando estas tinham cinco meses de idade e quando “não havia ainda suspeita de nenhuma doença”. As crianças receberam a cidadania portuguesa a 2 e 3 de setembro de 2019 e Daniela Martins, neta de “quatro avós portugueses”, recebeu a cidadania “há mais de 15 anos”. O diagnóstico de atrofia muscular espinal das gémeas foi a 9 de Setembro de 2019, o que leva Daniela Martins a argumentar a obtenção de cidadania das crianças em 14 dias “foi notícia falsa”.
A mãe das crianças diz que, em 2019, acreditava que tinha tido ajuda ou cunha do Presidente da República porque era o que se “ouvia” no Hospital Santa Maria.
No início dos trabalhos da sessão de inquérito foi aprovada a ida de António Costa à CPI para responder aos deputados. A iniciativa do Chega foi aprovada com os votos a favor de todos os partidos da direita. PS, PAN e Livre a votarem contra e o Bloco de Esquerda e o PCP abstiveram-se. Refira-se que António Costa pode escolher responder por escrito.