Ao contrário do que aconteceu nos frente a frente para as legislativas, os debates entre candidatos ao Parlamento Europeu têm ajudado os telespectadores a perceberem as posições dos vários partidos sobre alguns dos principais temas europeus. Aconteceu na estreia, e também na noite desta quarta-feira, num debate, na RTP 1, que juntou António Tânger Corrêa (cabeça de lista do Chega), Catarina Martins (Bloco de Esquerda), Francisco Paupério (Livre) e Pedro Fidalgo Marques (PAN).
Os temas da imigração, da guerra na Ucrânia ou a emergência climática serviram de guião para uma conversa conduzida pelo jornalista Carlos Daniel.
Migrações: todos contra Tânger Côrrea
A imigração está na ordem do dia, e abriu o debate. As posições de André Ventura na sequência do ataque racista contra imigrantes no Porto, colocavam o candidato António Tânger Corrêa em posição delicada. Ao habitual discurso anti-imigração do Chega, o candidato contrapôs, admitindo que “Portugal precisa de imigrantes”. Ainda assim, não abdicou de vincar uma das principais bandeiras do partido radical populista, apontando o dedo para as “políticas de portas escancaradas” e para uma imigração “descontrolada em Portugal”. “Os imigrantes são pessoas como nós, mas temos de encontrar um equilíbrio com os portugueses, porque há muitos que também vivem em situação social e económica frágil”, sublinha.
Naquele que foi o primeiro (e, talvez, único) momento de maior tensão, Catarina Martins acusou o adversário de protagonizar um discurso “racista” e “xenófobo”, que divide as pessoas “entre nacionalidades boas e más”, mas que também “ataca as mulheres”. A candidata do Bloco de Esquerda considera que “o principal problema para a segurança da Europa é a extrema-direita, e não os imigrantes”. A ex-coordenadora do BE acredita que “a regularização e integração dos imigrantes” é a solução para os problemas nesta área.
Francisco Paupério prontificou-se a desmentir António Tânger Côrrea, afirmando que “não existe nenhuma política de portas escancaradas [em Portugal]”. “Sempre houve e há regras para todas as pessoas que chegam ao País”, defende. Como no primeiro debate em que participou, o cabeça de lista do Livre insistiu na ideia de “corredores humanitários” para situações de emergência, voltando a lançar o soundbite anterior, que prevê “200 milhões de refugiados climáticos”, na Europa, até 2050.
Com o mau funcionamento da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) sempre presente, Pedro Fidalgo Marques destacou que quem decide imigrar para Portugal “partilha dos nossos valores” europeus, mas lamentou que, neste momento, exista o que considera ser “um problema” que impede a “regularização” e “integração” das comunidades estrangeiras. A culpa, diz, “é das autoridades portuguesas”.
Ucrânia: no caminho pela paz
Todos os presentes priorizaram a paz à guerra. Tânger Côrrea, no entanto, foi o único a defender o aumento da despesa no setor da Defesa, considerando que “sem defesa, não há segurança”. O candidato do Chega deu ainda o curioso exemplo das “vantagens” que os Estados Unidos da América possuem, por serem um país com uma população armada. Foi isso, garantiu, que “impediu que o Japão concretizasse o plano de invasão dos Estados Unidos da América, durante a Segunda Guerra Mundial”. “Pelo menos, é o que se diz nos meios diplomáticos”, assegura.
Catarina Martins, Francisco Paupério e Pedro Fidalgo Marques não querem armas para a mão, e apelam simplesmente à paz. “Rapidamente”, esperam. O segredo está em sentar os beligerantes na mesa das negociações.
Para vincar esta posição, o candidato do Livre recusa o envio de militares para os campos de batalha na Ucrânia. “Devemos ir atrás da paz e não da escalada do conflito”, refere. Pedro Fidalgo Marques reforça a necessidade “de existir diálogo”. Catarina Martins pediu mais à UE, que considera estar a demonstrar “um certo eurocinismo” desde que começou a guerra. “É a UE que tem condições de assegurar o diálogo e a paz”, diz.
Embora existam discordâncias de pormenor, todos concordam que, neste momento, se deve “apoiar a Ucrânia”. “Apoiar a Ucrânia é apoiar os Direitos Humanos e a liberdade”, afirmou Paupério. O apoio do PAN à Ucrânia “é inequívoco”, realçou Pedro Fidalgo Marques. “A Ucrânia tem o direito a se defender”, reforçou Catarina Martins. “Agora, temos de apoiar a Ucrânia, para que esta se possa sentar à mesa com os russos numa posição menos frágil”, declarou Tânger Côrrea.
Alargamento da UE: uma boa notícia
A entrada de países do Leste na UE foi tema que dominou parte do debate; também neste caso, são unânimes as opiniões sobre as “vantagens” perante esta possibilidade. A Ucrânia também espreita por uma oportunidade, mas, mesmo em contexto de guerra, Francisco Paupério considera que não se devem abrir exceções. “Todos os candidatos devem cumprir as regras para a adesão. A entrada da Ucrânia pode, até, contribuir para a independência alimentar da União Europeia”, destaca, “mas há regras a cumprir”. O homem do Livre aponta para “os critérios de Copenhaga”, e defende que o calendário de entrada de cada novo Estado deve seguir “os progressos verificados”. “Os países não podem entrar na UE por questões geopolíticas”.
Pedro Fidalgo Marques alinha pelo mesmo diapasão, considerando que “o alargamento da UE nunca pode ser visto como um problema”. “A UE termina quando se fechar sobre si própria”, refere.
Muitas vezes crítica em relação à UE e suas instituições , Catarina Martins explica essas posições com o facto de “levar muito a sério o projeto europeu”. Segundo a candidata do BE, “é preciso mudar alguns tratados”, “resolver problemas urgentes”, mas, segundo a própria, as portas da UE devem permanecer abertas.
Emergência climática: Livre versus PAN
O debate fechou com o tema da transição climática. Os ambientalistas Livre e PAN tinham palco para se posicionarem num tema que lhes é caro, e acabaram por consegui-lo. O que separa, então, Francisco Paupério e Pedro Fidalgo Marque neste particular?
O cabeça de lista do Livre separa a “justiça ambiental [do Livre] da política ambiental [do PAN], considerando que a posição do seu partido coloca as pessoas no topo das preocupações. O candidato do PAN rejeita a definição, acusando o Livre de falhar na sua missão ambientalista, depois de ter acompanhado a decisão do governo da AD de construir o novo aeroporto de Lisboa em Alcochete. “Isso vai provocar um ecocídio”, afirma Pedro Fidalgo Marques. Paupério remeteu para os estudos técnicos que “indicam que a opção Montijo resultaria em muitos mais impactos negativos nos ecossistemas”.
As palavras de Paupério provocaram uma reação inesperada de Catarina Martins, que afirmou “gostar de ouvir” a forma como este defende os Direitos Humanos, lançando o desafio ao Livre a estar “verdadeiramente na esquerda”, e não no grupo europeu dos Verdes, que, acusa, defende a entrega de armas ao primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu.
Curiosos sobre a opinião de António Tânger Côrrea sobre o tema – candidato de um partido que tem várias vozes que negam as alterações climáticas –, o cabeça de lista do Chega admitiu que “existe emergência climática”, mas recordou que o seu partido “é o mais votado no mundo rural, e que não há ninguém que trate tão bem o ambiente do que o mundo rural”. Por associações, considera que o Chega é um partido que cuida do (bom) ambiente.