Em mais uma iniciativa que sabe estar derrotada à partida, mas que acredita poder dar-lhe dividendos políticos, André Ventura anunciou que vai mesmo avançar com um processo contra o Presidente da República por “traição à pátria”.
O líder do Chega já fizera essa ameaça assim que se tornaram públicas as declarações de Marcelo Rebelo de Sousa durante um jantar com jornalistas estrangeiros, em vésperas dos 50 anos do 25 de Abril, em que este levantava a hipótese de Portugal avançar com reparações às ex-colónias.
“O Presidente da República deixou de representar o interesse nacional e passou a representar o interesse de outros Estados”, diz Ventura. “A gravidade aumenta quando dois países já pediram a sua reparação a Portugal. Isto vai deixar marcas nas próximas gerações.” As declarações de Marcelo, continuou o deputado, em conferência de imprensa, são “uma traição a Portugal, à nossa memória e à nossa História” e “um atentado ao País e à Constituição”.
Após a primeira ameaça, vários juristas garantiram que um eventual processo nestes moldes não tem qualquer consistência legal. Incorre em crime de “traição à pátria”, conforme estipulado no artigo 308º do Código Penal, “quem “por meio de violência, ameaça de violência, usurpação ou abuso de funções de soberania: a) Tentar separar da Mãe-Pátria, ou entregar a país estrangeiro ou submeter à soberania estrangeira, todo o território português ou parte dele; ou b) Ofender ou puser em perigo a independência do País”. A punição é uma pena de prisão de 10 a 20 anos.
Caberá a Pedro Pinto, líder parlamentar do Chega, comunicar a Aguiar-Branco, Presidente da Assembleia da República, a decisão de avançar com o processo, nos termos do artigo 130º da Constituição Portuguesa, relativo à responsabilidade criminal do Presidente da República.
O artigo estabelece que, “por crimes praticados no exercício das suas funções, o Presidente da República responde perante o Supremo Tribunal de Justiça”, sendo que a “iniciativa do processo cabe à Assembleia da República, mediante proposta de um quinto e deliberação aprovada por maioria de dois terços dos Deputados em efetividade de funções”.
O Chega tem mais de um quinto dos deputados no Parlamento, o que lhe permite avançar com a iniciativa e discuti-la em plenário, mas tanto o PSD como o PS já fizeram saber que não vão apoiar a iniciativa, que está assim defunta à partida. Uma eventual condenação implicaria “a destituição do cargo e a impossibilidade de reeleição”, sendo que o Presidente, uma vez deposto, responderia depois “perante os tribunais comuns”.
Marcelo já desvalorizara a possibilidade de o Chega avançar com um processo, comentando apenas “é a democracia”.