Segundo o processo que vai julgar os recursos interpostos por 31 sociedades desportivas e pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP), às quais a Autoridade da Concorrência (AdC) aplicou coimas que totalizaram 11,3 milhões de euros, hoje consultado pela Lusa, o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, emitiu certidão, de natureza urgente, para execução da integralidade do valor aplicado ao Boavista.
O clube foi o único que não procedeu ao pagamento, no prazo determinado pelo TCRS (27 de janeiro, já depois de uma prorrogação de sete dias), da caução acordada na sessão preliminar do passado dia 07 de dezembro de 2022.
Num despacho datado de 30 de janeiro, a juíza Mariana Gomes Machado determinou a emissão, imediata, da guia para pagamento voluntário, até 03 de fevereiro, dos 99.000 euros aplicados pela AdC ao Boavista, uma vez que o clube não tinha depositado até à data os 29.700 euros (correspondentes a 30% da coima), como havia sido acordado em 07 de dezembro.
Na sequência do despacho do TCRS, em requerimento, o Boavista alegou atravessar “gravíssimas dificuldades financeiras” e não ter conseguido, durante o prazo concedido pelo tribunal, obter receitas para pagar a caução determinada.
Declarando ter tomado conhecimento da emissão das guias para proceder ao pagamento do valor total da coima, o Boavista afirmou não lhe ser possível fazer esse pagamento, situação que considerou “lamentável” para o clube, pois, alega, com a execução, poderá ser colocado em insolvência judicial.
O TCRS salienta que o requerimento entrou após o prazo concedido para pagamento de apenas 30% da coima, para obter efeito suspensivo, e que o Boavista beneficiou ainda de um “compasso de espera”.
“Não obstante a complacência do tribunal, nada sobreveio, tendo apenas sido apresentado requerimento após prolação de despacho que julgou não prestada a caução e ordenou a emissão de guia para pagamento da coima, sob pena de execução”, afirma o despacho.
Mariana Machado lembra que a coima foi fixada pela AdC tendo em conta o volume de negócios da SAD do Boavista Futebol Clube, não existindo “qualquer documento ou evidência” que coloque em causa o valor apurado, nem, “muito menos, que ampare a alegação de insolvência”.
Não tendo feito o pagamento voluntário dos 99.000 euros até 03 de fevereiro, o Tribunal determinou que se cumprisse a emissão imediata de certidão para execução da integralidade da coima, a ser tramitada com natureza urgente, como constava do despacho de 30 de janeiro.
Fonte judicial disse à Lusa que foi pedido o bloqueio de seis contas bancárias do clube.
No caso do Rio Ave, ao qual foi concedida uma extensão até 02 de fevereiro para pagamento dos 32.600 euros acordados, na sequência de um pedido em que alegava estar a atravessar um “período transitório de particulares dificuldades financeiras”, o clube entregou, no dia seguinte, o comprovativo do pagamento da caução.
A SAD do Boavista Futebol Clube foi, assim, a única das recorrentes das coimas aplicadas pela AdC que não cumpriu o acordado na audiência de 07 de dezembro.
A prestação das cauções podia ser feita por garantia bancária, depósito à ordem do TCRS ou em títulos, desde que cotados em bolsa.
O TCRS criou cinco grupos de diferentes valores percentuais, atendendo à situação diferenciada dos clubes, tendo isentado da prestação de caução a Académica de Coimbra, que se encontra insolvente, e o Leixões e o Belenenses, por se encontram em Processo Especial de Revitalização.
Das 14 sociedades de menor dimensão que ficaram de prestar caução de 20%, 13 cumpriram o prazo – Viseu, Tondela, Famalicão, Moreirense, Vitória de Guimarães, Farense, Mafra, Estoril Praia, Penafiel, Covilhã, Oliveirense, Varzim, Vilafranquense -, tendo o Rio Ave pagado no prazo suplementar que lhe foi concedido.
Das seis que acordaram prestar caução de 30% do valor da coima – Marítimo, Boavista, Paços de Ferreira, Santa Clara, Portimonense e Gil Vicente –, apenas o Boavista incumpriu.
No grupo dos 40% ficaram a Liga, o Braga e o Sporting (este atendendo ao argumento de que, apesar de ser dos ‘grandes’, apresenta uma situação financeira mais frágil, dada a perda de receitas com a exclusão da Liga dos Campeões).
A caução do Sporting (666.400 euros) foi feita parcialmente em depósito à ordem dos autos (416.500 euros), com os restantes 249.900 euros por hipoteca de um lote de terreno pertencente a uma empresa que integra a SAD.
Sport Lisboa e Benfica (SLB) e Futebol Clube do Porto (FCP), sociedades que sofreram as multas mais elevadas (perto de 4,2 milhões de euros e de 2,6 milhões, respetivamente), prestaram cauções de 50%, tendo o SLB entregado uma garantia bancária e o FCP apresentado 1,4 milhões de ações da SAD, com um valor de mercado superior a 1,4 milhões de euros.
No processo está em causa a assinatura, em maio de 2020, de um acordo entre os filiados na LPFP de não contratação de futebolistas que rescindissem unilateralmente por motivos relacionados com a covid-19, situação que a Autoridade da Concorrência assumiu como “um acordo restritivo da concorrência no mercado laboral”.
O início do julgamento está marcado para o próximo dia 03 de maio.
MLL (SIF/RBA) // VR