“Logro”, “milagre”, “contradição insanável”, uma “verdadeira alquimia”. Em outubro do ano passado, à boleia da campanha para as eleições legislativas, o até então discreto secretário de Estado do Orçamento entrava na guerra pública de números entre o Ministério das Finanças e o PSD, para atacar a proposta com que Rui Rio se apresentava a votos. “A receita que nos prometem cortar é a receita que não existe em nenhuma estimativa independente. A isto chama-se um logro”, atirava João Leão num artigo publicado no jornal Eco. Agora, cabe-lhe substituir Mário Centeno na pasta das Finanças. A tomada de posse está marcada para a próxima segunda-feira.
Leão e Centeno começaram a trabalhar juntos ainda antes de um e outro entrarem no Governo. Em 2015, quando António Costa juntou um grupo de especialistas para preparar o cenário macroeconómico em que o PS assentaria o seu programa eleitoral para as legislativas desse ano, fizeram ambos parte da equipa.
Mas há outros pontos que se cruzam na carreira do ainda ministro das Finanças e do seu sucessor. Tal como Mário Centeno, João Leão também é doutorado pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos – o ministro indigitada haveria mesmo de notar essa “curiosidade” nas primeiras palavras que expressou depois de ser conhecida a sua promoção nas Finanças. Antes, tinha-se licenciado em Economia e concluído um mestrado na mesma área pela Universidade Nova de Lisboa.
O percurso de João Leão já tinha, de resto, sido alvo de um apontamento elogioso por parte de Centeno. Ainda em janeiro, durante uma conferência promovida pela Ordem dos Economistas, em que se debatia o primeiro Orçamento do Estado da democracia com previsão de excedente orçamental, o ministro admitia que o “sucesso” das Finanças se devia, em boa medida, às “qualificações” e à “coesão da equipa das Finanças” que o próprio liderava. Os seus secretários, dizia Centeno, citado pelo Expresso, “são do melhor capital humano que se forma em Portugal”.
O perfil oficial do novo ministro das Finanças refere que João Leão é professor de Economia no Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE) desde 2008. A estreia num Governo, ainda que de forma indireta, deu-se há 11 anos: entre 2009 e 2010, foi assessor do então secretário de Estado Adjunto da Indústria e do Desenvolvimento, Fernando Medina. O autarca de Lisboa e o novo ministro são, aliás, descritos como próximos.
Logo após essa curta experiência, João Leão dirigiu o Gabinete de Estudos do Ministro da Economia, até 2014, e daí chegou, já em 2015, ao primeiro cargo executivo num Governo, como secretário de Estado do Orçamento de Mário Centeno.
Além da docência no ISCTE, o novo ministro das Finanças também presidiu à Comissão Científica do Departamento de Economia do instituto e dirigiu o doutoramento em Economia daquela universidade. Entre 2010 e 2014, a par da atividade universitária, integrou o Conselho Económico e Social e o Conselho Superior de Estatística. Além disso, e num período mais curto (2010-2012(, fez parte da delegação portuguesa no Comité de Política Económica da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico.
João Leão é promovido ao principal lugar nas Finanças num momento particularmente desafiante. Depois de ter contribuído para que, já no ano passado, o país alcançasse o primeiro excedente orçamental da democracia (antecipando em um ano esse objetivo), a pandemia do novo coronavírus virou o tabuleiro das contas nacionais de pernas para o ar. O anúncio da sua chegada ao Terreiro do Paço coincide, aliás, com a aprovação pelo Governo do Orçamento Suplementar que permite enquadrar nas contas públicas o esforço financeiro necessário para responder à pandemia. João Leão terá a responsabilidade de executar esse orçamento e de começar a preparar, em breve, o Orçamento do Estado para 2021.
“Num momento tão desafiante para a estabilização da situação económica do país (…), é muito importante podermos contar com uma pessoa que as maiores garantias dá de continuidade da nossa política orçamental”, disse António Costa, já esta terça-feira, com Mário Centeno à sua direita e João Leão à sua esquerda. Pelo seu percurso profissional, o novo ministro, garantiu Costa, é “um profundo conhecedor da economia portuguesa”.