Menos de duas semanas depois do primeiro caso confirmado de infeção por Covid-19, o país entrou “numa fase de crescimento exponencial da epidemia”. Este sábado, o semanário Expresso referia que as previsões com que o Governo tem trabalho apontam para um pico do número de casos a chegar em maio, mas a ministra da Saúde prefere destacar a ideia de que a evolução do surto, que se quer tão suave quanto possível, dependerá do rigor com que cada um cumprir as indicações partilhadas pelos técnicos de saúde.
Sem se referir a cenários concretos, Marta Temido disse que o país está ainda perante uma “curva ascendente” do número de novos casos positivos. “Não sabemos quanto tempo esse movimento ascendente vai durar, mas sabemos uma coisa: esse comportamento da curva depende da adesão de cada um de nós aos comportamentos adequados” para combater a propagação de novos casos.
A conferência de imprensa deste sábado à tarde, que juntou Marta Temido, a diretora-geral da Saúde, Graças Freitas, e ainda o presidente do Infarmed, Rui Santos Ivo, serviu para perceber as várias frentes em que o Ministério da Saúde e os técnicos da Direção-geral de Saúde estão a trabalhar para responder a esta nova fase do surto do novo coronavírus.
Doentes “moderados” em casa
Por um lado, é expectável que cada vez mais se assista a casos de doentes com Covid-19 que são encaminhados para casa. Passa-se de uma “fase de tratamento em hospitais de referência, em que [os doentes são] maioritariamente internados, para uma fase, com o aumento de casos, em que se passa para um tratamento em casa, em ambulatório”, explicou Marta Temido. Estão em causa os doentes com “sintomas moderados”, que não precisam de especiais cuidados médicos. Os doentes mais graves continuarão a ser encaminhados para internamento – por exemplo, quando precisem de apoio com ventilação.
Ao mesmo tempo, o número de hospitais habilitados a acolher doentes com o novo vírus vai ser alargado. Aos hospitais de primeira linha e de segunda linha, juntam-se, de forma genérica, “todos os hospitais”. É a resposta ao facto de Portugal ter entrado numa “fase de crescimento exponencial” do surto.
Reforço de equipas intensivas
Mas há outras respostas em marcha. Toda a atividade clínica programada – portanto, não urgente – vai ser cancelada. Isso permitirá realocar os profissionais de saúde para tarefas urgentes e, ao mesmo tempo, permite reduzir a pressão sobre uma classe que ao longo dos próximos meses será chamada a uma permanente intervenção nas instituições de saúde.
”Precisamos que as estruturas concentrem a força na resposta àquilo que é o atendimento à Covid-19 e vamos ter de garantir um esforço durante algum tempo, precisamos de garantir que os profissionais não se esgotam com tarefas que podem ser renegadas para outro momento”, disse a ministra.
Temido disse ainda que os serviços de saúde estão, neste momento, a fazer um levantamento dos enfermeiros com experiência em cuidados intensivos. Aos que estiverem, neste momento, a exercer funções noutros serviços, poderá ser pedido que reforcem as equipas destes serviços intensivos para dar resposta às situações mais graves.
Também a pensar nos médicos, enfermeiros e auxiliares, além de profissionais de segurança e dos meios de socorro, a ministra da Saúde apelou a que, num cenário de escolas fechadas (como o que se inicia na próxima segunda-feira), os casais com filhos, em que um dos progenitores seja profissional de saúde, possam optar pela permanência em casa do outro progenitor. “Procuraremos garantir que ninguém é prejudicado pela atividade que exerce, mas contamos com todos”, disse Marta Temido.
Crianças com avós “não é boa ideia”
Tal como já tinha sublinhado nos últimos dias, e que vai ficando mais claro à medida que o número de casos aumenta, as gerações mais velhas são as que maior risco revelam perante o Covid-19. A diretora-geral de Saúde insistiu, por isso, na mensagem aos pais: “Desta vez, o recurso ao avós” para ficarem responsáveis pela guarda dos netos “não é boa solução” porque “podem ficar contagiados através destes contactos” com os elementos mais novos das famílias.
Graça Freitas tinha outra recado para dar, desta vez para os jovens. E foi assertiva: “Não estamos a impor” um recolher obrigatório, “mas há um mínimo de consideração, porque se adoecer pode não morrer, mas pode causar a morte ao seu avô ou à sua avó.”
Governo desmente discriminação de doentes
Neste momento, está também a ser feito um levantamento de todos os equipamentos ventiladores disponíveis no país. Para isso, o Ministério da Saúde recorreu também à Associação Portuguesa de Hospitalização Privada, que vai recolher os dados sobre os meios disponíveis naquele setor. Só depois será possível saber, em rigor, qual a capacidade de resposta a nível nacional. Face às informações falsas postas a circular nos últimos dias, e que dava conta de que os doentes com Covid-19 estariam a ser privilegiados em relação a outros, mais graves, no acesso a ventiladores, Graça Freitas deixou a garantia: “Não estamos a privilegiar doentes com Covid-19 em relação a outros (…) nem isso seria ético e deontológico”, disse a diretora-geral da saúde. “O que define o acesso aos nossos cuidados é a gravidade do estado do doente”, rematou.
Confrontada com as notícias que dão conta de uma falta de equipamentos de proteção individual entre os profissionais de saúde, Marta Temido admitiu “dificuldades” na gestão dos stocks. “Temos, neste momento, máscaras que serão entregues este fim de semana”, avançou a ministra, garantindo que os stocks estão a ser “reforçados”, uma vez que alguns eram “relativamente baixos” quando o surto atingiu o país.