Nos primeiros seis meses de 2019, só 6% dos processos por corrupção resultaram numa acusação do Ministério Público. Neste momento, há mais de 800 processos de corrupção pendentes na Polícia Judiciária. Mas os últimos números, de 2018, mostram que só 28 processos por esse crime terminaram nos tribunais de 1ª instância e que apenas 20 pessoas foram condenadas. Apesar disso, outros dados mostram que a corrupção traz custos para Portugal na ordem dos 18,2 mil milhões de euros, cerca de 9% do Produto Interno Bruto (PIB) e mais do que o orçamento anual para a Saúde. Em termos globais, o cenário não é mais animador: segundo estimativas das Nações Unidas, a corrupção custa todos os anos ligeiramente mais do que 5% do PIB mundial.
Consciente desse impacto, e na data em que se assinala o dia internacional contra a corrupção, o Ministério da Justiça anunciou que até abril vai apresentar uma estratégia nacional de combate ao crime. Um dos pontos em cima da mesa – que promete fazer correr muita tinta entre os vários actores judiciários – é a implementação de uma redução de pena para quem denunciar estes crimes(em moldes diferentes dos que o Código de Processo Penal prevê hoje), algo mais próximo de uma colaboração (ou delação) premiada. Outra das hipóteses a ser estudada é a hipótese de negociação de sentenças já em fase de julgamento. Atualmente, a lei em vigor em Portugal permite apenas reduções de penas para quem denunciar um crime nos 30 dias seguintes ao mesmo ter sido cometido e o denunciante tem de estar envolvido nesses factos.
O ministério de Francisca Van Dunem quer ainda acabar com os mega-processos (como o BES ou a Operação Marquês) para acelerá-los aos olhos da opinião pública, quer que sejam criados juízos especiais para julgar casos de corrupção e crimes económico-financeiros do mesmo género e quer que os juízes tenham mais experiência nesta matéria. Tudo isto será discutido por um grupo de trabalho constituído por elementos da Procuradoria-Geral da República, da Polícia Judiciária, do Conselho Superior de Magistratura e do Conselho de Prevenção da Corrupção.
O programa do governo já previa que as entidades administrativas sejam obrigadas a adotar códigos de conduta, que as empresas tenham planos de prevenção de riscos de corrupção e que as contas dos partidos políticos passem a ser mais transparentes.
Os números
Em 2018, foram abertos 71 processos contra o Estado por crimes cometidos no exercício de funções públicas. Mas nos seis primeiros meses de 2019, só 6% dos inquéritos por corrupção terminaram em acusação. Ou seja, 94% dos casos foram arquivados. Apesar disto, o número de casos de corrupção que deram entrada na Polícia Judiciária não para de aumentar: são em 834, mais do dobro dos que existiam há quatro anos.
Um relatório apresentado no ano passado, no Parlamento Europeu, pelo grupo Os Verdes/Aliança Livre Europeia concluiu que na União Europeia os custos com a corrupção ascendem a 904 mil milhões de euros anuais e que Portugal era o 11º dos 28 países da UE com a fatura mais pesada da corrupção. Esse relatório concuía que os custos para Portugal da corrupção, situados acima dos 18,2 mil milhões de euros por ano, superava o orçamento anual para a Saúde (16,2 mil milhões de euros) e era dez vezes superior às despesas com o desemprego (1,8 mil milhões). Mais: se esses custos fossem redistribuídos a todos os portugueses, cada um ganharia 1763 euros por ano.