Para conhecer a história da curta vida de João Arruda e as horas que antecederam a sua morte, a 25 de abril de 1974, terá de comprar a VISÃO desta semana e connosco recuar 40 anos. Por agora, dizemos-lhe que nunca antes a história trágica deste jovem açoriano, assassinado pela polícia política, tinha sido conhecida do grande público. Prova desse desconhecimento era a própria placa, roubada há semanas, que homenageava os mortos do dia da revolução pela PIDE-DGS e que estava colocada no antigo edifício da polícia política, hoje um condomínio privado: o nome de João Guilherme Rego Arruda aparece identificado como José. Uma réplica foi entretanto reposta pela Câmara de Lisboa na Rua António Maria Cardoso, na última terça, 22, mas a placa onde figuram os nomes dos quatro mortos desse dia repete o erro.
Em São Miguel, ilha natal do antigo estudante de Filosofia, nunca se enganaram.
A homenagem da Câmara Municipal de Ponta Delgada foi feita por ocasião das bodas de prata do Dia da Liberdade no cemitério de Santo António, na presença de familiares e amigos de João Arruda. “Todos os anos o visito no 25 de Abril e organizo um jantar-festa tipo “um farnel para Abril levar””, diz Manuel Sá Couto, antigo colega de faculdade e professor na Escola Secundária Antero de Quental. Foi dele a iniciativa de criar há dois anos um grupo no Facebook para que ganhasse força a ideia de dar o nome do estudante a uma rua dos Açores. Uma iniciativa que, em breve, deverá ter acolhimento por parte do poder autárquico.
Enquanto foi presidente do Governo Regional, Mota Amaral mandou celebrar missas por João Arruda e visitou o cemitério. “Mas nunca foi feita justiça aos mortos de Abril, nem a sua família teve direito a uma “pensão de sangue””, refere Sá Couto, que conviveu de perto com parentes do estudante morto a tiro pela polícia política. “A [Maria de ]Lurdes, irmã do João, só há poucos anos deixou os seus filhos participarem neste jantar de Abril, uma vez que, para ela, Abril é luto e não festa”, esclarece o professor.
E a família rumou aos EUA
João Arruda insistira bastante para que a família rumasse aos EUA.
Sempre preocupado com o bem-estar dos seus, queria que uma das irmãs fosse operada a uma vista em território norte-americano, o que viria a acontecer mais tarde e com sucesso. Conforme revelou a seu tempo Eurico Mendes, figura incontornável da comunicação social lusa nos states, das 11 irmãs – duas meninas morreram ainda bebés – oito, acompanhadas pelos pais, começaram a rumar a Fall River, Westport, Tiverton e Dartmouth, no Massachussets, a partir de novembro de 1975, ficando apenas Maria de Lurdes em São Miguel. Gabriela da Silva, Ana Frias, Etelvina Medeiros, Helena Chaves, Maria do Carmo Penacho, Paula Guiomar, Jorgina Carvalho e Esmeralda Torres foram deixando os Açores, em diferentes períodos, instalando-se nos EUA em definitivo. Eduardo Arruda e Jorgina, os pais de João Arruda faleceram, entretanto. António Duarte Arruda, o irmão mais velho do estudante morto pela PIDE, morrera já em 1965, em circunstâncias nunca totalmente esclarecidas que traziam João inconsolável.
Contactada pelo telefone, Esmeralda Torres não hesitou quando lhe perguntámos se, apesar do assassinato de João no 25 de Abril, a data era motivo de celebração para a família: “Oh! Yes! Sem dúvida. Ele conquistou-nos a todos para os ideais de liberdade e democracia e aquele dia significou muito para Portugal. Quero pensar que a morte dele não foi em vão e que ainda viveu umas horas de felicidade”, conta. Para Esmeralda, contudo, a passagem desta efeméride traz sempre algum luto à memória. E também alguma mágoa. “Tal como o meu irmão, os que morreram nesse dia são heróis de Abril. Mas no meio daquela euforia toda, isso foi um bocadinho esquecido. Já ficava satisfeita se a recordação da história dele servisse para corrigir o nome na placa”, assinala.