Todas as sondagens confirmam que as próximas eleições se vão traduzir, para além da distribuição dos deputados por cada partido, numa escolha muito importante: quem deve ser o primeiro-ministro do nosso país nos próximos quatro anos? Essa escolha tem um duplo aspeto: 1.º, José Sócrates governou bem ou mal?; 2.º, se não governou bem, Passos Coelho é uma boa alternativa para o substituir? A primeira questão é fundamental e envolve um necessário “juízo sobre o passado “; José Sócrates é primeiro-ministro há mais de 6 anos; como avaliamos o seu desempenho? Apesar de ter começado bem, acontece que com a crise de 2008 ele ficou perturbado e errou nas grandes decisões que teve de tomar: autorizou demasiados gastos eleitoralistas em 2009 (o que fez saltar o défice orçamental de 2,9% do PIB para mais de 9%); agravou demasiado a dívida pública; e não reduziu a despesa corrente.
Em 2010 foi pior: em vez de um pacote enérgico de medidas suficientes e eficazes, como fez Zapatero, Sócrates apresentou três PEC’s que não cumpriu. Foi um ano perdido.
Em 2011, apesar das sucessivas advertências de muitos incluindo as do seu ministro das Finanças, o primeiro-ministro continuou cegamente a negar que Portugal precisasse de ajuda externa, mesmo quando os juros da nossa dívida ultrapassaram os fatídicos 7 por cento.
(Devo esclarecer que não despertei só agora para a perda de qualidade da governação de José Sócrates. Critiquei-o publicamente em 2009, 2010 e 2011. E, no outono de 2010, alertei aqui, na VISÃO, para que ou José Sócrates tomava urgentemente as medidas que se impunham, ou outro Governo as tomaria, após a sua queda. Pelos vistos, não me enganei muito.) Em conclusão, penso que, se José Sócrates pareceu poder ser um bom comandante enquanto o navio singrava em águas tranquilas, o certo é que, quando apareceu a borrasca, em vez de a tornear e conduzir o barco e os passageiros a bom porto, ele deixou-se levar para o meio da tempestade e colocou-nos num redemoinho muito perigoso, que ameaça afundar-nos de vez.
Vamos escolher para nos tirar do buraco negro quem nos atirou para lá? Como acreditar que José Sócrates é a pessoa indicada para salvar o navio, se ele continua a negar que tenhamos estado no meio de qualquer tempestade? A sua governação foi indo de mal a pior.
É por isso, aliás, que, depois de uma maioria absoluta em 2005, ele passou a chefiar um Governo minoritário em 2009 (cartão amarelo) e está à beira de perder as eleições de 2011, recebendo o merecido cartão encarnado. Em meu entender, não deve continuar a ser primeiro-ministro; teve a maioria do País com ele e perdeu-a. O seu tempo passou.
SE ESTA É A MINHA RESPOSTA à 1.ª questão, como penso dever responder-se à 2.ª? É Pedro Passos uma boa alternativa para substituir José Sócrates? Conheço-o bem; li o que escreveu e tenho-o seguido na televisão. A minha impressão pessoal é francamente positiva.
Que razões objetivas podem ser apresentadas para que o povo português o escolha para primeiro-ministro? Por mim, vejo pelo menos cinco: 1. Para enfrentar com êxito uma crise tão séria como a atual, é indispensável estabelecer e manter uma permanente cooperação estratégica do primeiro-ministro com o Presidente da República. José Sócrates recebeu-a da parte de Cavaco Silva, mas deitou-a fora. Passos Coelho não cometerá o mesmo erro; 2. É preciso, por outro lado, uma grande capacidade de diálogo com a Oposição, sem arrogância nem menosprezo pelo adversário.
Passos Coelho tem essa postura democrática aberta, que José Sócrates foi perdendo ao longo dos seus anos de primeiro-ministro; 3. Nesta enorme e dolorosa crise, não bastará o diálogo político e parlamentar.
Vai ser necessária uma permanente e sincera concertação social. Passos Coelho terá aí uma grande oportunidade, que José Sócrates nunca soube, ou não quis, aproveitar a sério; 4. O cumprimento rigoroso, e atempado, do acordo com a troika requer do primeiro-ministro que o tiver de aplicar a convicção íntima de que tal acordo foi (e é) indispensável e de que as respetivas medidas não são apenas um “mal necessário”, mas também uma “excelente oportunidade ” para efetuar importantes reformas estruturais sempre adiadas (administração pública, justiça, educação, saúde, redução razoável do peso do Estado no PIB, etc.).
José Sócrates disse e repetiu, vezes sem conta, que Portugal não precisava nem precisaria nunca de ajuda externa e que ele, Sócrates, não estava “disponível para governar com o FMI”. Como se permite candidatar-se a primeiro-ministro, se vai ter mesmo de “governar com o FMI?” Passos Coelho, à luz do programa do PSD que apresentou estará muito mais à vontade no novo contexto do que José Sócrates; 5. Já sabemos, desde a semana passada, qual a política de alianças do PSD: se ganhar as eleições quer tenha maioria absoluta quer a tenha com o CDS-PP convidará este companheiro da AD para o Governo (o que é importante); não fará “bloco central” com o PS de José Sócrates; e, se o PSD não for o partido mais votado, não aceitará ser primeiro-ministro, mesmo que o seu partido tenha maioria absoluta com o CDS-PP. Perante isto, pergunta-se: qual é a política de alianças do PS? Aceitará José Sócrates ser novo primeiro-ministro de um Governo minoritário sem ter por base, ao menos, um acordo de incidência parlamentar? Se não aceita, com quem espera fazer esse acordo? Se aceita, isso quer dizer que está disposto a enfrentar o Presidente da República, que já se pronunciou a favor da necessidade de um Governo com apoio parlamentar maioritário. Neste momento, Passos Coelho disse tudo o que era preciso saber dele a respeito de alianças: irá José Sócrates manter a indefinição até às eleições? Nesse caso, o que será que o impede de tornar tudo claro perante os eleitores a quem pede que votem nele? Porquê tanto segredo? Termino com uma ideia muito acertada do filósofo Karl Popper: a grande vantagem da Democracia não está só no direito do povo de escolher aqueles por quem quer ser governado, mas também (e, às vezes, sobretudo) no direito do povo de, por via pacífica, eleitoral, mandar embora aqueles por quem não quer continuar a ser governado.