No momento em que adquiriu a sua casa de férias, Gaivota Azul, na urbanização da Coelha, em Albufeira, Cavaco Silva não pagou sisa. O documento das Finanças que apresentou no dia em que assinou a escritura (liquidação n.º 547, de 2 de Junho de 1998, da Repartição de Finanças de Albufeira) isenta-o do pagamento desse antigo imposto municipal sobre a transação de imóveis. E foi esse documento, que Aníbal Cavaco Silva requereu às Finanças, através do seu gestor de negócios, José Eduardo Palma Soares, que o atual Presidente da República apresentou na assinatura da escritura.
Quando requereu a liquidação do imposto, salientando que a aquisição seria feita através de uma permuta em que “os prédios são transmitidos livres de ónus ou encargos”, Cavaco Silva enquadrava-se na isenção de sisa prevista na lei, para estes casos de “troca direta de imóveis”.
Uma vez que a casa nova não tinha avaliação patrimonial, e estava “omissa na matriz”, as Finanças instauraram uma avaliação, ao abrigo do artigo 109.º, do antigo código da sisa, que estipulava: “No caso de contratos de permuta de bens presentes por bens futuros, a avaliação do bem futuro será feita com base na cópia do projecto de construção aprovado e seus anexos, devidamente autenticada pela competente câmara municipal.” O mesmo código, no artigo 7.º, esclarece que “nos contratos de permuta de bens imóveis, qualquer que seja a sua natureza, a sisa será paga pelo permutante que receber os bens de maior valor.”
Como a VISÃO noticiou, na semana passada, no registo do licenciamento da obra, consultável na Câmara de Albufeira, só a construção da casa estava orçada em mais de 132 mil euros (os terrenos tinham sido adquiridos por mais 80 mil). Ou seja, as Finanças detetaram que o valor atribuído, pelas partes, à nova casa, era inferior ao seu valor real. E apuraram, também, que existia uma diferença de valores patrimoniais entre a vivenda Mariani, cedida por Cavaco, e a Gaivota Azul, recebida em troca.
Cavaco Silva vem, agora, reconhecer, em comunicado publicado na sua página oficial na internet, que foi “notificado”, pelas Finanças, para pagar “€ 8.133,44 (oito mil cento e trinta e três euros e quarenta e quatro cêntimos) em resultado da diferença entre os valores patrimoniais dos bens permutados”. Ou seja, ao contrário do que as partes haviam acordado na escritura, para as Finanças existia uma diferença de valores (a favor da Gaivota Azul) de, exatamente, 81.334.400 euros. Foi esse o valor que Cavaco Silva, segundo as Finanças, beneficiou na troca efetuada com a empresa Constralmada, de que Fernando Fantasia era um dos proprietários. E foi sobre essa vantagem patrimonial que requereu ao atual Presidente da República o pagamento do imposto da sisa “à taxa de 10%”.
Ao longo das últimas semanas, VISÃO procurou, com insistência, esclarecer este e outros assuntos relacionados com a aquisição, em 1998, da atual casa de férias do Presidente da República. Do Palácio de Belém não chegou, até à data, qualquer resposta. Apenas um comunicado, publicado no site da Presidência, hoje, terça-feira, 1 de Fevereiro, procura dar resposta a uma das questões suscitadas pelos trabalhos da VISÃO. Para o Presidente, a aquisição da sua casa de férias “tratou-se de uma transacção perfeitamente legítima e transparente, idêntica a milhares de outras”.