Boris Bondarev, diplomata russo da delegação da ONU em Genebra, renunciou ao cargo esta segunda-feira, expressando vergonha pela invasão da Ucrânia pela Rússia. Bondarev enviou, esta segunda-feira de manhã, uma carta aos seus homólogos de outros países.
A sua renúncia é o gesto de protesto de maior destaque feito até agora por um diplomata russo contra a Guerra na Ucrânia. Bondarev, de 41 anos, esteve 20 anos no cargo.
Leia a sua declaração na íntegra:
“Durante vinte anos da minha carreira diplomática vi diferentes reviravoltas na nossa política externa, mas nunca senti tanta vergonha do meu país como no dia 24 de fevereiro deste ano. A agressiva guerra desencadeada por Putin contra a Ucrânia, e contra todo o mundo Ocidental, não é apenas um crime contra o povo ucraniano, mas também, talvez, o crime mais grave contra o povo da Rússia, com a letra Z a negrito riscando todas as esperanças e perspetivas de uma sociedade próspera e livre no nosso país.
Aqueles que conceberam esta guerra querem apenas uma coisa – permanecer no poder para sempre, viver em palácios pomposos de mau gosto, navegar em iates comparáveis em capacidade e custo à Marinha russa, desfrutando de um poder ilimitado e total impunidade. Para conseguir isso, estão dispostos a sacrificar quantas vidas forem necessárias. Milhares de russos e ucranianos já morreram só por isso.
Lamento admitir que ao longo de todos estes vinte anos o nível de mentiras e falta de profissionalismo no trabalho do Ministério dos Negócios Estrangeiros tem aumentado cada vez mais. No entanto, nos últimos anos, isso tornou-se simplesmente catastrófico. Em vez de informações neutras, análises imparciais e previsões sóbrias, há clichês de propaganda no espírito dos jornais soviéticos da década de 1930. Foi construído um sistema que se engana a si mesmo.
O ministro Lavrov [diplomata russo e Ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia] é um bom exemplo da degradação deste sistema. Em 18 anos, passou de um profissional intelectual e educado, que muitos dos meus colegas tinham em tão alta estima, para uma pessoa que constantemente transmite declarações que causam conflitos e ameaça o mundo (ou seja, a Rússia também) com armas nucleares!
Hoje, o Ministério dos Negócios Estrangeiros não tem nada a ver com diplomacia. É tudo sobre belicismo, mentiras e ódio. Serve os interesses de poucos, muito poucos, contribuindo assim para um maior isolamento e degradação do meu país. A Rússia não tem mais aliados, e não há ninguém para culpar a não ser a sua política imprudente e mal concebida.
Estudei para ser diplomata e sou diplomata há vinte anos. O Ministério tornou-se a minha casa e a minha família. Mas simplesmente não posso continuar a partilhar esta ignomínia sangrenta, tola e absolutamente desnecessária.”