Na memória de milhões de espectadores, em todo o planeta, continua bem gravado o momento exato em que a China se apresentou ao mundo como superpotência global: foi precisamente às 8 horas (da noite) e 8 minutos do emblemático dia 8 de agosto (mês 8…) de 2008, quando se iniciou a transmissão televisiva da cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim, um espetáculo gigantesco, que terá custado cerca de 100 milhões de euros, e que contou com a participação de mais de 15 mil artistas, com o objetivo de mostrar o melhor da cultura e da História chinesa. Naquele dia, a China mostrava-se um anfitrião extraordinário e o resto do mundo só tinha olhos para as inesgotáveis oportunidades que o imenso país oferecia. E, ainda por cima, com uma esperança secreta: esta abertura prenunciava, na mente de todos os dirigentes ocidentais, que a sociedade chinesa iria em breve ficar muito semelhante à nossa. Esperava-se uma abertura democrática parecida com a que ocorrera, em 1988, na Coreia do Sul, quando os Jogos se realizaram em Seul.
Agora, quase 14 anos depois, a China volta a acolher os Jogos Olímpicos – desta vez os de inverno, com Pequim a ser a primeira cidade a organizar os dois eventos –, mas a semelhança entre o país de 2022 e o de 2008 quase se resume à cerimónia de abertura (marcada para 4 de fevereiro): vai realizar-se no mesmo emblemático Estádio Olímpico de Pequim e o diretor artístico será novamente o cineasta Zhang Yìmou. De resto, em vez da festa popular de exaltação patriótica a que se assistiu em 2008, agora os Jogos vão decorrer sob a pandemia, sem visitantes estrangeiros e com público selecionado nas bancadas – com a China a tentar mostrar ao mundo que a sua política de Covid-zero é mesmo eficaz para evitar o contágio, ainda que isso implique, com alguma regularidade, confinar cidades inteiras com mais de dez milhões de habitantes. Se em 2008 estiveram presentes mais de 80 chefes de Estado na tribuna, desta vez haverá várias ausências, algumas provocadas pelas restrições da Covid-19 e outras pelo apelo ao boicote diplomático proposto pelos EUA, e que foi acompanhado pelos seus aliados mais próximos. E, finalmente, se em 2008 a China queria ser um humilde anfitrião, que procurava quebrar a desconfiança que sabia existir no resto do mundo a seu respeito, em 2022 a sua postura é completamente diferente: quer afirmar-se como uma grande potência, decidida a ultrapassar os EUA no espaço de uma década, e quer impor as suas regras e não ficar vinculada às dos outros.