Foi durante o dia das eleições, ainda com milhões de votos por contar, que o atual líder supremo do Irão, Ayatollah Ali Khamenei, referiu que a decisão dos EUA “não vai ter impacto” no seu país, apesar de Donald Trump ter enfraquecido a economia iraniana nos últimos quatro anos. À VISÃO, Talha Ahamd, analista geopolítico e editor no Pakistan Strategic Forum, diz que “o Irão pós-Soleimani apoiaria qualquer candidato que não Trump” e acredita que a eleição de Biden significaria o regresso dos EUA ao acordo nuclear, que pode vir acompanhado de uma reconciliação entre Washington e Teerão.
O Irão olha para as eleições norte-americanas na fila da frente. “Não importa quem vai ganhar porque as políticas em geral permanecerão agressivas”, diz Ahamd. Ainda assim, entre os candidatos americanos, Biden é a “opção menos má” e o presidente iraniano, Hassan Rouhani, já deixou o aviso: “Queremos ser respeitados, não sujeitos a sanções. Não importa quem ganha as eleições. O que queremos é que os EUA voltem à lei e voltem aos acordos internacionais e multilaterais”, diz, referindo-se às duras decisões de Donald Trump durante o primeiro mandato.
Nos últimos quatro anos, o presidente americano aumentou as hostilidades no Médio Oriente devido à campanha da “pressão máxima”: além da retirada unilateral do acordo nuclear de Obama, impôs sanções aos iranianos no valor de 83 milhões de dólares. O colapso da moeda, o aumento da inflação, a contração do PIB, a diminuição dos salários e o desemprego em massa foram algumas das consequências. “O Irão sofreu muito devido às sanções, especialmente durante a era da Covid-19”, aponta o especialista.
Joe Biden já prometeu voltar atrás na decisão da retirada dos EUA do acordo nuclear, caso seja eleito Presidente dos EUA, afirmando que “se o Irão voltar a cumprir estritamente o acordo nuclear, os Estados Unidos voltarão a aderir ao acordo como ponto de partida para negociações subsequentes”. Num editorial publicado na CNN, o candidato democrata referiu ainda que as políticas agressivas com o governo de Teerão falharam: “Ele (Trump) aumentou repetidamente as tensões, arriscando-nos a aproximar-nos de outra guerra no Médio Oriente sem uma estratégia ou um final de jogo realista. Ele mergulhou em escaladas arriscadas que colocaram as nossas tropas em perigo”.
Teerão diz “não querer saber das eleições”. O povo segue a tendência
Segundo um estudo realizado pela Iranian Students Polling Agency (ISPA) e citado no Atlantic Council, cerca de 46% dos iranianos não se importam de quem seja o vencedor das eleições americanas. Apesar das políticas severas aplicadas por Trump, “muitos iranianos ainda não acreditam que o resultado das eleições nos EUA mudará significativamente a situação do Irão”, revela o estudo. Os problemas, segundo a opinião pública, vêm de dentro.
“A pressão também está a aumentar sobre o governo devido à má situação económica”, explica o analista geopolítico. Apesar de 76% acreditarem que o impacto das sanções impostas pelo Ocidente “foi muito ou um pouco negativo”, mais de metade dos inquiridos apontaram “a má gestão económica interna e a corrupção como tendo o maior impacto negativo na economia, em comparação com os 39% que culparam as sanções estrangeiras”. As próximas eleições estão marcadas para junho de 2021.