Um relatório recém-divulgado, assinado por um responsável médico da CIA, detalha em que consistia o projeto que equacionava trocar a tortura por medicação para forçar os suspeitos de terrorismo detidos nos anos que se seguiram aos atentados de 11 de setembro de 2001 a fornecerem informações.
Os médicos da agência analisaram o uso de barbitúricos (efeito sedativo e hipnótico), de psicotomiméticos (que geram sintomas de psicose), e sobretudo do midazolam, uma benzodiazepina. Este tipo de medicamento, que é usado normalmente para tratar a ansiedade, revelou, no entanto, uma desvantagem significativa quando comparada com o LSD que a CIA usou nos anos 50: o midazolam tem de ser administrado por via intravenosa, enquanto o potente alucinogénio pode ser administrado sem que o interrogado dê sequer por isso.
A hipótese esteve em cima da mesa devido à “notável resistência” de Abu Zubaydah, suspeito de ajudar a planear o 11 de Setembro, às técnicas de interrogatório empregues pela CIA.
“A intensidade e a duração dos interrogatórios de AZ foram uma surpresa para os Serviços Médicos e motivaram um estudo mais profundo sobre a alternativa aparentemente mais benigna dos interrogatórios com drogas”, lê-se no relatório.
A agência desistiu da ideia em 2003, sem nunca enviar o pedido de parecer ao Departamento de Justiça, depois de analisar os resultados de tentativas anteriores, incluindo um relatório, datado de 1961, que concluiu que quem aguenta os interrogatórios também é capaz, provavelmente, de manter a sua posição mesmo em estados mentais alterados, como seria o caso com o uso de um “soro da verdade”.
Há mais de dois anos que a União Americana pelas Liberdades Civis pedia a publicação do relatório até aqui classificado, no âmbito das alterações à Lei da Liberdade da Informação nos EUA. Um juiz federal autorizou a sua divulgação em setembro do ano passado e documento chegou ao conhecimento público esta semana.
“Talvez o elemento mais surpreendente do documento seja a cegueira voluntária dos médicos da CIA em relação ao que estavam a fazer”, comenta Dror Ladin, advogado da ONG. “Os médicos da CIA decidiram que o waterboarding [técnica de tortura que simula o afogamento] ‘providenciava um alívio periódico’ ao prisioneiro porque era uma pausa dos dias de privação de sono. Da mesma forma, os médicos da CIA decidiram que quando um prisioneiro era enfiado numa caixa do tamanho de um caixão, isto representava um ‘santuário relativamente benigno’ em relação a outros métodos de tortura”, lamenta o advogado.