Já se tinha entrado nos anos 60, mas ainda não chegara a loucura que acabou por marcar essa década. O espírito, em Park Ridge, Illinois, era mais tranquilo, mais anos 50. Vivia-se numa espécie de cocoon homogéneo onde as ruas, ladeadas por frondosos ulmeiros, ainda eram iluminadas por candeeiros a gás.
A família Rodham não era propriamente abastada, mas a jovem Hillary (que por casamento se tornaria Clinton) tinha um quarto só para si, com chão de madeira, paredes pintadas de amarelo e cortinas cor-de-rosa. Produto de uma educação conservadora, aprendera a tocar piano com um vizinho, jogava pingue-pongue e ia à igreja metodista, onde lhe passavam a mensagem “Be nice, don’t drink, don’t smoke, don’t say dirty words, don’t pierce your ears and don’t be contaminated by the world outside” [sê simpática, não bebas, não fumes, não digas palavras feias, não fures as orelhas e não te deixes contaminar pelo mundo exterior], relata o jornal Washington Post, recordando uma entrevista de vida a Hillary, publicada em 1993.
Na escola (a Maine East High School), Hillary era vice-presidente (o equivalente subdelegada) da sua classe e a vida corria pacata, até decidir candidatar-se à presidência do conselho (ou associação) de estudantes, para o mandato que começaria no ano seguinte. Nunca uma rapariga o tinha feito. Geralmente, a presidência era disputada por rapazes. As raparigas – e apenas as mais populares – costumavam candidatar-se a não mais do que ao lugar de secretária, explicou ao jornal americano o colega de turma Tim Sheldon.
Mas nesse ano de 1964, enquanto Bob Dylan lançava o single The Times They Are a Changing, os ventos de mudança também chegavam a Park Ridge. Entre os cinco candidatos, destacavam-se duas raparigas: Hillary e Jackie Anderson. Hillary chegou a ouvir, de um colega, que tinha de ser “mesmo estúpida” se pensava que uma rapariga podia ganhar.
Não ganhou, é certo. Mas a jovem conservadora, apoiante do republicano Barry Goldwater (que concorria contra o democrata Lyndon Johnson, que em novembro viria a suceder a John F. Kennedy) ganhava fama – de alguém que, apesar de não ter carisma, estudava, se preparava, sabia debater, “tinha intelecto para ganhar um debate de ideias”, refere o jornal americano. “Era a pessoa mais brilhante que alguma vez conheci e ainda acredito nisso”, diz Howard Primer, com quem simulou um debate perante uma plateia de alunos.
O ano de 1964 passou, mas os tempos de mudança ficaram. Park Ridge deixou de ser a cidade onde uma rapariga nunca tinha sido eleita presidente da associação de estudantes, para passar a ser aquela onde uma rapariga sabia que já podia concorrer.