Por isso, para se dar algum título ao arranha-céus londrino, é preciso recorrer a subterfúgios, seja um do quadro mental da guerra fria “o edifício mais alto da Europa Ocidental” seja um outro, que lembra a crise atual: “O edifício mais alto da União Europeia.” Como quer que seja, o arranhacéus cuja última inauguração, a do seu miradouro, ocorreu na sexta-feira, 1, não deixa ninguém indiferente. Para alguns, trata-se apenas de uma “grande pirâmide de vidro e aço”. Ou, como diz uma cronista do diário The Guardian: “A melhor coisa da vista do miradouro do Shard? É que não se vê o Shard a partir dele.” É esta, também, a posição adotada pela UNESCO, que o contestou, por alterar a relação da cidade com a Torre de Londres, um monumento que recebe 2,5 milhões de turistas por ano. O edifício tem sido criticado pela sua volumetria e quando foi inaugurado, em julho, apontou vinte focos laser para outras tantas obras arquitetónicas de peso na cidade, mas… esqueceu-se do Big Ben.
Para outros, o Shard é o “teto da Europa “, como lhe chamou o El País, uma estrutura que revoluciona a forma como pensamos as metrópoles. “A torre evidencia a decisão de densificar os centros das cidades, contra a possibilidade de crescer para a periferia e confirma, igualmente, que, nos arranha-céus do futuro, o valor artístico ganhará força e peso”, diz o diário espanhol. A revista The Economist considera mesmo o Shard uma das “novas sete maravilhas do mundo”.
Estética à parte, o edifício cristaliza a noção de Londres como a “capital da finança” da Europa: o seu financiamento vem do Qatar e deverá servir como uma extensão da City. Os arranha-céus foram sempre um motivo de orgulho e propaganda para as nações. Olhe-se, por exemplo, para as declarações do promotor da torre Mercury de Moscovo: “Mostra que a Rússia está ao nível dos países da Zona Euro, continuando o seu planeamento e avançando.” A estrutura fica na “nova Wall Street” da capital russa, um complexo avaliado em 12 mil milhões de dólares. Mas, por muito que Igor Kesayev fique desiludido, competir pelo título de edifício mais alto da Europa é, hoje, um pouco como jogar nas distritais: há mais de 60 edifícios mais altos no globo, em outros tantos centros de poder económico a América do Norte, a Ásia e o Médio Oriente. E, para já, com 828 metros, o Burj Khalifa, no Dubai, continua sem rival…