A TAP anunciou a abertura de um inquérito e de um processo disciplinar a dois responsáveis dos Recursos Humanos da empresa, incluindo o diretor, depois de um vídeo em que estes surgem, em Madrid, a anunciar que estão a fazer recrutamentos de pessoal, numa altura em que a empresa está a dispensar e a despedir trabalhadores.
“Tendo tomado conhecimento de uma publicação nas redes sociais na qual intervêm, a título pessoal, dois trabalhadores da companhia, com responsabilidades na área dos recursos humanos e dado o momento que a TAP vive, em que a todos nós são pedidos sacrifícios, decidiu o conselho de administração abrir, de imediato, um processo de inquérito seguido dos procedimentos disciplinares aplicáveis a esta situação,” refere fonte oficial da empresa à VISÃO.
“Neste momento delicado da vida da companhia, o Conselho de Administração expressa a sua solidariedade para com todos os trabalhadores da TAP e apela ao bom senso e recato de todos,” acrescenta a mesma fonte.
No vídeo de pouco mais de dois minutos, não datado e divulgado esta terça-feira nas redes sociais, o diretor de Recursos Humanos do grupo TAP, Pedro Ramos, surge ao lado de João Falcato, profissional também ligado à mesma área na empresa, num direto a partir da Plaza Mayor em Madrid, Espanha. Os dois colaboradores dizem estar na capital espanhola a fazer “assessments” para escolher o “responsável da área de carga” da empresa.
“Vamos selecionar os melhores. Neste caso vamos selecionar o melhor responsável da nossa área de carga. Em Portugal? Não. Em Madrid. Em Espanha, em Espanha!”, diz Pedro Ramos. “É uma cultura diferente, são muito mais abertos, estão muito mais à procura de oportunidades, e acham que isto já passou. O que é muito importante, porque continuamos a encontrar gente de excelente qualidade que está disponível no mercado fruto da pandemia. Esperamos trazer para a TAP gente que não estaria disponível até este momento. E que vamos conseguir contratar”, acrescenta João Falcato.
A TAP, que aguarda pela aprovação do seu plano de reestruturação em Bruxelas (onde se prevê redução de pessoal, da massa salarial do grupo e da frota de aeronaves), já tinha perdido até abril cerca de 2.400 trabalhadores, entre não renovação de contratos a prazo e saídas voluntárias. Entretanto, 206 trabalhadores (entre pilotos, tripulantes de cabina, trabalhadores da TAP M&E e colaboradores da sede) que tinham sido chamados para rescindir contrato e recusaram, deixaram a situação de lay-off a 5 de junho e podem ser alvo de despedimento coletivo em julho, se recusarem a saída voluntária.
Também o Ministério das Infraestruturas e da Habitação já reagiu ao vídeo, manifestando-se “indignado” e referindo que os dois trabalhadores da TAP têm “elevadas responsabilidades na companhia, sendo um deles o diretor de Recursos Humanos.” O ministério liderado por Pedro Nuno Santos “aguarda pelos resultados do processo de inquérito instaurado pela TAP”, refere a posição transmitida por fonte governamental à VISÃO.
Ao início da tarde, em declarações transmitidas pela RTP3 à margem da abertura da base da easyJet no aeroporto de Faro, o ministro clarificou que “não há um processo de recrutamento aberto” e que os responsáveis da TAP estavam em Madrid para selecionar um substituto para uma posição que ficou vaga: “Entretanto, aquilo que me foi dito é que o que estava em causa era a saída do responsável comercial pela Carga [da TAP] em Espanha. Saiu voluntariamente e, por isso, é preciso substituí-lo. E a prática normal é que seja substituído por alguém que conheça o mercado em concreto. É uma prática de gestão normal, não há um processo de recrutamento aberto”. Pedro Nuno Santos pediu, no entanto, “recato e sensibilidade” a quem desempenha funções na TAP tendo em conta o momento que a empresa atravessa.
No Twitter, a deputada do Bloco de Esquerda, Isabel Pires, já disse que vai questionar “hoje mesmo o governo sobre esta situação, porque não se pode aceitar um despedimento coletivo e depois anunciar recrutamentos com esta desfaçatez”.
Até 2024, espera-se que a TAP, onde já foram injetados 1.662 milhões de euros em duas tranches (1.200 milhões e aumento de capital de 462 milhões de euros), receba entre 3.414 milhões de euros e 3.725 milhões de euros em ajudas públicas ao abrigo do plano de reestruturação.
Depois de prejuízos de 1.230,3 milhões de euros em 2020, a empresa teve novo resultado líquido negativo de 365,1 milhões de euros no primeiro trimestre deste ano.
Notícia atualizada às 14:01 com novas declarações de Pedro Nuno Santos