O Grupo de Trabalho (GT) sobre a sustentabilidade das dívidas externa e pública, formado entre o PS e Bloco de Esquerda, propõe três medidas para a reestruturação da dívida pública portuguesa que colocariam o seu valor abaixo dos 100% do PIB pela primeira vez desde 2010.
São elas o alargamento da maturidade média dos 51,6 mil milhões de euros de dívida aos fundos europeus (FEEF e MEEF) em 45 anos (de 15 anos para 60 anos), a redução da taxa de juro média de 2,4% para 1% e a manutenção, “indefinidamente”, no balanço do Banco de Portugal dos cerca de 28 mil milhões de euros de dívida pública adquirida no âmbito do programa de compra de ativos do BCE – o que significaria a mutualização, a nível europeu, “de um total de 51,6 mil milhões de euros de dívida direta do Estado”. De fora desta reestruturação, que consiste principalmente em extensão de prazos e redução de juros, ficaria a dívida ao FMI e aos privados.
O cenário proposto pelo GT resultaria numa reestruturação de 31% da dívida direta do Estado e, também, numa redução do seu valor em cerca de 39% do PIB. “O valor presente da dívida pública (estimativa equivalente à “dívida de Maastricht”) cairia de 130,7% para cerca de 91,7% do PIB”, afirma-se no relatório, onde se estima também que a redução da fatura com juros iria atingir 450 milhões de euros já em 2017, subindo posteriormente para 1 900 milhões de euros até 2023 e, a partir daí para 2 800 milhões de euros caso o programa de compras do BCE se mantivesse em vigor.
Para o GT, este cenário tem três virtudes: “Não seria necessária uma reestruturação do valor facial dessa parte da dívida pública. A restante dívida pública não seria afetada. A reestruturação não constituiria um evento de incumprimento uma vez que seria realizada através de acordo com os parceiros europeus.” Mais: “A reestruturação da dívida oficial ao FEEF e MEEF ajudaria a criar condições para uma evolução favorável do rating da dívida pública portuguesa.”
Poupar nos juros
Os economistas que elaboraram o documento – Francisco Louçã, João Galamba, Miguel St. Aubyn, Paulo Trigo Pereira, Pedro Filipe Soares, Pedro Gil, Ricardo Cabral e Ricardo Paes Mamede, para além do secretário de Estado do Orçamento, João Leão -, recordam que, embora seja detentor da terceira maior dívida da UE, Portugal é o País europeu que gasta mais fundos a pagar juros, à frente de Itália e da Grécia. No ano passado, a fatura dos juros foi de 8,3 mil milhões de euros, o que equivale a 4,5% do PIB.
Por isso, as metas traçadas para os próximos anos, em termos de saldo estrutural e de saldo primário elevado, vão ser muito ambiciosas. “Entre 2016 e 2017 está previsto que Portugal passe de um saldo primário de aproximadamente 2,2% do PIB para cerca de 2,7%”, até atingir 4,9% do PIB em 2021, de acordo com o Plano de Estabilidade que o Governo entrega por estes dias em Bruxelas. “Sem uma redução do peso dos juros sobre o PIB, a redução do défice global, compatível com as metas do Tratado Orçamental, só será possível através de saldos primários excessivamente elevados. Uma política orçamental permanente desta natureza e dimensão, para além de um pesado fardo sobre a economia e o desenvolvimento nacionais, dificilmente é sustentável, económica, social e politicamente, a médio e longo prazo”, alerta o relatório.
Quais são, então, as alternativas, para reduzir os pesados encargos da dívida portuguesa?
O grupo de trabalho aponta quatro medidas que, em conjunto, representam poupanças com juros de 450 milhões já em 2017, valor que subiria para 1200 milhões de euros em 2023 e anos seguintes:
1 – Reduzir maturidades – A maturidade média passou de 5,1 anos, no final de 2013, para 6,6 anos, no final de 2016. O GT propõe a redução desse prazo para 4,9 anos, exceto no que toca à dívida aos fundos europeus e aos FMI. Como? Através da emissão de Obrigações do Tesouro com maturidades mais baixas, obtendo assim uma redução das taxas de juro atuais em 0,4 a 0,5 pontos percentuais. A redução estimada da despesa com juros é de cerca de 390 milhões de euros em 2018, evoluindo para 1300 milhões de euros em 2023.
2 – Pagar mais cedo ao FMI – Na linha do que o Governo vem fazendo, o GT propõe a continuação dos pagamentos antecipados ao FMI, aconselhando a realização de um novo adiantamento de 7,9 mil milhões de euros já em 2017. A poupança estimada em juros é de quase 900 milhões de euros entre 2018 e 2012, com maior impacto em 2018 e 2019 (poupança de 284 milhões em cada ano).
3 – Reduzir almofada financeira – Se o Governo reduzir as disponibilidades líquidas das administrações públicas (depósitos e dinheiro em espécie), conhecidas por “almofada financeira”, para 12,7 mil milhões de euros até 2022, o GT estima uma poupança de cerca de 333 milhões de euros a partir de 2023.
4 – Aumentar dividendos do BdP – Se o Banco de Portugal abandonar a sua atual política de provisões, considerada conservadora, poderá aumentar os dividendos e impostos a pagar ao Estado, gerando um efeito adicional nas contas públicas de cerca de 450 milhões de euros em 2017 e 195 milhões de euros em 2018.
O grupo de trabalho admite que, apesar destas poupanças, o efeito destas 4 medidas sobre a dívida externa líquida do País “é modesto”, sugerindo por isso “o estudo das condições necessárias a um processo europeu de reestruturação das dívidas públicas elevadas”, alargando prazos de pagamento e reduzindo juros.
O relatório é apresentado esta tarde na Assembleia da República