Com a saída do Reino Unido da União Europeia (UE) agendada para daqui a dois anos, alguns dos grandes bancos de investimento da City londrina ultimam os seus planos de mudança para outras cidades que lhes garantam o acesso ao chamado “passaporte europeu”. E o êxodo pode ser grande. Num estudo recente, o think tank belga Bruegel estima em 1,8 biliões de euros o valor dos ativos financeiros que poderão procurar uma nova “casa”. Atrás do dinheiro, poderão ir milhares de postos de trabalho.
O Brexit vai sem dúvida mudar a face da City, mas também o corpo da economia do Reino Unido. No setor financeiro, temem-se especialmente os efeitos de um “hard Brexit”, termo usado para designar uma “saída dura” da UE, ou seja, uma retirada que ponha em causa a livre circulação de pessoas, bens e capitais entre aquele país e o resto da Europa – o tal “passaporte europeu”. A primeira-ministra britânica, Theresa May, já disse, contudo, que vai tentar manter essa prerrogativa para além dos dois anos de negociações para a saída do Reino Unido, iniciadas a 29 de março.
Mas, sem certezas sobre o que acontecerá após o Brexit, as grandes casas de investimento estão a planear a sua mudança para terras além Canal. O site de notícias Politico contactou os cinco bancos com maior volume de negócios da City (todos de origem norte-americana) e concluiu que Dublin, capital da Irlanda, e Frankfurt, centro financeiro da Alemanha, surgem no topo das preferências.
Para Portugal, poderá já ser tarde para “posicionar-se como destino deste investimento”. De acordo com a reflexão sobre a posição portuguesa em relação ao Brexit, coordenada pela Direção Geral dos Assuntos Europeus, “merece ser considerado um esforço de posicionamento correto de Lisboa como possível alvo destes bancos”, assim como das empresas de serviços financeiros que presumivelmente acompanharão a deslocalização dos seus principais clientes. “Será de considerar, nos próximos meses, ações de posicionamento estratégico de Lisboa como possível recetora de investimento oriundo do Reino Unido nesta área, competindo diretamente com Dublin, Paris, Frankfurt e Madrid”, acrescenta o relatório.
O setor financeiro emprega 1,5% da força laboral do Reino Unido mas, segundo um estudo da consultora PwC, contribui com 6,9 por cento do total dos impostos cobrados sobre o trabalho – metade deles com origem nos bancos estrangeiros. Já os impostos totais pagos pelos bancos com atividade naquele país ascenderam a 34,2 mil milhões de euros, no ano fiscal concluído a 31 de março de 2016.
De acordo com o Politico e a Bloomberg, são já conhecidos alguns detalhes dos planos dos maiores bancos de investimento sediados na City:
JP Morgan tem 16 mil funcionários no Reino Unido e, além de Londres, está presente noutras cidades europeias como Amesterdão, Bruxelas, Dublin, Frankfurt, Milão, Madrid, Paris, Estocolmo, Luxemburgo, Lisboa e Praga. Estará já a planear adquirir novas instalações em Dublin para realojar mil funcionários do back-office mas, se Londres mantiver o “passaporte europeu”, o seu centro nevrálgico deverá permanecer na City. Caso contrário, a opção a considerar será, além de Dublin, a cidade alemã de Frankfurt. Amesterdão, Milão e Madrid também são hipóteses.
Goldman Sachs emprega 5 500 pessoas no Reino Unido. Tem escritórios em Bruxelas, Frankfurt, Hamburgo, Madrid, Milão, Paris, Estocolmo e Varsóvia. Frankfurt parece ser o destino preferencial de pelo menos um milhar de “homens de ouro”, em caso de “hard Brexit”.
Bank of America Merrill Lynch Dá trabalho a 6 500 pessoas no Reino Unido e tem atividade em Amesterdão, Atenas, Bruxelas, Dublin, Frankfurt, Madrid, Milão, Paris, Varsóvia, Luxemburgo e Estocolmo. A deslocalização deverá privilegiar Frankfurt e Dublin, mas também Madrid, Luxemburgo e Amesterdão. A decisão final não está tomada.
Morgan Stanley tem 6 mil funcionários naquele país. Mantém escritórios em Amesterdão, Budapeste, Dublin, Frankfurt, Luxemburgo, Madrid, Milão, Paris, Estocolmo e Varsóvia. Destinos pós-Brexit mais prováveis: Dublin e Frankfurt.
Citigroup ocupa 9 mil pessoas no Reino Unido. Tem presença em 20 cidades europeias, para além de Londres. Já tem uma forte implantação em Dublin, e é de esperar que seja reforçada em caso de “hard Brexit”.
No caso dos outros bancos mais pequenos, o suíço UBS, prevê deslocalizar 1500 em 5 mil postos de trabalho, o britânico HSBC 1000 em 5 mil, e o também britânico Barclays 150 em 10 mil.