O antigo administrador financeiro do BES, Amílcar Morais Pires, disse quinta-feira, no parlamento, que o departamento da contabilidade era, na gestão do banco, um pelouro do presidente executivo, Ricardo Salgado.
Tal era “uma opção do próprio” Salgado, sublinhou Morais Pires, que foi ouvido no parlamento, na comissão de inquérito à gestão do BES e do GES, durante cerca de sete horas.
Sobre o modelo de governação do BES, muito centrado no seu líder histórico, Ricardo Salgado, Amílcar Morais Pires disse que era um modelo com “defeitos e virtudes”, sendo a centralização de competências um fator que pode ser visto como negativo.
BES podia ter sobrevivido
O colapso do Banco Espírito Santo (BES) podia ter sido evitado caso tivessem sido desenvolvidos mais esforços para capitalizar a instituição durante o mês de julho, considerou hoje Amílcar Morais Pires, antigo administrador financeiro do banco.
“Eu acho que o BES podia ter sobrevivido. Entre o dia 3 e o dia 30 [de julho], podia ter sido feito mais para capitalizar o banco”, afirmou Morais Pires durante a sua audição na comissão de inquérito parlamentar ao caso BES.
A manutenção das linhas de financiamento, a continuação da efetividade da garantia soberana de Angola e a alienação ordenada dos ativos do Grupo Espírito Santo (GES) seriam, segundo Morais Pires, a chave para a sobrevivência do BES.
Problema era de liquidez
O antigo administrador financeiro do BES, Amílcar Morais Pires, realçou que o banco colapsou devido a uma crise de liquidez, graças à fuga de depósitos e ao corte das linhas interbancárias, que originou depois uma crise de capital.
“A fuga de depósitos e o corte das linhas interbancárias acentuou a crise de liquidez do banco tornando-o completamente dependente da linha de emergência do Banco Central Europeu (ELA), situação que se tornaria insustentável num curtíssimo prazo”, afirmou o responsável na sua intervenção inicial da audição na comissão parlamentar de inquérito ao caso BES.
E reforçou: “Assim, os factos demonstram que a crise do BES antes de ser uma crise de capital foi uma crise de liquidez”.
A importância de Ricciardi
O antigo administrador financeiro do BES Amílcar Morais Pires lembrou que o presidente do BESI, José Maria Ricciardi, era uma pessoa “muito importante” no banco e com responsabilidades “para lá do papel”.
“Havia linhas de separação muito concretas entre o BES e o GES”, revelou Amílcar Morais Pires no parlamento, logo acrescentando: “O doutor José Maria [Ricciardi], como membro da família, de certeza que sabe mais do que eu”. Referia-se às diferentes características do BES e do GES, grupo que o controlava.
Investimentos da PT no GES
O antigo administrador financeiro do BES Amílcar Morais Pires, que era também administrador não executivo na PT, afastou hoje a sua responsabilidade por qualquer iniciativa no sentido de sugerir à operadora o investimento na dívida das ‘holdings’ do GES.
“Eu era administrador não executivo da PT. Não tive nenhuma iniciativa para sugerir o investimento na Rioforte”, assegurou Amílcar Morais Pires.
Morais Pires vincou que nunca fez “nenhuma iniciativa para sugerir o investimento na Rioforte, nem na ESI [Espírito Santo International]”, pedido aos deputados para que este assunto fique registado.
O exército, o general, a derrota
O antigo administrador financeiro do BES Amílcar Morais Pires finalizou a sua audição de seis horas na comissão de inquérito parlamentar com uma ilustração bélica, em jeito de autocrítica, pelo desfecho do segundo maior banco privado português.
“Eu pertenci a um exército, que tinha um general, e esse exército perdeu. Eu tinha uma alta patente e aceitarei as questões”, afirmou o banqueiro perante os deputados, sendo que o general a que se referia era, naturalmente, Ricardo Salgado, que liderou o BES durante 22 anos.
“Quando pertencemos a um regime, temos que aceitar as consequências. Aceitarei as consequências, no plano individual, que me forem atribuídas. E do ponto coletivo também”, sublinhou.