Há uma linha que separa obliquamente todo este filme. Como uma falha sísmica. Qualquer coisa que não se conecta. Fraturante. A começar pelo sentido polissémico do título em inglês (Detachment) que em português se perde por completo. O protagonista (fantástico Brody) é um professor substituto, e talvez, por isso, ele sente (ou queira sentir) um “detachment” (um misto de distanciamento e de indiferença) por toda a gente, pelos sempre renovados novos alunos e novos colegas. E na verdade, o tal detachment atinge (quase) todas as personagens do filme. Há um liceu público americano em que os miúdos sentem uma indiferença “enervante” por si próprios ou pelo seu futuro, e os únicos professores que mantém a sanidade mental, e não se “enervam”, são os que conseguem manter a indiferença e o distanciamento daquilo tudo. O problema é que a indiferença deveria ser tratada como um não sentimento, algo tão subtil que não chega a ser emoção. E o realizador carrega: nas cores, nos vermelhos, na saturação, nos artifícios gráficos, sonoros, nos apontamentos de animação, nas câmaras lentas, no número de cortes do plano… Tanto que um micro-cosmos de um liceu se transforma num inferno. Mas tão explicitamente infernal, que até… “enerva”: não faltam professores à beira de um ataque de nervos, psicólogas em lágrimas, meninas gordas (há sempre uma menina gorda na turma) vítimas de bullyng, docentes alvo de maus tratos e agressões verbais explícitas, pais ausentes e incompreensivos, o assassínio desapiedado de gatinhos…Tudo é caos, todos são sacos de pancada uns dos outros. E ora estamos num registo próximo do depoimento documental, ora entramos numa lógica de, digamos, lirismo tumultuoso. Acompanhamos o quotidiano deste professor que cita Camus e lê os contos góticos de Poe. Que encontra uma prostituta adolescente de rua (representada pela própria filha do realizador) e trá-la para casa, mas na realidade não consegue afastar a indiferença que o invade. Que visita um avô moribundo, parece preocupar-se com ele, mas não por comleto, porque há um passado obscuro, mas não seguramente benigno, que associa o velhote ao suicídio da mãe. Que estabelece alguma relação de compaixão pela menina gorda mas não se preocupa ao ponto de a proteger. Se os professores e as famílias são emocionalmente disfuncionais como podem transmitir funcionalidade aos miúdos? Um filme de um pessimismo demasiado estilizado, tudo tão martirizado, as mentes tão torturadas, a sociedade tão supliciada… e quando a agonia é comprimida corre-se o risco do sofrimento parecer um vómito. O inferno são os outros. Mas o problema é que os outros somos nós.
O SUBSTITUTO : CAOS AO CONTRÁRIO É SACO

E qual a relevância desta informação? Nenhuma. Na verdade, tudo é completamente indiferente