Nathalie de Oliveira não é uma deputada comum. E, talvez por isso, nem o próprio sistema da Assembleia da República tenha conseguido – nem à primeira, nem à segunda e nem sequer à terceira – reconhecer e validar o registo daquela que é a primeira deputada lusodescendente da democracia portuguesa. “Não aceita, nem a morada de França, nem o meu nome…”, lamenta, com um encolher de ombros. Formalmente, para o Parlamento, Nathalie tornou-se, pelo menos por agora, Natália – foi o que se arranjou para (solucionar) um primeiro dia. Depois, logo se verá…
O prólogo da (improvável) deputada, eleita na repetição do ato eleitoral do círculo da Europa, não representa, certamente, dificuldades de maior para quem teve de percorrer mais de dois mil quilómetros para chegar à Assembleia da República. Nathalie de Oliveira, 44 anos, nasceu e cresceu em Metz, França, filha de pais portugueses emigrados naquele País, desde a década de 1960.
O coração pulsou sempre dividido: entre Portugal e França. E quando Nathalie de Oliveira, com 29 anos, decidiu entrar “a sério” para a política, increver-se-ia não em um, mas em dois PS – o português e o francês. Quinze anos de militância ativa valeram-lhe o voto de confiança do partido: e a posição como n.º 2 da lista (encabeçada por Paulo Pisco). O processo (caótico) que levou à repetição do ato eleitoral no círculo da Europa valer-lhe-ia a eleição como deputada. “É uma alegria enorme, uma grande emoção”, confidencia.
A VISÃO acompanhou a estreia de Nathalie de Oliveira no Parlamento, mas nem sempre foi fácil. Entre encontros e desencontros – de quem ainda se procura habituar às curvas de uma nova morada –, a deputada lusodescendente foi das mais requisitadas pelos órgãos de comunicação social presentes no Parlamento.
“Ainda não consegui parar”, confessa. Cansada? “Não, isso ainda não!”, diz, com um sorriso que não deixa margem para dúvidas: entusiasmo e motivação não devem faltar nos próximos quatro anos. “Já tinha estado no Palácio de São Bento, mas apenas como visitante. Hoje, tenho o coração pesadíssimo, porque sei que esta agora vai ser, não só a minha casa, mas também a casa daquelas pessoas que não faziam parte da vida do País, e que agora vão estar aqui presentes através de mim…”, sublinha.
Quais são as grandes prioridades para o próximo mandato?
“Representar todos os portugueses que, mesmo fora de Portugal, querem continuar a contribuir para o desenvolvimento do País”
É exatamente assim que Nathalie de Oliveira sente… e diz. A deputada lusodescendente promete trazer sempre consigo na bagagem os eleitores que, como ela, também sentem e veem o País à distância – e garante que jamais deixará estes portugueses ficar para trás.
“Estar aqui, na Assembleia da República, é uma alegria indescritível, porque sei que esta alegria não é só minha, mas partilhada por milhares e milhares de portugueses que estão espalhados pelo mundo. É precisamente esse o meu objetivo para este mandato: ser a voz dos portugueses espalhados pelo mundo! Representar todos eles que, mesmo fora de Portugal, querem continuar a contribuir para o desenvolvimento do País”, refere.
Ainda ontem estava em França… e agora já estou cá
Nos próximos quatro anos, Nathalie de Oliveira terá de se dividir entre Paris e Lisboa – um esforço extra que não a desanima. “Não há problema nenhum. Na verdade, eu já vinha a Portugal muitas vezes, para estar presente em reuniões no PS ou participar noutras iniciativas do partido”, recorda.
Formada em Direito das Organizações Internacionais, na Universidade de Sorbonne, em Paris, a nova deputada conta no currículo profissional com passagens pela Comissão Europeia e UNESCO. Entre 2008 e 2020, Nathalie de Oliveira foi adjunta do presidente da Câmara de Metz, no coração da região da Lorraine.
Sempre próxima do PS, é autora de vários artigos para a Fundação Jean Jaurès, para o think-tank Ideal Europeu e cronista no Lusojornal – jornal bilingue (em português e francês), publicado em França e Bélgica. Com uma vida associativa preenchida, contam-se ainda outras atividades: porta-voz da Associação Cultural Portuguesa de Metz (ACPM), membro emérito de conselhos de administração de associações de Defesa de Direitos Humanos, Cultura e Educação, com missões de consultoria no CASAM (Centro de Acolhimento dos Requerentes de Asilo de Moselle), na Liga dos Direitos Humanos (LDH) e no Clube da UNESCO, no Movimento Europeu.
Apaixonada por poesia, tem dedicado algumas das suas crónicas à obra literária do histórico socialista Manuel Alegre, que, no rescaldo da sua eleição, foi das primeiras personalidade ligadas ao PS a reagir, congratulando-se com a notícia e enviando-lhe uma SMS: “Parabéns, é justo, fico muito contente!”, escreveu o ex-candidato presidencial e antigo deputado.