A saga The Matrix teve um papel semelhante na transição do século ao de Guerra das Estrelas nos anos 70 e 80. Quando, ainda em 1999, as irmãs Wachowski lançaram o primeiro volume, surpreenderam-nos com a criação de um universo paralelo, baseado na realidade virtual emergente, com um novo paradigma para os filmes de ação, que abria portas conceptuais, ao mesmo tempo que nos deixava empolgar por uma história envolvente e uma arquitetura deslumbrante. Quatro anos depois, as irmãs Wachowski trataram de fechar a trilogia com dois filmes de uma assentada só, The Matrix Reloaded e The Matrix Revolutions, colocando rapidamente um ponto final à saga para poderem partir para outros desafios.
Dezoito anos depois surge agora nova sequela, que transforma a saga numa tetralogia, com indicadores de que pode não ficar por aqui. Lilly Wachowski recusou o projeto, dizendo que não queria dar passos atrás na carreira, e a realização ficou apenas nas mãos da irmã Lana.
Além do filme, saiu este ano o videojogo The Matrix Awakens, para Playstation e XBox, com download gratuito. Idealizado pela própria Lana Wachowski, propõe-se uma imersão na arquitetura e no ambiente do universo Matrix.
O filme começa por se autodesconstruir, de forma autoconsciente, quase ensaística, com boas tiradas de humor. Depois tenta cumprir o prometido, dar o que se espera de um Matrix, que é um constante jogo entre camadas de realidade e de virtualidade, uma overdose de turning points, de realidades paralelas, perpendiculares, oblíquas, que levam o espectador constantemente a perder-se, para depois reencontrar-se e perder-se novamente. Mas nada disto consegue ser demasiado surpreendente porque o mais expectável num novo Matrix é a própria surpresa. E já vimos tudo isto nos filmes anteriores.
A primeira parte, de autoironia, em que se mostra consciente de ser a sequela de uma trilogia emblemática, é na verdade a mais estimulante. Aí conseguimos apreciar o fundo criativo de um filme que, até certo ponto, poderia ser apenas um retrato ou relato de uma esquizofrenia. Quando entra a fundo na ação, torna-se cansativo. Este é o mais longo dos Matrix… e isso nota-se. Porventura porque já não estarmos em 1999 e a perceção da virtualidade já não é a mesma. Talvez a irmã Lilly tivesse mesmo razão.
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The Matrix Resurrections > De Lana Wachowski, com Keanu Reeves, Carrie-Anne Moss, Yahya Abdul-Mateen II, Jessica Henwick > 148 minutos