A taxa de incidência de Covid-19 tem vindo a aumentar na última semana. Se esta quinta-feira se manteve estável, na véspera, o boletim epidemiológico conjunto da Direção-Geral da Saúde e do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge registava uma subida de 92,4 para 94,8 casos de infeção por 100 mil habitantes, em relação a terça feira.
Também o Rt, que estima o número de casos secundários de infeção resultantes de cada pessoa portadora do vírus, subiu, de terça para quarta feira, passando de 1,06 para 1,08 a nível nacional e em Portugal continental.
Estamos a duplicar os casos a cada 25 a 30 dias e podemos mesmo alcançar os quatro mil casos diários em dezembro, se mantivermos o ritmo atual, segundo Carlos Antunes, matemático da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa que tem trabalhado em estreita colaboração com os epidemiologistas na análise da pandemia.
Por que razão o especialista não está ainda alarmado? Para já, o matemático sublinha que “há muitas variáveis em jogo” e que nada assegura que os quatro mil casos sejam ultrapassados mesmo em dezembro. Depois, a realidade atual é “muito diferente do período pré-vacina”. A maioria dos infetados são jovens adultos, “pessoas onde não há um número significativo de internamentos e mortes. Neste momento, o meu nível de risco, calculado de acordo com oito parâmetros, está na transição de baixo para moderado”.
De facto, apesar do aumento da incidência, o número de óbitos tem-se mantido estável, aponta o matemático. Tal acontece, pois os responsáveis por este aumento de casos são jovens entre os 20 e 29 anos, com maior incidência entre os 18 e os 25 anos, revela Carlos Antunes. “É a população estudantil. O aumento surge a partir do momento em que abriram as universidades, chegaram novos alunos do primeiro ano, começaram as praxes, as festas académicas e reabriram bares e discotecas”.
Pela primeira vez, os especialistas detetaram ainda que a maioria dos casos correspondia a indivíduos do sexo masculino, entre os 18 e os 25 anos, “com as restantes faixas etárias a subir muito lentamente”.
A subida da incidência depende, portanto, mais de questões comportamentais do que de características do vírus. “Se o comportamento deste grupo fosse igual aos outros estaríamos com valores muito mais baixos”, afirma Carlos Antunes que, no entanto, não considera estas infeções preocupantes.
O facto de a maioria dos infetados serem homens jovens está também relacionado com este grupo ter sido vacinado, maioritariamente, com a vacina da Janssen. “O vírus aproveitou a oportunidade de ter encontrado uma população com um comportamento mais propicio a contágios que tem uma proteção vacinal menor, face às mulheres da mesma idade”.
Já o especialista em Saúde Pública da Universidade Católica de Lisboa, Henrique Lopes, acredita que o crescimento do número de novos casos em Portugal é significativamente menor ao de outros países, como o Reino Unido, mas, na generalidade, “a maioria dos países europeus está a levantar demasiado cedo as chamadas medidas não farmacêuticas”.
No que respeita o nosso país, o especialista considera que é mais importante liberalizar as atividades económicas do que o declarar o fim do uso da máscara, a qual “deveria ser obrigatória em espaços fechados, pelo menos, até ao fim de janeiro”. Inclusive, Henrique Lopes acredita que o facto de muitos portugueses não terem deixado de usar máscara, apesar de esta já não ser obrigatória em muitos sítios, tem protegido o país de viver uma situação semelhante à do Reino Unido.
Longe das linhas vermelhas da UCI
No que toca às linhas vermelhas, para já, os números não são preocupantes. Além de o rácio entre o número de internamentos e o número de casos ser diferente face ao ano passado, Carlos Antunes sublinha que “vamos precisar de atingir números de incidência muito mais elevados que o ano passado para atingirmos a mesma gravidade”.
vamos precisar de atingir números de incidência muito mais elevados que o ano passado para atingirmos a mesma gravidade
carlos antunes – matemático fcul
Este ano, o número crítico de camas de Cuidados Intensivos dedicadas à Covid-19 é de 255 camas ocupadas a nível nacional. “Até lá chegarmos temos de ter muitos casos, à volta de quatro mil casos diários”. Este número, graças ao reforço da terceira dose de vacina às pessoas com mais de 80 anos, pode nem ser alcançado ou perder alguma importância por corresponder a infeções em faixas etárias onde “a doença costuma ser ligeira e não implica internamento”.
Inverter medidas, neste momento, “é prematuro”, afirma o matemático. “A situação não é preocupante, ainda…” Porém, o especialista considera necessário reforçar a importância de adequar o comportamento à perceção de risco que temos à nossa volta.