Os cientistas descobriram uma mutação presente numa proteína do vírus SARS-CoV-2 que altera apenas um aminoácido numa cadeia de cerca de 1.300. No entanto, esta transformação pode ser significativa na forma como o vírus ataca as células humanas.
Em janeiro, após o aparecimento dos primeiros casos de coronavírus em Chicago, EUA, Egon Ozer, especialista em doenças infecciosas da Universidade de Medicina da Northwestern University Feinberg, detetou uma mudança repentina em 95% dos genomas após a análise da estrutura genética das amostras de vírus dos pacientes.
Normalmente, existem 1.300 aminoácidos que permitem a construção de uma proteína na superfície do vírus. O que se verificou no vírus mutante foi que as instruções genéticas para apenas um desses aminoácidos, alteraram a nova variante de “D”, que representa o ácido aspártico, para um “G”, que representa a glicina. Esta mudança ocorreu na parte do genoma que codifica a proteína Spike. Os “picos” caraterísticos do SARS-CoV-2, permitem que o mesmo entre nas células humanas e inicie o processo de infeção. Agora, o principal objetivo dos cientistas é descobrir o como e o porquê da alteração do aminoácido de “D” para “G”.
Alguns estudos laboratoriais ainda não submetidos a revisão pelos pares concluem que a mutação torna o vírus mais infeccioso, e que os pacientes com a variante “G” são portadores de uma maior quantidade de vírus, o que aumenta a probabilidade de propagação. Citado pelo The Washington Post, Hyeryun Choe, virologista da Scripps Research e principal autor de um desses estudos, afirma que “o estudo epidemiológico e os dados recolhidos, realmente explicam porque as variantes ‘G’ se espalharam pela Europa e pelos Estados Unidos de forma tão rápida. Isto não é apenas acidental”.
A proteína Spike
O SARS-CoV-19 não tem a capacidade de auto-reprodução, por isso, invade as células humanas e começa um processo de replicação, no qual faz milhares de cópias de si mesmo. Isto deixa um vestígio de tecido danificado e desencadeia uma reposta no sistema imunológico. Apesar de o processo de replicação se revelar um mecanismo que possibilita a cópia do genoma, o coronavírus não é perfeito e, por isso, é habitual ocorrerem erros ou mutações na sua estrutura. No entanto, a maioria das mutações não revela efeitos na forma como o vírus se comporta.
O genoma do vírus foi sequenciado pela primeira vez em janeiro e, desde então, que os cientistas estão à procura de mudanças significativas no seu comportamento. Uma das mais notórias, ocorreu na proteína Spike, a arma mais poderosa do vírus.
A proteína Spike está ligada ao recetor ACE2, presente nas células respiratórias e que possibilita a entrada do vírus. Quanto mais eficaz for a proteína, mais facilmente o vírus invade o organismo. Numa pesquisa liderada por Choe e outros cientistas, concluiu-se que na versão do vírus que surgiu na China, a parte externa onde o vírus precisa de se anexar, quebrou de forma frequente. Deste modo, a dificuldade em invadir as células hospedeiras era muito maior. Após estudar as duas versões genéticas do vírus, os cientistas concluíram que os vírus que contêm a variante “G” tinham mais proteínas Spike, e as partes externas dessas proteínas eram menos propensas a quebrar. Esta análise laboratorial tornou o vírus aproximadamente 10 vezes mais infeccioso.
Apesar disto, a mutação não pareceu afetar de forma mais grave os resultados dos pacientes. A resposta do vírus a anticorpos de pacientes não foi rejeitada nem mesmo nos pacientes que tinham a variante D, como afirma Choe, citada pelo The Washington Post. O especialista acrescenta, ainda, que as vacinas que estão a ser estudadas com base na versão original do vírus, serão eficazes contra este problema.
Segundo os cientistas, é fundamental entender como o genoma influencia o comportamento do vírus. Identificar as constantes mutações permite que os peritos controlem a sua disseminação, e saber quais os genes que influenciam a forma como o vírus se transmite, permite que as autoridades de saúde pública adotem as medidas necessárias para o conter.